O conceito de “qualidade democrática” – ao menos como perspectiva de estudo na ciência política – é relativamente recente. Após vários países do sul da Europa e da América Latina fazerem suas transições para a democracia – iniciadas na década de 1970 – e atingirem níveis mais ou menos de consolidação de seus regimes, o interesse passou a ser avaliar como de fato passaram a funcionar esses regimes, bem como em que dimensões eles poderiam variar e se aperfeiçoar. Falar da “qualidade” da democracia, portanto, implica em encarar os regimes democráticos como obras em aberto, sempre passíveis de serem aprofundadas.
[su_quote]A participação cidadã é imprescindível para o melhor funcionamento dos regimes democráticos[/su_quote]
Entretanto, esse aprofundamento – ou melhora de qualidade, digamos assim – não acontece no vácuo. Ele depende da continua capacidade dos cidadãos participarem da vida pública. Assim, mais do que simplesmente significar o direito de participar, democracias serão tanto melhores quanto maiores índices de intervenção efetiva da sociedade civil na política.
Importante dimensão das democracias que relaciona-se a essa participação é a accountability. O termo, sem tradução exata para o português, refere-se à prestação de contas dos agentes políticos à sociedade. A chamada accountability horizontal é aquela que diz respeito às próprias instituições do Estado que fazem esse controle, seja a estrutura do judiciário, do legislativo, do ministério público etc. Já a accountability vertical é aquela que permite ao cidadão controlar o desempenho de seus representantes eleitos no momento do voto.
Uma terceira vertente deste tipo de controle dos agentes políticos é a accountability social. Esta é aquele controle exercido pela sociedade civil, e instituições como a mídia, que se dá desvinculada das instituições públicas ou por intermédio dos partidos políticos. Trata-se da pressão exercida pela sociedade em períodos não eleitorais, e que cobra as instituições democráticas para o seu melhor funcionamento. Este tipo de controle da sociedade, além de auxiliar na pressão sobre as instituições públicas, pode ajudar na accountability horizontal, permanentemente fornecendo informações e um espaço de debate público para que as pessoas possam participar das eleições de forma mais informada.
Deste ponto de vista, portanto, a participação cidadã é imprescindível para o melhor funcionamento dos regimes democráticos. Mais recentemente, com o surgimento das novas tecnologias da comunicação e – mais especificamente das redes sociais – abriram-se novos canais de expressão da população. A manifestação de ideias e a circulação de informação passou a independer de canais formais de organizações da sociedade, podendo ser alcançada mais facilmente por qualquer cidadão. Não somente isso, as redes sociais também passaram a se converter em mecanismos adicionais de pressão da população sobre agentes públicos, uma espécie de termômetro dos fluxos de opiniões. É bem verdade que a existência deste novo espaço de debate público não significa necessariamente que esteja sendo utilizado da maneira mais inteligente pelas pessoas. É frequente sua utilização de forma mais superficial, com reprodução de “memes” que mais ganham aplausos dos que já pensam igual, do que buscam o convencimento do outro através do debate.
Certo é que, ainda que seja algo extremamente novo, já figura entre as formas que as pessoas consideram mais eficientes para pressionar o governo. Dados da pesquisa “Brasil, 25 anos de democracia” (2014) indicam que esta já é a segunda ação vista como a mais eficiente. “Participar de ações políticas pela internet” e “mobilizar as pessoas pela internet” são ações citadas por 20,4% das pessoas, atrás apenas de “organizar protestos e manifestações de rua” (23,3%). Dada a novidade do mecanismo, e dessa percepção de sua importância já alcançada, há que se acreditar que seu uso também passará por uma crescente aprendizagem, podendo se aproximar cada vez mais de seu potencial em expandir de modo mais eficiente a arena de debate público.
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