O sábio Guimarães Rosa dizia que “mestre não é aquele que ensina, mas aquele que, de repente, aprende”. O bom professor é aquele que sabe aprender. Na interlocução com o público de uma sala de aula, quem dá um curso tem como dever passar seus ensinamentos, mas ele também precisa estar aberto para captar os sinais que vêm do público, corrigir falhas na sua comunicação, aprimorar a técnica de ensino e estar atento às tendências que se modificam com o passar dos anos.
Nas minhas primeiras idas à televisão, acostumado a dar aulas de quase duas horas de duração, costumava deixar a âncora desesperada com meu raciocínio, exposto em frases longas que excediam os parcos segundos que me cabiam nas entrevistas, programadas para serem curtas. Com o tempo, fui obrigado a aprender o uso da técnica de entrevistas, onde o tempo assume uma dimensão diferente em relação ao “timing” das aulas.
A mesma analogia vale para a diferença entre o ensino para o economista e para o não economista. Vale lembrar a conhecida lição de Arnold Harberger, um velho professor que dizia que “a única forma para que boas políticas sejam convertidas em realidade é que os economistas sejam persuasivos e convençam as pessoas. Você não as convence dizendo-lhes ‘Meu modelo diz que vocês têm que fazer isso’. ‘Por quê?’. ‘Porque o modelo diz assim’. ‘Você pode me explicar?’. ‘Bom, isso é complicado demais para explicar’. Você não pode fazer isso. Você tem de convencer as pessoas”. A linguagem usada para explicar os fenômenos econômicos para quem não é economista é naturalmente diferente da que é empregada no diálogo com os colegas ou com os alunos aspirantes à mesma profissão.
[su_quote]Deve-se estudar economia não para dar respostas, mas para evitar que economistas nos enganem[/su_quote]
Ao mesmo tempo, a economia é um tema difícil e querer simplificar demais pode ser um erro. Um médico que tenha que lidar com um paciente com uma doença grave não pode explicar as questões ao indivíduo como se estivesse falando com um colega, mas o paciente que efetivamente quiser entender qual é a ameaça que incide sobre seu corpo terá que fazer um esforço para se abrir ao entendimento de assuntos aos quais, em outro contexto, não prestaria atenção.
Foi com essas preocupações em mente que Cristiane Alkmin J. Schmidt e eu acabamos de publicar “Macroeconomia para Executivos – Teoria e prática no Brasil” (Editora Campus/Elsevier). No livro, escrito em linguagem que pretendemos seja acessível a um tipo de público pouco familiarizado com o “economês” – em geral, estudantes dos cursos de MBAs executivos – procuramos mostrar ao leitor leigo, mas interessado nos fenômenos econômicos, os instrumentos necessários para uma melhor compreensão dos mesmos.
O livro, relativamente curto, contém seis capítulos, que tratam dos conceitos básicos, dos preços, da contabilidade nacional, do PIB, da moeda e do papel das expectativas e é inspirado em texto com propósitos similares dado no curso de MBA da Harvard Business School, devidamente adaptado à realidade brasileira. No final de cada capítulo, cada um deles com fundo de natureza teórica, mas com diversos exemplos práticos, incluímos uma seção com os principais números do Brasil associados a alguns dos temas debatidos entre os economistas e tratados no capítulo.
No livro, procuramos enfatizar três pontos importantes e muitas vezes negligenciados pelo leigo nessas questões:
1- a lógica de longo prazo é diferente da lógica de curto prazo, ou, dito de forma mais simples, fatos geram efeitos. Uma determinada política pode trazer consequências aparentemente positivas por algum tempo, mas ter impactos nefastos meses ou mesmo anos depois; 2- os mercados se relacionam entre si. Muitas vezes, as pessoas defendem que ocorra alguma coisa com uma determinada variável, mas não levam em consideração que isso acarretará uma série de outros efeitos no sistema econômico como um todo; e 3 – a política econômica é feita de escolhas, o que em “economês” se traduz na existência do que os economistas chamam de “trade offs”, ou seja, dilemas entre alternativas que podem ser “trocadas” entre si, cada uma delas tendo seus benefícios, mas também seus custos.
A experiência interdisciplinar é muito rica. Pessoalmente, penso que me tornei um economista melhor ao longo dos anos, interagindo, por exemplo, com diversos advogados que me fizeram ver a importância de pontos que eu antes negligenciava ao emitir minhas opiniões; ou, ainda, pelo contato com cientistas políticos, que me levaram a introduzir novos componentes em minhas análises, pouco enfatizados nos anos de minha juventude. Analogamente, outras profissões podem se beneficiar de uma compreensão adequada de como funciona o sistema econômico.
Em todo caso, como dizia de forma bem humorada a famosa economista Joan Robinson, citada em uma das epígrafes do nosso livro, “deve-se estudar economia não com a finalidade de oferecer um conjunto de respostas prontas a questões econômicas, mas sim com o objetivo de evitar que os economistas nos enganem”. Esperamos alcançar esse objetivo!
Fonte: Valor Econômico, 14/01/2015.
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