Continuamos ladeira abaixo. A última bomba a causar estragos foi o rebaixamento da Standard & Poor’s nos colocando como junk bonds no mercado internacional de crédito. Como resultado se torna cada vez mais difícil ao governo e empresas captarem no mercado internacional, assim como rolar suas dívidas, a custos mais elevados. Fomos rebaixados, passando de BBB- para BB+, junto com 30 empresas nacionais, algumas mantidas em investment grade, outras rebaixadas a speculative grade, como Petrobras e Eletrobras.
Acabou decisivo nesta decisão o incoerente envio da peça orçamentária de 2016, com o governo praticamente “entregando os pontos” e não vendo capacidade de gerar saldo positivo. Lembremos do envio ao Congresso do Projeto de Lei Orçamentária para 2016, considerando um déficit de R$ 30,5 bilhões, meio que pressionando a classe política por uma solução para este desajuste fiscal. Foi, aliás, mais um fato a reforçar a cisão da equipe econômica, meio que imposto pelo Chefe da Casa Civil e tendo o apoio de Nelson Barbosa, ambos de formação mais heterodoxa, ao contrário do ministro Levy, mais ortodoxo, e por isto, meio “isolado” nesta equipe econômica. Tem-se, claramente, neste imbróglio, “restos” da nova matriz macro, fracasso do primeiro mandato, mas com o beneplácito da Presidente Dilma, se impondo ao ministro Levy. Segundo o economista da PUC, Rogério Furquim Werneck, “é como se o terceiro vértice do triângulo estivesse ocupado pela própria presidente”. Neste caso, teríamos Barbosa, Mercadante e Dilma de um lado, e Levy, meio que isolado, um “estranho no ninho”, no outro.
No comunicado da agência, “os desafios políticos aumentaram, pesando sobre a capacidade e a vontade do governo em apresentar um orçamento ao Congresso, coerente com a correção política do início do mandato da presidente Dilma”. O déficit, orçado em R$ 30,5 bilhões, 0,5% do PIB “deve representar três anos seguidos de déficit primário e um contínuo aumento da dívida pública.” Ou seja, diante da deterioração fiscal em curso e da incapacidade do governo de reverter este quadro, acabamos rebaixados, para o ministro Levy, “uma atitude precipitada”. Aliás, acabou “pior do que o soneto”, a resposta do ministro, numa entrevista coletiva insossa e pouco esclarecedora sobre como o governo deve responder a este rebaixamento. E o pior é que outras agências de rating também estão com uma lupa, de olho no fracasso parcial do ajuste realizado.
A Fitch, por exemplo, deve ser a próxima a rebaixar o país, visto que ainda não o fez, com a nota de crédito do país ainda a dois degraus do grau especulativo, mas em perspectiva negativa. A Moody’s rebaixou recentemente, mas nos colocou em perspectiva estável, talvez “querendo” acreditar nos ajustes que o Ministro Levy tenta levar adiante (ver quadro ao fim).
E nos próximos meses? O que esperar desta equipe econômica? Será que ela resiste, tais as defecções já observadas? Há luz no fim do túnel?
[su_quote]O problema é que temos uma execução fiscal totalmente engessada[/su_quote]
Difícil enxergar algo de positivo neste momento. O ambiente é muito turvo para termos certezas sobre algo. É possível que o governo anuncie por estes dias um pacote fiscal mais robusto, tentando reforçar a retórica de que é preciso “cortar na carne”, mas também tentar novas fontes de arrecadação.
O problema é que temos uma execução fiscal totalmente engessada. São cerca de R$ 960 bilhões em despesas obrigatórias, sendo 77,4% comprometidos com Despesas de Pessoal e Previdência. Em pessoal pouco se pode mexer, por serem servidores públicos com estabilidade no emprego. Uma alternativa, ventilada no mercado, seria o congelamento de salários, mas rejeitado pela presidente Dilma. No caso da Previdência, o déficit previsto para 2016 é de R$ 125 bilhões, depois de cerca de R$ 88 bilhões previstos neste ano. Uma série de fatores explicaria este ritmo explosivo, como envelhecimento da população, previdência pública distorcida, como aposentadorias integrais em muitas categorias, aposentadorias precoces, baseadas no tempo de contribuição, com 54 a 55 anos de idade, entre outros.
Este, aliás, é um ponto a ser salientado: o governo precisa se reinventar em termos de regime fiscal, tanto pelo lado dos gastos como pelas receitas. Sobre estas últimas, aliás, a situação se torna ainda mais complicada. Não estamos arrecadando neste ano de forma suficiente a “cobrir” as despesas, crescentes, até pelo crescimento da população e as demandas da sociedade por mais serviços públicos. No acumulado até junho, as despesas se mantiveram estáveis, crescendo apenas 0,4%, e as receitas recuaram 3,6%, dada a economia desaquecida e as desonerações adotadas no passado recente.
O governo calcula em R$ 64 bilhões o montante de recursos necessários para conseguir a meta de 0,7% do PIB ao fim deste ano. Boa parte destes deve vir pelo ganho de receitas, com novas alíquotas e impostos. Comenta-se muito, nestes últimos, sobre a criação de um tributo incidente sobre transações financeiras, temporário e com alíquota descendente e zerada no tempo, a partir da melhora fiscal e da retomada do crescimento.
Comenta-se também sobre a criação de IR para operações com LCIs e LCAs, nova alíquota de IR para faixas de renda mais alta em pessoa física e jurídica, redução da dedutibilidade da distribuição de lucro na forma de JCP e dos repasses do “sistema S”, criação de taxação para a repatriação de recursos no exterior, elevação da CIDE sobre combustíveis, de R$ 0,20 para R$ 0,60 por litro, com prováveis impactos inflacionário, dentre outras medidas.
Seria a tal “ponte fiscal”, defendida pelo Ministro Levy, no esforço de tentar consolidar o ajuste fiscal e levar adiante algumas Reformas Estruturais, em pauta, como a Tributária, pelo projeto de unificação do ICMS, e o esforço de resgatar a Reforma da Previdência. Este, aliás, é mais um ponto a ser ressaltado. Depois de 12 anos de ciclo petista, a agenda de reformas, tão necessária, retorna aos debates. Soma-se a isto, o fato de que é preciso avançar nestas medidas fiscais estruturais, na expectativa de evitar novos rebaixamentos e virar este jogo, até agora, em clara desvantagem para o país.
Achamos, inclusive, que deverá demorar alguns anos para voltarmos a ser investment grade pelo critério de avaliação da S&P, mesmo com o ajuste fiscal dando certo. Este retorno a “bom pagador” será lento e cheio de obstáculos no meio do caminho. Como sempre. Para perder a credibilidade, basta um movimento em falso, para recuperá-la, aí é uma longa caminhada.
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