Na última quinta-feira, o presidente Michel Temer e sua equipe econômica anunciaram uma série de medidas microeconômicas para impulsionar a economia do país, gerar empregos e combater a inadimplência. Se forem oficializadas, algumas delas teriam poder de impactar consideravelmente a vida do empreendedor, como a redução dos juros do cartão de crédito, a diminuição do prazo de pagamento aos lojistas pelas operadoras de cartão e a eliminação de parte da multa em demissões sem justa causa.
Para João Luiz Mascolo, professor do MBA Executivo do Insper, apesar de parecerem importantes, alguns anúncios feitos pelo governo são muito mais para “mostrar serviço” do que, de fato, trazerem algum alívio à população e aos empreendedores. “Vivemos um momento difícil na política do país, com a quantidade de políticos envolvidos em denúncias de corrupção e a baixa popularidade do presidente, e esse anúncio parece ter vindo para acalmar o ânimo da população.”
Parte da descrença do professor – e também de boa parte do mercado – em relação às medidas prometidas pelo governo vem do fato de que algumas delas não são decisões que podem ser tomadas pelo poder público. É o caso da redução de juros do cartão de crédito. “O governo não tem influência para determinar quanto os grandes bancos privados devem cobrar pelos juros. O que foi esse anúncio, então? Um apelo às instituições?”. Outro ponto é que algumas das mudanças poderiam afetar a receita do governo federal, que já está bastante endividado. “Eliminar alguns impostos e taxas agora deve implicar na criação de novos mais para a frente, quando a poeira tiver baixado em Brasília.”
Em entrevista exclusiva à “Pequenas empresas e grandes negócios”, ele falou sobre algumas das medidas prometidas pelo governo de Michel Temer e quais seriam seus impactos na vida dos donos de negócios e na economia do país. Veja a seguir:
Redução dos juros do cartão de crédito
Para Mascolo, a única maneira possível de reduzir os juros do cartão de crédito seria aumentar a oferta de instituições financeiras no país. “Temos três bancos privados e dois públicos atuando no Brasil hoje. É claro que eles vão cobrar mais caro porque os consumidores não têm para onde correr. Para a comparar, os Estados Unidos possuem oito mil bancos”, diz o professor. Ele explica: o juro é o preço do crédito. “Se o juro está caro, o problema é de oferta e demanda. A oferta de bancos é pequena e a demanda por crédito é alta.” Com as recentes aquisições de Citybank pelo Itaú Unibanco e HSBC pelo Bradesco, o setor financeiro brasileiro ficou ainda menor. “Como o governo anuncia a redução dos juros do cartão se ele não tem influência nessa decisão? Não adianta fazer um apelo aos bancos. O que precisamos são de mais deles operando, estimulando a competitividade.”
Redução de no mínimo 40% dos tributos para importação e exportação
Para o professor, apesar de a medida ser plausível e possivelmente boa para os negócios brasileiros, ela também implicaria numa perda de receita por parte do governo. “Brasília receberia menos dinheiro, num momento em que a relação entre dívida pública e PIB (Produto Interno Bruto, a soma de todas as riquezas de um país) está enorme”, afirma Mascolo. “O governo não tem dinheiro e estaria reduzindo uma de suas fontes de receita.”
Eliminação de parte da multa por demissão sem justa causa
Para o professor, apesar de a medida fazer sentido para os empreendedores, ela também mostra certo desespero do governo em termos de receita. É como um cobertor curto demais: de um lado, a proposta ajudaria o empresário fazendo com que ele gaste menos em demissões, em um momento em que muitos funcionários estão sendo desligados das operações por conta da crise. De outro, existe um governo afogado em dívidas que está extinguindo parte de suas fontes de receita. “Eu acredito que, por isso, outras receitas deverão ser criadas”, diz Mascolo. “Eu não descarto que, assim que o cenário político permitir, ele [Michel Temer] terá de aumentar as fontes de receita criando outros impostos.”
Diminuição do prazo de pagamento aos lojistas pelas operadoras de cartão de crédito
“Ou essa medida é para tirar os pequenos [negócios] do mercado de cartão de crédito ou é para estimular os bancos a dar mais crédito”, diz o professor. De fato, o Nubank anunciou nesta segunda-feira que pode fechar caso o prazo de pagamento aos lojistas mude de 30 para dois dias. “Qual a operadora que teria condições fluxo de caixa para repassar aos lojistas o valor das compras em até dois dias? Apenas os grandes bancos tem estrutura para isso.”
Pagamento de dívidas com o FGTS
Para o professor esta é outra medida que beneficia as grandes instituições financeiras. “Irá aliviar a vida dos bancos, que estão com muita inadimplência”, diz. “Agora, você acha que o banco dará crédito novamente ao sujeito que estava inadimplente com ele até agora? Eu duvido.” Da mesma maneira, Mascolo cita o problema do endividamento das famílias. “A pessoa que acabou de usar o FGTS, a aposentadoria dela, para pagar uma dívida não quer voltar a ficar endividada. Não faz sentido ela pegar mais crédito”. A grande questão aqui é que, se as famílias pegassem mais crédito, teriam mais dinheiro para gastar – o que estimularia a economia e os negócios. Porém, se elas irão apenas usar o FGTS para pagar dívidas e não voltarão a gastar – por medo de ficarem endividadas novamente – essa injeção de capital não acontecerá.
Fonte: “Pequenas empresas e grandes negócios”.
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