Segundo a pesquisa Pnad Contínua, do IBGE, apurada de março a maio, o efetivo de trabalhadores por conta própria aumentou 4,4% em relação ao mesmo período do ano passado. Ou seja, em um ano, cerca de 934.000 pessoas montaram o próprio negócio. Num cenário de desemprego em alta, o número é revelador: mostra que os brasileiros querem empreender. “Até meados do ano passado, o que existia era o empreendedor por oportunidade, aquele que encontrava uma chance de empreender e ganhar dinheiro. O que vemos agora é o empreendedor por necessidade, aquele que não encontra espaço no mercado de trabalho como funcionário e vê no empreendedorismo a chance de garantir o sustento da família”, avalia Bruno Caetano, diretor superintendente do Serviço de Apoio às Micro e Pequenas Empresas do Estado de São Paulo (Sebrae-SP).
O dirigente ressalta que o melhor caminho para abrir o próprio negócio é fazê-lo dentro da legalidade. Para isso, cita a figura jurídica do Microempreendedor Individual (MEI) criada pelo governo em 2008 com a intenção de regularizar os trabalhadores informais. O dispositivo foi criado para reforçar a arrecadação do governo e facilitar o processo extremamente burocrático de abrir uma firma no Brasil.
Segundo o Sebrae, o país já conta com 5,1 milhões de microempreendedores. O aumento no efetivo de desempregados, que chegou a 8 milhões, conforme a Pnad, só ajudou a incrementar esse número. Em junho deste ano, cerca de 90.000 pessoas aderiram ao programa, 10.000 a mais do que ano passado, de acordo com o Sebrae.
Janine Pereira, 36 anos, é uma das 5,1 milhões de MEIs. Estilista há quinze anos, ela perdeu o emprego em janeiro do passado. Passou seis meses procurando trabalho, sem sucesso. “E lá fui eu para a fila do desemprego. Tentei em muita, muita empresa, e nada deu certo. Foi aquele momento em que caiu a minha ficha: eu tenho uma baita experiência e ninguém está dando valor para isso”, afirmou.
Sem ter outras opções na manga e com a poupança se esgotando, começou a fazer cursos gratuitos pela internet. Pensou: “Se não vingar, eu estou aprendendo uma coisa nova”. Começou com aulas de culinária, mas percebeu que, apesar do gosto pela cozinha, não tinha vocação para tal. Depois, tentou aulas de confecção de bonecas de tecido. E encontrou ali a oportunidade que buscava.
A empreitada começou com uma boneca de presente para a sobrinha, mas logo se transformou em negócio lucrativo. Janine fez um curso sobre como vender produtos nas redes sociais e, em apenas seis meses, criou sua empresa, a Leloo. Com o CNPJ e devidamente registrada por meio do MEI, passou a fornecer produtos para grandes redes de varejo, como Walmart e Lojas Americanas.
Hoje, ela tem pedidos de encomendas até outubro e uma funcionária que cuida das mídias sociais. Seu rendimento líquido é de 3.000 reais. O valor não é muito, considerando o que ganhava como estilista cerca de 6.000 reais. “Mas estou muito realizada e pretendo em breve ter uma empresa de verdade, com um ateliê e vários funcionários”, diz.
Além de ser vantajosa para o governo, que passa a recolher mais impostos, a regularização também traz benefícios ao trabalhador informal. Com CNPJ, ele passa a emitir nota e ter acesso a linhas de crédito de pessoas jurídicas, com juros menores e prazos maiores de pagamento. Também ganha a cobertura da previdência, a proteção da legislação sobre o negócio, e o direito de prestar serviços para os governos.
Em contrapartida, o empreendedor precisa pagar uma taxa mensal, que já condensa todos os tributos municipais, estaduais e federais, no valor máximo de 45,4 reais. Desta forma, o MEI é enquadrado apenas no Simples Nacional e fica isento de pagar Imposto de Renda, PIS, Cofins, IPI e CSLL. A única condição é que o faturamento não ultrapasse os 60.000 reais por ano.
“Para dar certo, é importante estudar um pouco o ramo e aprender conceitos de gestão empresarial, que não são nenhum bicho de sete cabeças. É minimamente saber fazer um fluxo de caixa, vender por um preço correto e ter controle sobre a sua atividade”, aconselha Bruno Caetano. Segundo o Sebrae, 55% dos empresários que se formalizaram tiveram um aumento no faturamento e 54% ampliaram o seu volume de investimentos.
Já o professor e especialista em mercado de trabalho, Helio Zylberstajn, da Universidade de São Paulo (USP), acredita que a formalização via MEI só dá “ares de legalidade” para o emprego informal, mas não resolve todos os problemas. O “calcanhar de Aquiles” do programa é justamente a alta taxa de inadimplência entre os microempreendedores, que chega ao nível de 40%. Ou seja, dos 5,1 milhões de trabalhadores cadastrados, cerca de 2 milhões estão com os pagamentos atrasados.
Fonte: Veja
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