Fabian Santos Magalhães, CEO da Multicoisas, conta quais são as principais dificuldades enfrentadas no trabalho de profissionalização de companhias desse tipo
O primeiro emprego do atual CEO da Multicoisas, Fabian Santos Magalhães, foi justamente na empresa. Ele tinha apenas 14 anos de idade, em 1985, quando foi convidado por Lindolfo Martin, para trabalhar na loja que ele havia fundado em Campo Grande (MS) um ano antes. Na ocasião, Magalhães chamou a atenção do comerciante pelo seu interesse em computadores e foi chamado para ajudar no desenvolvimento de sistemas de automação do comércio. No final de 1986, deixou a empresa para estudar engenharia no Instituto Tecnológico da Aeronáutica (ITA). Seguiram, então, caminhos diferentes. Lindolfo fez do pequeno comércio uma franquia de varejo que hoje tem 203 unidades por todo o País e que trabalha para faturar R$ 500 milhões neste ano – o que representará um crescimento de 15% sobre 2016. Magalhães, por sua vez, formou-se, trabalhou na então Telesp, em seguida ficou na consultoria Booz Allen, de 1994 a 2002. Lá ganhou experiência em reestruturação de negócios. De 2003 a 2008, trabalhou na editora Abril, onde participou, ele conta, da recuperação da empresa – um trabalho pelo qual tem um carinho especial. A experiência seguinte foi em outra organização familiar, o Grupo Adeste, onde permanecer até o fim de 2015. Em setembro de 2016, voltou à Multicoisas, novamente a convite do fundador. Agora, com a missão de profissionalizar a companhia familiar e impulsionar seu crescimento. A seguir, trechos da conversa.
Consultoria
Em consultoria estratégica você passa por várias áreas de uma empresa. Por meio da consultoria, trabalhei em indústria pesada, telecomunicações, em varejo. Fiquei na Booz Allen do final de 1994 ao início de 2002. Nesse meio tempo, fiquei nos EUA de 1997 a 2000 como consultor e fazendo MBA. A atuação em consultoria me deu uma boa visão de negócios.
Negócios familiares
Eu acabei trabalhando muito com transformação de empresas familiares. Fiz as contas e deu quase 17 anos atuando de alguma maneira com transformação, sucessão, governança.
Controladores
Eu considero que a situação mais difícil quando você é CEO em uma empresa familiar é a questão do relacionamento com a família controladora. Sempre exigiu muito cuidado. Nas diferenças que eu tive, o jeito de atuar foi tentar garantir ao máximo, e explorar muito antes de tomar qualquer decisão, o comprometimento da família com a mudança (na gestão). Se não houver um alinhamento de objetivos, se não tiver uma química muito grande com a família, qualquer iniciativa é fadada ao fracasso.
Diplomata
Muitas vezes, o papel do CEO nessas situações de empresa familiar é de diplomata. Exige uma diplomacia no sentido de uma negociação contínua para viabilizar a transformação da empresa. Vai se discutindo posições e evoluindo gradativamente. É um trabalho diário.
Paciência e resiliência
Esse lado negociador é extremamente importante. E negociação implica em ter paciência e resiliência para discutir um mesmo assunto várias vezes, tentando levar a transformação adiante, sempre tendo claro onde se quer chegar, mesmo que eventualmente existam alguns desvios no caminho. Então, também é importante ter as ferramentas para desenvolver a visão estratégica clara de onde se quer chegar, porque isso ajuda a criar uma causa comum com os controladores da empresa.
Influência
Em empresas familiares ou com capital muito concentrado, as equipes são mais fortemente influenciadas por esses grupos controladores, seja um acionista majoritário ou uma família. Então, para formar sua equipe, além das questões técnicas e objetivas de quem são as melhores pessoas, entra uma outra questão, que é como compor o time em função dessas alianças para negociações, há que existe uma influência direta dos controladores na decisão. Como você lida com isso quando há desde executivos ligados à família, ou pessoas que historicamente estão na empresa, às vezes até familiares? É preciso manter bem claro onde você quer chegar para eventualmente não haver mudança que inviabilize o processo de transformação.
Multicoisas e ‘minoritários’
Na verdade, os franqueados são como acionistas minoritários. Então, a gestão desse relacionamento com os franqueados, mantê-los engajados com os objetivos da empresa, a gestão de conflitos de interesse, tudo isso é uma situação mais nova para mim. Penso que a questão negocial está sendo ainda mais exigida.
Desafio
A primeira grande questão da Multicoisas é a questão de sucessão e profissionalização. Ela se desenvolveu como uma empresa familiar e ao mesmo tempo em que ela é muito bem estruturada nas questões envolvendo a franquia, seu negócio principal, ao mesmo tempo existe um mundo de melhoria nos aspectos de processos internos. Essa é a primeira questão, de ganho de eficiência etc. A outra questão é a retomada do crescimento, procurar aumentar a velocidade de crescimento em um ambiente generalizado de pessimismo no mercado, apesar de sinais de recuperação que começam a aparecer.
Horizonte
Quando você olha situação do País, o varejo caindo 6%, 6,5% no ano passado, então o desafio para todas as empresas do varejo é muito grande, especialmente no Brasil. Além disso, o varejo mundial passa por um desafio: é um momento de transformação. Ou seja, qual vai ser o espaço da loja física em cinco, dez anos? Como vão se comportar as novas gerações, que provavelmente nunca usaram uma linha telefônica fixa e daqui a cinco/dez anos vão ser a maior parte de nossos consumidores? Então, a Multicoisas tem de revisar sua visão estratégica e ver como vai se posicionar daqui a cinco, dez anos. Ou seja, onde queremos chegar? Isso ainda está em discussão, mas as possibilidades são inúmeras.
Online
Com certeza, essa estratégia passa pelo online, mas não acreditamos que a solução seja simplesmente replicar o modelo de negócios no online. O que estamos trabalhando é como integrar a nossa atuação online à nossa atuação nas lojas. E daí criar uma experiência para nosso consumidor que seja diferenciada. Acreditamos que o nosso diferencial seja a proximidade, o apoio de uma venda assistida, dando suporte ao cliente. Enfim, um ambiente acolhedor e o grande desafio está como utilizar o digital, para reforçar essa experiência.
Foto: “O Estado de S. Paulo”
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