Reforma agrária e pesados investimentos na agricultura eram propostas defendidas, nos anos 50 e 60, por parcela significativa da sociedade brasileira. Apesar de nenhuma dessas propostas ter sido implementada na forma então imaginada, o país conseguiu crescer e sofisticar-se ao longo da segunda metade do século XX. Progressos ocorreram inclusive na própria atividade rural que, aliás, participou do financiamento à industrialização sob várias maneiras, algumas das quais involuntárias e penosas.
Porém, o país não ficou impune às omissões cometidas no âmbito rural. Isto é: grande parte dos atuais desequilíbrios que atormentam a nação é explicada pelo que deixou de ser realizado no campo durante as mencionadas décadas.
Hoje, enredo semelhante ocorre no âmbito da questão urbana. É perfeitamente possível retomar taxas elevadas de expansão do PIB sem necessidade de enfrentar a crise vivida pelas nossas principais cidades. Mas a fisionomia futura do país exibirá cicatrizes decorrentes dessa omissão. Engana-se quem acredita que o próprio desenvolvimento nacional se encarregará de curar as mazelas urbanas. Assim como, no passado, enganou-se quem afirmava que a redistribuição de renda seria fruto natural de seu próprio crescimento.
Segurança pública, meio ambiente, contrastes sociais, eficiência dos serviços básicos municipais, transporte coletivo, precariedade habitacional, degradação dos espaços públicos, especulação imobiliária e qualidade de vida em geral são alguns dos itens onde os indicadores nacionais poderão permanecer insatisfatórios por culpa do contexto ao nível municipal, até mesmo se o país atingir elevado status econômico. A experiência internacional demonstra que essa previsão não é absurda: nos Estados Unidos, ainda hoje encontram-se grandes cidades vítimas de graves desfunções.
Durante a década de 90, o Brasil tornou-se o quarto país mais urbanizado do planeta. Essa informação não seria preocupante se nossas cidades ostentassem desempenho satisfatório. Mas a realidade é bem diferente: constata-se volumoso déficit de serviços públicos básicos e extremo desbalanceamento, entre os diversos bairros de cada município, na infraestrutura instalada; as áreas metropolitanas sofrem de elevados índices de pobreza, criminalidade e poluição, sem perspectivas de serem amenizados.
Tornar as cidades um local mais receptivo de viver não constitui objetivo utópico. O nível de poupança interna que o país tem condições de mobilizar, mais a oferta externa de recursos, seriam suficientes para financiar montante razoável de investimentos. Agências como BNDES e FINEP têm possibilidades de dedicar fatia maior de suas operações a projetos urbanos. Exemplo de fonte externa é o PROCIDADES, mecanismo de crédito instituido em 2006 pelo Banco Interamerico de Desenvolvimento – BID, especificamente para o Brasil. Montante de US$800 milhões, renováveis à medida das necessidades, encontra-se disponível para financiar programas vinculados a planos integrados de desenvolvimento municipal.
O país dispõe de meios para iniciar esforço concentrado em termos de incremento da qualidade de vida urbana. Mas, infelizmente, não há como menosprezar a probabilidade de nada expressivo acontecer, dado o fato de trata-se de tarefa superior ao discernimento da maioria absoluta dos políticos brasileiros.
Marcello Averburg,
Seu artigo é excelente , acho que se pensasse e realizasse a seriedade, teríamos conseguido o desenvolvimento econômico e social (IDH) como tb o crescimento econômico tanto no rural como no urbano.
É gratificante ler artigo como o seu.
Parabéns.
Maria do Rosário Peixoto