“E agora, José?” Perdão, leitores, por roubar, quiçá conspurcar, a indagação poética do mestre Drummond, diante do reles tema que se segue. É que a hora e a conjuntura são propícias. Muita gente no Brasil indaga hoje onde é que vai dar tudo isto que está aí.
Este jornal publicou anteontem (dia 14/4) 12 opiniões de peso sobre o momento político, social, econômico e seus possíveis desdobramentos. Cientistas políticos, professores de História, filósofos, sociólogos, doutores em comunicação e em direito constitucional, etc., contribuíram com suas análises. Em quase todas, dois aspectos foram focalizados. O inegável gigantismo do movimento “fora Dilma”, presente nas duas manifestações (de 15/3 e de 12/4), junto com sua inviabilidade imediata.
Parece que só a própria presidente é que, se quiser, poderá, mediante renúncia, atender ao que é mero “desejo” – conforme uma das opiniões – de expressiva parcela da sociedade. Não há meios legais e políticos capazes de materializá-lo. As duas manifestações foram equivalentes às Diretas-Já, mesmo a segunda sendo menor que a primeira, mas jejunas politicamente. E um movimento sem partido não tem como materializar seu objetivo. Foram obra de convocações dispersas nas redes sociais – instrumento que não existia em 1983-1984. O que mais importa, no entanto, é responder ao que seria a pergunta do poeta, pois o Brasil marcha, como o José, para onde?
[su_quote]Sim, houve mudanças. São, porém, fatores de entusiasmo e esperança que se esgotam. Elevam temporariamente a vida familiar material, mas não alimentam a fé no futuro e no país[/su_quote]
As Diretas-Já foram um movimento contra a política e o poder daquele momento: a política conservadora e corrupta e o poder militar. O “fora Dilma” é contra a velha política conservadora e corrupta e contra o poder civil de um partido que se propôs a transformar tudo o que está aí e não só não transformou nada, como aderiu às mazelas da velha política.
Sim, houve mudanças. Mais gente ganhando melhor; mais gente comprando casa própria; mais gente recorrendo ao crédito mais barato; mais brasileiros e suas famílias vivendo melhor; mais carros e mais viagens. Tudo inegável. Mudanças que o PT usou para promover o “nós contra eles” e garantir mais votos e mais apoio para seus governos. Mas não houve melhorias substanciais nas condições de vida que o Brasil oferece para o dia a dia da sua população. Os transportes públicos, as escolas públicas, a segurança pública, a saúde pública, o amparo à infância e à velhice, a Justiça, os serviços, enfim – que o poder público moderno tem por obrigação fornecer aos cidadãos -, continuaram em estado lastimável e em muitas regiões pioraram.
O público brasileiro teve, nos últimos 20 anos, duas fases de euforia com sua situação pessoal e com a do Brasil. Primeiro, a derrubada quase milagrosa, em 1994, da inflação galopante que destruía empresas, empregos, planos, sonhos e esperanças individuais. E que melhorou o poder aquisitivo e as perspectivas da população trabalhadora. Segundo, a melhoria da renda e dos níveis de consumo de boa parcela da população, que realimentou planos e sonhos, gerou empregos e empresas.
São, porém, fatores de entusiasmo e esperança que se esgotam. Elevam temporariamente a vida familiar material, mas não alimentam a fé no futuro e no país. Isso só pode ser obra de um governo que tenha planejamento estratégico sólido e propostas viáveis de desenvolvimento sustentável. Investimentos, empregos, formação de empresas, melhorias dos serviços públicos e melhorias no ensino são os fatores que reforçam a fé e as esperanças no futuro das pessoas e do país.
O governo do PT não percebeu o esgotamento dos fatores que garantiam prestígio e apoio, nem a chegada do período de adversidades da economia internacional, nem o visível aumento da demanda por serviços públicos que se deterioravam. Tudo nessa área piorou a olhos vistos sob fanfarronices de realizações do governo Dilma. Com a economia em frangalhos e a política fazendo água, entra em cena o governo do velho PMDB para pôr o barco a flutuar até o fim do ano. Resta esperar que o ronco das ruas e a Operação Lava Jato tornem a classe política mais séria e mais responsável.
Fonte: O Estado de S. Paulo, 16/4/2015
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