A complexidade do sistema tributário e os altos custos que as empresas brasileiras relatam para se adequar a ele explicam a complacência com a sonegação fiscal no país, avaliam especialistas.”Se existem paraísos fiscais é porque existem infernos fiscais e nós infelizmente vivemos em um deles”, afirma Ana Claudia Utumi, advogada especialista em direito tributário da Tozzini Freire Advogados. “Somos líderes mundiais em complicar a vida do contribuinte”, complementa.
Há três semanas, o fim da CPI do Conselho Administrativo de Recursos Fiscais, o Carf, na Câmara dos Deputados sem a aprovação de um relatório trouxe a sensação de impunidade em relação aos empresários, companhias e entidades suspeitos de compra de sentenças para anular multas emitidas pelos conselheiros.
O prejuízo aos cofres públicos é estimado em R$ 19 bilhões. Mas o aperfeiçoamento dos sistemas de fiscalização eletrônica nos últimos anos apertou o cerco contra os fraudadores da Receita, escancarando a necessidade de criação de departamentos fiscais nas companhias, com profissionais especializados em garantir o cumprimento das leis e regulamentos externos e internos.
Considerado “primordial” para a sobrevivência de qualquer empresa, o custo do compliance tributário depende do tamanho da empresa, diversidade e capilaridade das suas atividades. “No Brasil, a maioria das empresas são pequenas ou médias, que estão obrigadas a essa parafernália de setores jurídicos para atender às exigências do Fisco”, afirma Roberto Pasqualin, sócio sênior da PLKC Advogados. “Mas afirmo com segurança: não há uma única empresa no Brasil, atualmente, 100% em dia com suas obrigações fiscais. O custo para atender à legislação é enorme para qualquer um”.
Vista anteriormente apenas como um setor de gestão de problemas e despesas, a área de governança corporativa tributária vem ganhando espaço nas companhias à medida em que os empresários e acionistas percebem sua influência na avaliação de desempenho dos seus negócios. Apesar dos elevados custos, a manutenção de advogados, escriturários e contadores nas estruturas das empresas reduz a possibilidade de autuação futuras do Fisco.
“É esse paradigma que deve ser quebrado. O empresário precisa compreender que ele tem que ver no gestor da área tributária um parceiro, um defensor, um sócio, com que ele precisa estar convenientemente alinhado. É preciso entender as necessidades reais e ponderar o que é prioritário”, destaca Carlos Nascimento, especialista em soluções fiscais e tributárias da Thomsom Reuters. “Tudo isso olhando para a sua estratégia e longevidade no mercado. Muito mais do que um setor de gestão de problema, o compliance tributário é um setor de gestão de resultados.”
Com mais de 90 tributos diferentes e milhares de resoluções ou instruções normativas que variam de município para município, a questão tributária é um desafio para os empresários. De acordo com o estudo “Doing Business 2016”, elaborado pelo Banco Mundial, o Brasil é o país onde as empresas mais levam tempo em todo o mundo para realizar o pagamento dos seus tributos. São necessárias, em média, 2.600 horas por ano, o que representa mais de 10 vezes a média mundial.
Essa burocracia obriga as empresas a contratar profissionais que sejam especializados em cada tipo de imposto para evitar erros ou omissões no momento da prestação de contas. “Nesse ponto, as grandes companhias já estão muito bem estruturadas, mas lido muito com casos de pequenos empresários que tomaram uma decisão errada porque não souberam interpretar a legislação”, diz Utumi, da Tozzini Freire. “Por isso mesmo, não é incomum encontrar nas empresas brasileiras as maiores equipes tributárias de todo o mundo”, complementa Gilmar Masiero, professor de Administração de Empresas da FEA/USP. “É custo tributário indireto. Se a empresa não fizer isso, acaba acumulando contingências com a Receita.”
Para o tributarista Fábio Lunardini, da Peixoto & Cury Advogados, a criação da cultura de compliance tributário cria benefícios de longo prazo para as empresas porque constitui um importante instrumento de transparência e relacionamento com fornecedores, instituições financeiras, parceiros de negócios e potenciais investidores. “O departamento financeiro, se bem gerido, provoca uma melhoria da atividade empresarial como um todo, uma vez que a empresa é capaz de aferir melhor seu desempenho e direcionar corretamente seu negócio.”
Fonte: “O Estado de S. Paulo”.
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