A última reunião do Copom foi recebida como a primeira grande surpresa positiva deste novo governo. Até as vésperas da reunião de janeiro, os economistas, em sua ampla maioria, esperavam uma queda de 0.50 ponto percentual e o mercado tinha uma probabilidade embutida na curva de juros futuros perto de 70% para esse montante de corte. Mesmo sendo uma excelente notícia, a queda mais expressiva dos juros na atual conjuntura não deveria ter sido tão surpreendente. A decisão de acelerar o ritmo de queda da Selic para 75 pontos-base deve ser entendida no contexto das surpresas ocorridas na inflação e na atividade entre as reuniões de novembro e janeiro.
O BC já havia alertado, tanto na ata de novembro quanto no último Relatório de Inflação, que havia um risco palpável de intensificação do ritmo de flexibilização monetária caso não ocorresse uma retomada da atividade. O Copom deixou claro que tal intensificação dependeria das projeções e expectativas de inflação e de alguns fatores de risco. Estes englobavam a desaceleração da atividade, a resiliência da inflação de serviços, o ritmo de aprovação das reformas e o ambiente externo. A comunicação do BC estava bastante condicionada aos dados, havendo uma sinalização clara de um viés para uma maior flexibilização caso os dados corroborassem esse movimento.
Entre a reunião de novembro e a de janeiro, tivemos a divulgação de três IPCAs: o IPCA de novembro, o IPCA-15 de dezembro e o IPCA de dezembro. Esses três números foram verdadeiras surpresas positivas. O primeiro foi de 0,18%, enquanto o mercado esperava 0,27%. O segundo, de 0,19%, enquanto a expetativa era 0,29% e o terceiro, que já estava com as projeções bem ajustadas para baixo, conseguiu surpreender, foi de 0,35% contra projeções de 0,30%. Vale ressaltar que a expectativa do BC embutida nas suas projeções no Relatório de Inflação de dezembro para esse último IPCA era de 0,48%. A surpresa não ficou restrita a itens voláteis, a inflação se mostrou mais favorável justamente nos componentes mais sensíveis ao ciclo econômico, fator de risco descrito pelo Copom como relevante para suas decisões.
Com a melhora na inflação corrente, o Focus para esse ano caiu de 4,93% para 4,81%, movimento também destacado como importante para a provável intensificação do ritmo de flexibilização.
No campo da atividade, tivemos vários indicadores bem fracos relativos ao 4º trimestre, colocando um fim à tese do BC de que a atividade estava apenas oscilando em torno da estabilidade. O dado mais relevante foi a produção industrial de novembro, que subiu apenas 0,2% contra outubro, enquanto a expectativa era uma alta de 1,5%. A indústria havia tido um comportamento muito fraco nos meses anteriores e uma pequena retomada era vista como algo natural, mas surpreendentemente ela não ocorreu, desencadeando uma revisão para o PIB do 4º trimestre de 2016 e para 2017.
Entre as duas últimas reuniões do Copom também tivemos um ambiente externo mais benigno para os ativos brasileiros. Mesmo o Fed tendo subido os juros americanos, o real passou de R$ 3,40 para R$ 3,25. O governo enviou uma reforma da Previdência bastante abrangente para o Congresso que conseguiu tramitar na CCJ da Câmara ainda no final de 2016. Em janeiro os fundamentos da economia mostravam-se adequados a uma flexibilização da taxa de juros mais intensa do que o imaginado ao final de novembro.
O BC tem tido uma preocupação enorme em melhorar sua comunicação e tentar ser o mais transparente possível. Isso porque a informação, disponível tanto para as autoridades monetárias tomarem suas decisões quanto para os agentes econômicos formarem suas expectativas, é imperfeita. O Copom, ao definir as taxas de juros, não tem informações completas sobre o atual estado da economia e precisa ainda projetar as variáveis econômicas relevantes para os próximos meses. Tais variáveis dependem, em grande parte, das expectativas dos agentes econômicos, que precisam conjecturar sobre a função de reação das autoridades monetárias. As expectativas dos agentes são essenciais para a estratégia de política monetária, tornando a comunicação fundamental ao próprio processo decisório.
A efetividade da comunicação não deve ser medida pela comparação entre a precificação da curva de juros nas vésperas da decisão e o resultado do Copom. O BC será bem sucedido se for capaz de coordenar as expectativas de inflação para valores próximos à meta e conseguir trazer os juros reais de equilíbrio para baixo, junto com uma política fiscal responsável. Pode-se dizer que a última reunião aumentou a credibilidade do BC, pois a taxa do mercado de juros futuros caiu tanto na sua parte curta quanto na sua parte longa, a taxa de juros reais das NTN-Bs também caíram e as inflações implícitas nesses títulos não tiveram alterações significativas. Surpresa seria se o BC não agisse condicionalmente aos dados ou tentasse fazer os economistas acertarem 100% das vezes as suas decisões.
Fonte: “Valor econômico”, 24 de janeiro de 2017.
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