“O sucatão está decolando.” Essa frase supostamente irônica foi dita pela jornalista âncora de um dos principais noticiários de uma das redes de comunicação mais importantes do país, surpresa diante da notícia de que a economia brasileira voltou a crescer e a taxa de desemprego entrou em trajetória de queda.
A jornalista não está sozinha. Um grande número de analistas (com muitas e boas exceções) se surpreendeu com a retomada do crescimento da economia, a queda do desemprego e da inflação. Essa surpresa decorre de uma cegueira mais ou menos generalizada, em parte por razões puramente ideológicas e, em parte, pela incapacidade de separar questões relacionadas a disputas política, jurídica e moral de decisões de política econômica corretas e coerentes.
Desde maio de 2016 o atual governo implementou um conjunto de reformas que reverteram uma estagnação que durou dois anos (2013-2014), seguida de dois anos de recessão (2015-2016), e que levou a taxa de inflação a 11% ao ano e a taxa de desemprego a 13% da força de trabalho.
Algumas dessas reformas tiveram efeito imediato, como a lei de conteúdo nacional, o fim da obrigação de que a Petrobrás participasse de todos os leilões do pré-sal, a liberalização dos preços dos combustíveis, a redução de tarifas de importação de bens de capital, a decisão do Banco Central de manter a meta para a inflação em 4,5% em 2017 e só começar a reduzir a taxa de juros quando as expectativas e a própria inflação deram sinais de queda.
Outras estão mais voltadas para o médio prazo, ainda que parte de seus efeitos esteja sendo antecipada pelo mercado. Entre estas se destaca a mudança da taxa de juros cobrada pelo BNDES em seus empréstimos, o que, em conjunto com a reforma trabalhista, permitirá uma redução estrutural da taxa básica de juros. A reforma da legislação trabalhista, que vai reduzir o desemprego e a informalidade; a permissão para a terceirização de qualquer atividade das empresas, que vai gerar elevados ganhos de produtividade; e a introdução na Constituição de um teto para o crescimento dos gastos públicos, indispensável para evitar que a dívida pública permanecesse em trajetória explosiva, terminando em hiperinflação ou em calote.
Finalmente, outras reformas estão direcionadas para fazer seus efeitos no longo prazo, em especial a reforma do ensino médio, cujo objetivo é reduzir a repetência, tornar o conteúdo do ensino médio mais voltado para a realidade dos jovens e diminuir a evasão.
Esse conjunto de reformas mudou o curso da economia brasileira em pouco mais de um ano e gerou forte crescimento dos preços dos ativos no mercado financeiro. Que alguns tenham se mostrado surpresos com a rapidez da reação do mercado financeiro não é surpreendente. O que é surpreendente é que, quando a valorização dos ativos financeiros começa a se refletir no comportamento da economia real, alguns analistas continuem a menosprezar as reformas implementadas e que já começam a ter resultados concretos e visíveis.
A frase que intitula este artigo não é irônica, mas deselegante, desrespeitosa para com o país e preconceituosa, e mostra um total desconhecimento de fatos importantes por um profissional cuja função é informar a população de forma imparcial.
Realmente, o estrago feito ao longo dos últimos dois governos quase transformou a economia brasileira num sucatão incapaz de voar. Porém, nos últimos 15 meses, um grande número de peças deste “quase sucatão” foi trocado por peças mais novas e modernas, colocando-o em condições de alçar voo. Faltam, ainda, muitas peças a serem trocadas, e com urgência. As reformas da Previdência e tributária, as privatizações e a abertura da economia estão entre as mais importantes. Se conseguirmos trocá-las, teremos transformado o “quase sucatão” num moderno jato capaz de voar em velocidade de cruzeiro por um longo período de tempo.
Fonte: “O Estado de S. Paulo”, 26/09/2017.
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