O PIB do segundo trimestre veio um pouco pior que a média das projeções de mercado, frustrando quem esperava nele encontrar sinais claros de retomada da atividade econômica. É verdade que houve boas notícias, como as altas da indústria e do investimento. Prevaleceram, porém, as quedas em serviços e no consumo das famílias, que pesam bem mais no PIB.
Esse resultado, creio, não vai arrefecer o debate entre os que acreditam que o PIB vai se recuperar logo, e crescer entre 1,5% e 2,5% em 2017, e aqueles que veem uma melhora mais modesta, com uma quase estagnação da atividade e uma expansão do PIB de 0,5% ou menos no ano que vem. São dois cenários positivos, depois de dois anos de brutal contração, mas que contam histórias diferentes.
O que alimenta as projeções mais otimistas é o aumento da confiança, de empresas e consumidores, como refletido nas pesquisas, e dos investidores, como mostram os preços de ativos como o real, as ações e os títulos de renda fixa. Em momentos semelhantes do passado, esses foram indicadores antecedentes do fim da recessão e do início de um período de expansão da atividade.
A alta na confiança reflete a troca de governo, em especial com a indicação de uma equipe econômica de ótima qualidade. Pesam também o anúncio de medidas como a PEC do teto de gastos, a reforma da previdência, mudanças para flexibilizar e reduzir a insegurança jurídica da regulação trabalhista, e um programa bem estruturado de concessões e privatizações, inclusive no setor de óleo e gás.
A leitura é que, concluído o processo de impeachment, o governo está livre para lutar pela aprovação dessas medidas. Isso levará a nova rodada de recuperação da confiança, estimulando os investimentos, para o que também contribuirá o programa de concessões. O câmbio mais competitivo, por sua vez, vai estimular as exportações industriais. Paralelamente, a queda da inflação em direção à meta de 4,5% permitirá uma forte redução dos juros, empurrando o gasto privado para cima e reduzindo a despesa com juros da dívida pública.
Aos poucos, o impulso vindo dessas frentes elevará o emprego, os salários e o crédito, estimulando o consumo e elevando os lucros e as receitas tributárias. A existência de elevada capacidade ociosa, depois de dois anos de recessão, vai permitir que essa recuperação se dê em ritmo forte, pelo menos no curto prazo.
A visão “estagnacionista” não nega esses fatos, mas questiona a força, o ritmo e o determinismo com que os otimistas os enxergam. O espaço é pequeno para analisar cada elemento individualmente, mas três pontos são suficientes para ilustrar o que está por trás dessa visão.
Primeiro, o espaço para a expansão do investimento e das exportações industriais é pequeno. Com a elevada ociosidade existente na economia, as empresas podem expandir a produção sem ampliar a capacidade instalada, não tendo, portanto, necessidade de investir. Além disso, as empresas já estão muito endividadas. A situação é inversa na infraestrutura, mas viabilizar bons projetos nessa área leva tempo, donde o impacto sobre o investimento em 2017 será modesto. As exportações, por sua vez, serão prejudicadas pelo lento crescimento do comércio internacional, a baixa competitividade da indústria e a recente valorização do real.
Segundo, o ajuste no mercado de trabalho ainda levará algum tempo. Isso fará com que as famílias apenas lentamente reduzam seu endividamento, de forma que o crédito ao consumo continuará escasso. A inflação também não tem cedido como se esperava e, como enfatizou o Copom no seu comunicado esta semana, os juros não vão cair tão rápido. O ajuste fiscal, por sua vez, passa pela redução do gasto público e, ainda que necessário, não permitirá uma grande expansão do consumo do governo. Isso significa que os fatores que puxaram o setor de serviços e o consumo das famílias para baixo no trimestre passado vão se dissipar apenas lentamente.
Terceiro, a aprovação do impeachment, ainda que positiva para o ajuste fiscal, não o garante. Dificilmente ela será suficiente para que o governo fique muito mais resistente às demandas das corporações e dos grupos de interesse do que foi até aqui. As disputas entre os núcleos econômico e político do governo não devem diminuir; ao contrário, a tendência é que aumentem. O mesmo deverá ocorrer dentro da base de sustentação do governo no Congresso. O resultado pode ser o avanço irregular das medidas de ajuste fiscal, tanto em termos do seu conteúdo como do ritmo em que vão avançar no Congresso.
O espaço para um novo rali no preço dos ativos é pequeno, a menos que ocorra um grande sucesso na aprovação das reformas. E, com os fundamentos ainda precários e a possibilidade de o BC americano (Fed) subir os juros, uma queda não deve ser descartada. Com isso, e dadas as ponderações acima, não é garantido que a confiança continue em alta. Isso levaria ao cenário de quase estagnação da atividade.
São cenários; o tempo dirá qual vai prevalecer.
Espaço para a expansão do investimento e das exportações é pequeno, e ajuste do mercado de trabalho levará tempo.
Fonte: “Valor econômico”, 2 de setembro de 2016.
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