O que foi divulgado até aqui mais confunde do que esclarece as circunstâncias que envolvem a fraude fiscal revelada anteontem pela Polícia Federal. Pelo que se sabe até o momento, o valor é expressivo demais e a farra durou um tempo muito extenso.
A operação, portanto, poderia ter sido deflagrada antes que o prejuízo chegasse a R$ 1 bilhão, o valor estimado da fraude. É muito dinheiro. A quantidade de empresas envolvidas também assusta.
São mais ou menos 300. E, pelo que foi revelado, a “engenharia” da operação parece tosca demais para que os sonegadores agissem durante tanto tempo sem ser importunados.
De acordo com as informações disponíveis, firmas de fachada adquiriam produtos químicos reais e os repassavam a companhias igualmente reais. Essas empresas se apropriavam da mercadoria e a utilizavam normalmente em suas operações comerciais.
Até aí, tudo dentro da lei. O problema tinha início quando as primeiras, aquelas que adquiriram os produtos, não recolhiam os impostos devidos. Faziam isso até atrair a atenção da Receita Federal. Eram autuadas e, nessa hora, seus responsáveis simplesmente se desfaziam delas e abriam novas firmas. Muitas utilizando o mesmo endereço.
Um sistema de fiscalização diligente como é o brasileiro certamente teria meios de desconfiar dessa forma engenhosa de adquirir mercadorias sem pagar impostos. E, depois da terceira ou quarta vez que a manobra acontecesse, dar um basta à situação.
Só que, no caso específico desse embondo, a fraude se arrastou durante anos. Os acusados se beneficiaram, conforme as informações disponíveis, de um preceito importante – aquele que proíbe a bitributação.
Por esse princípio, mesmo quando a primeira empresa não paga o tributo devido, a segunda não pode ser responsabilizada. Só que o abuso da prática torna o beneficiário suspeito. O problema, pelo que parece, não foi a proibição da bitributação nem uma eventual ineficiência ou vistas grossas dos encarregados pela fiscalização.
Nada disso. Embora os números sejam expressivos e o esquema mal enjambrado, não há evidências que permitam lançar suspeitas dessa natureza. O que justifica, então, que um estratagema esquisito como esse tenha persistido por tanto tempo, a ponto de seus idealizadores terem acumulado sinais de riqueza impressionantes – como uma ilha na Bahia, barcos e um monte de carrões?
A explicação é a seguinte: a lei tributária brasileira é ruim. Tão confusa e tão cheia de brechas que os fraudadores sempre encontram nos textos caminhos que lhes permitem praticar seus crimes.
Se a legislação fosse mais simples, se não houvesse tantas exceções nem tantos detalhes que parecem só estar ali para complicar a vida de quem deseja trabalhar a sério, ações desse tipo seriam dificultadas.
Até agora, o governo tem resistido à ideia de uma reforma tributária por entender que uma mudança no sistema pode significar perda de arrecadação. Se as investigações avançarem, ficará comprovado que a lei atual, que sufoca as empresas, é também prejudicial à arrecadação.
Que esse R$ 1 bilhão que se foi pelo ralo pelo menos sirva para convencer os que ainda resistem que a Reforma da Lei é, sim, extremamente positiva.
Fonte: Brasil Economico, 19/08/2011
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