As contas públicas em ordem são o alicerce para o bom funcionamento da economia, ao impedir o crescimento explosivo da dívida pública e seu financiamento por meio de inflação. O rombo orçamentário do governo ameaça esse equilíbrio.
Há uma visão ingênua que o governo poderia facilmente reduzir despesas, e se não o faz é por descaso ou algo do tipo. Mesmo que se parasse toda a máquina pública, o rombo não seria coberto. Na realidade, o orçamento federal está praticamente todo comprometido com despesas obrigatórias (mais de 90%) que só poderão ser reduzidas com reformas estruturais. Os gastos da previdência comprometem 54% do deficitário orçamento; e vão crescer muito com o rápido envelhecimento da população. Iniciativas como reforma administrativa e combate à corrupção, ainda que salutares, não resolveriam o problema, porque tampouco são a real causa da rigidez e do rombo orçamentário.
Se o governo federal for bem-sucedido em aprovar a reforma da previdência, com ajustes que não comprometam o resultado final, ainda assim as despesas irão subir por um tempo, pois a transição da reforma é de 15/20 anos.
No curto prazo não é descabido propor aumento da carga tributária até que o efeito da reforma se materialize. Eliminar o rombo orçamentário mais rapidamente fortalece a confiança na capacidade do governo de honrar suas dívidas, o que ajuda a aliviar a taxa de juros do Banco Central.
Há, porém, custos envolvidos, especialmente neste momento em que a sociedade e o setor produtivo estão intolerantes ao aumento da carga tributária e que a economia está ainda frágil. Elevar a carga tributária pode não ser algo factível.
Como o governo avança com reformas fiscais, o rombo do orçamento no curto prazo provavelmente não irá comprometer sua credibilidade fiscal. Foi aprovada a regra do teto (EC 95), que estabelece que gastos públicos não poderão crescer acima da inflação por pelo menos 10 anos. E a reforma da previdência avança no Congresso.
A confiança no governo pode, no entanto, ir embora se este ceder a grupos de pressão e não conseguir aprovar uma boa reforma da previdência. A tolerância dos agentes econômicos a resultados fiscais deficitários pode acabar. Nesse caso, o aumento da carga tributária seria inevitável. A alternativa, pior ainda: inflação. Para benefício de poucos, que evitariam o ajuste da previdência, e prejuízo de todos que pagarão a conta.
Aumento de imposto é paliativo, tem limitações. No longo prazo, ele prejudica a economia. Do ponto de vista de eficiência econômica e de crescimento econômico de longo prazo, não há dúvidas que o melhor é enxugar despesas. Especialmente porque o sistema tributário brasileiro produz muitas distorções e a alocação de recursos públicos é inadequada. Esse é o espírito da regra do teto.
As reformas não poderão ser evitadas por muito tempo. Além da previdência, será importante os próximos governos avançarem no corte de outras despesas obrigatórias para elevar a capacidade do governo de investir e fazer políticas sociais.
O Brasil precisa discutir a estabilidade dos funcionários públicos, a gratuidade de universidades públicas, as renúncias tributárias. Essas políticas deveriam ser reavaliadas, independentemente do colapso das contas públicas, por conta das distorções e injustiça social que produzem. Melhorar a alocação de gastos públicos é a forma mais eficaz de combater a desigualdade. Em tempos de crise fiscal, essa agenda é ainda mais premente, pois com financiamento inflacionário do déficit público, os pobres perdem duplamente.
Nossa história é repleta de exemplos do quanto custa adiar reformas. A da previdência é um deles. Chegamos a um ponto de poucas opções. Não temos efetivamente a opção de aumentar impostos. Ela pode até ser evitada enquanto houver confiança nas reformas. Poderá ser um paliativo em caso de insucesso. Não será, no entanto, uma opção duradoura. Não é solução.
Fonte: “O Estado de S.Paulo”, 07/04/2017.
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