Desse montante, já foram liberados US$ 45 bilhões nas intervenções feitas desde que o dólar começou a disparar
Para frear a alta do dólar, que fechou a quinta-feira a R$ 2,438, o Banco Central (BC) anunciou, após o encerramento dos negócios, um programa de US$ 100 bilhões para dar liquidez e acalmar o mercado financeiro. Como parte dos recursos já foi injetada em operações desde o início do ano, há pelo menos mais US$ 60 bilhões disponíveis, que serão ofertados em leilões diários até 31 de dezembro. Além disso, o BC não descarta a hipótese de recorrer a mais rolagens de contratos. Esta é a primeira vez desde 2002 — quando a tensão pré-eleitoral levou o dólar a bater R$ 4 — que a autoridade monetária recorre ao que economistas apelidaram na época de “ração diária do BC”. Analistas elogiaram a nova estratégia do BC por oferecer maior previsibilidade ao mercado, mas a maioria avalia que, por si só, não tem fôlego para inverter a tendência de valorização do dólar.
Em entrevista ao “Jornal Nacional”, da TV Globo, o ministro da Fazenda, Guido Mantega, reforçou na quinta o discurso do governo de que a escalada da moeda americana é um fenômeno temporário e reflete a instabilidade do mercado diante da perspectiva de mudança na política monetária americana este ano.
“Estamos vivendo um momento de transição, em que o Fed (Federal Reserve, o banco central americano) vai diminuir os estímulos monetários que está praticando. De uma hora para outra, esse cenário vira. E quem está apostando só na alta pode perder”, disse.
Mantega admite mal-estar entre investidores
Ainda segundo o “Jornal Nacional”, Mantega reconheceu que causou mal-estar entre os investidores a forma de contabilizar os gastos do governo. Ele disse que deu ordem para aumentar a transparência nas contas públicas e que o governo está comprometido com a meta de superávit primário.
“O governo tem obrigação de se esforçar para fazer o maior superávit possível, próximo das metas que estabelece. Em alguns anos, é mais fácil. Em outros, é mais difícil”, afirmou Mantega.
Em 2008, no auge da turbulência da crise financeira internacional, o Banco Central fez uma programação de leilões, mas restrita à oferta de contratos de swap, um clássico instrumento de proteção contra variação cambial que equivale à venda de dólares no mercado futuro. O cronograma era a metade do anunciado quinta-feira: US$ 50 bilhões.
Desta vez, o BC oferecerá injeções diárias de dólares cinco dias por semana. Todas as segundas, terças, quartas e quintas-feiras serão feitos leilões de swap com oferta de US$ 500 milhões/dia. Às sextas-feiras será oferecida uma “linha de dólares” de US$ 1 bilhão. A operação é uma venda de moeda americana no mercado à vista com compromisso de recompra pelo BC. O primeiro leilão desta série está programado para esta sexta-feira. Há 11 anos, a autarquia fazia operações diárias como essa para ajudar os exportadores, mas com apenas um décimo do valor: US$ 100 milhões.
Para aliviar o estresse do mercado, o BC ainda avisou que, se julgar apropriado, fará operações adicionais. De acordo com o comunicado da autarquia, o objetivo é prover hedge, ou seja, proteção contra a variação do câmbio. Na leitura do governo, a procura pelo refúgio contra a alta do dólar é um dos motivos que tem feito a moeda americana subir, além das incertezas sobre os próximos passos da política monetária dos EUA.
Quando empresas e investidores recorrem a esses mecanismos de blindagem é como se comprassem dólares no mercado futuro. Esse movimento de manada alimenta não apenas a alta da moeda americana, mas também as taxas de juros cobradas no país. A ideia é que com o dólar alto, haverá mais inflação e mais juros para frear os preços.
Por isso, nesta semana, BC e Ministério da Fazenda uniram-se para uma ação coordenada. O Tesouro Nacional fez operações que, na prática, forçaram os investidores a desmontar operações que demandavam hegde para a alta dos juros. Do outro lado, a autoridade monetária anunciou leilões no mercado à vista com compromisso de recompra para suprir a falta de proteção contra o dólar no mercado financeiro. Esses dólares fazem parte das reservas internacionais. No entanto, o impacto na poupança externa do país é passageiro, já que os compradores terão de firmar um compromisso de que revenderão as divisas de novo ao BC. Ou seja, o colchão que o governo tem, de US$ 373,6 bilhões, será afetado temporariamente.
Luis Otávio Leal, economista-chefe do banco ABC Brasil, lembra que as “rações diárias” oferecidas pelo BC em 2002 não impediram que a moeda continuasse subindo. “Isso pode ajudar, mas, claro, se os juros dos títulos americanos continuarem subindo, se os treasuries de dez anos chegarem a 3,5% ao ano, o dólar vai subir contra o real e outras moedas de emergentes. Mas é uma medida lógica”, afirma Leal.
Já o professor de Economia da USP Fabio Kanczuk ressalta a preocupação do BC com a inflação e avalia que, com o dólar na faixa dos R$ 2,40, o IPCA, índice oficial de inflação, pode superar 6% este ano. “Estão ficando desesperados com inflação”, diz.
Luís Eduardo Assis, ex-diretor de Política Monetária do BC, afirma que o cronograma e o montante dos leilões foi anunciado com antecedência para ter o “maior impacto possível sobre a expectativa do mercado”. “O objetivo é amenizar o movimento especulativo. Não muda a tendência de valorização”.
Na quinta o dólar encerrou os negócios em baixa de 0,78%, a R$ 2,423. O BC fez dois leilões com compromisso de recompra no mercado à vista com oferta de até US$ 4 bilhões. Além disso, renegociou US$ 986 milhões em contratos de swap cambial. O Tesouro também atuou para conter o dólar e recomprou R$ 1,4 bilhão em títulos prefixados. Também foram vendidos R$ 2,36 bilhões em títulos. “Nossa maior preocupação agora é reduzir a volatilidade do mercado”, disse Paulo Valle, subsecretário da Dívida Pública do Tesouro.
No mercado de ações, a Bolsa fechou em alta de 1,83%, aos 51.329 pontos, puxada pela valorização dos papéis de Vale e Petrobras.
Fonte: O Globo
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