Ou fazemos ajuste fiscal que reduza o consumo do governo ou teremos de importar recursos e ter déficit
Tive a honra de participar do 12º Congresso da Associação Brasileira do Agronegócio, no painel que debateu as questões relativas a logística e infraestrutura.
É difícil exagerar a importância do tema: sem querer repetir o lugar-comum do ideograma chinês que representa simultaneamente crise e oportunidade, a infraestrutura é, ao mesmo tempo, um severo obstáculo ao desenvolvimento do país e a maior chance que temos de destravar nosso crescimento.
Não é segredo que a infraestrutura brasileira, em particular a associada aos transportes, encontra-se esgarçada. No mais recente Relatório Global de Competitividade, publicado pelo Fórum Econômico Global, o país ficou com 107ª posição no quesito “qualidade da infraestrutura” entre 144 países, na vizinhança de Paquistão, Nicarágua, Colômbia e Senegal, e bem abaixo dessa colocação nos itens relativos a transportes.
As consequências para o crescimento são óbvias: a baixa qualidade da infraestrutura se reflete na produtividade geral da economia.
Não é necessário um exercício extraordinário de imaginação para concluir que o motorista que transporta a soja do Centro-Oeste para os portos do Sudeste poderia fazer, com o mesmo tempo que gasta hoje, um número maior de viagens se dispusesse de melhores rodo- vias, assim como de portos com capacidade de escoamento que não o forçassem a esperar dias na fila pela oportunidade de descarregar seus grãos e partir para nova jornada.
Posto de forma mais geral, o aumento da infraestrutura por trabalhador deve ter efeitos consideráveis sobre sua produtividade, o que poderia, em particular nas condições de hoje, relaxar a restrição sobre o crescimento que se origina do mercado de trabalho apertado.
Fica claro, portanto, que as carências relativas à infraestrutura representam um constrangimento sério ao crescimento, precisamente por limitar a expansão da produtividade.
Por outro lado, pelo mesmo motivo, os retornos associados a investimentos nessa área devem ser muito elevados. Assim, caso seja possível aumentá-los, os impactos sobre o crescimento potencial do país serão apreciáveis.
Isto dito, o aumento do investimento não é –ao contrário do que parece ser o entendimento vigente no governo– um ato de vontade do soberano. À parte a questão nada trivial de montar um arranjo institucional que gere os incentivos privados à inversão (o oposto do que a obsessão governamental em limitar os retornos desses projetos irá obter), há o problema da restrição de recursos.
É fato que a poupança nacional, mesmo com a economia operando muito próxima (se não acima) do seu potencial, é modesta, da ordem de 15% do PIB, insuficiente para financiar mesmo o baixo investimento nacional (18% do PIB).
Isso não se deve a nenhuma distorção óbvia do lado do consumo das famílias, que –equivalente a 62% do PIB– é bastante semelhante ao observado nos demais países latino-americanos.
O consumo do governo, porém, destoa, não apenas no subcontinente mas em termos globais, na ca- sa de 21% do PIB, sugerindo que o nível reduzido da poupança nacional origina-se primordialmen- te do elevado peso do governo na economia.
Dado isto, a elevação do investimento em infraestrutura como proporção do PIB requer uma escolha simples: ou fazemos um ajuste fiscal que reduza o consumo governamental ou teremos que importar os recursos do resto do mundo, sob a forma de deficit externos crescentes, partindo de níveis (3,5% do PIB) bem menos confortáveis do que foram há pouco.
A relutância em conter o gasto público sugere que a segunda alternativa parece a mais provável, implicando maior vulnerabilidade às condições internacionais de liquidez precisamente no momento em que aumentam as chances de mudanças importantes nesse cenário.
Na falta do ajuste fiscal, colocaremos em risco a principal oportunidade de acelerar decisivamente o desenvolvimento do país.
Fonte: Folha de S. Paulo, 07/08/2013
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