Vários pensadores, desde Adam Smith (“A riqueza das nações”), Alexis de Toqueville (“A democracia na América”), passando por Max Weber (“A ética protestante e o espírito do capitalismo”), entre outros, já haviam inferido a importância dos aspectos não econômicos — leia-se: tradições morais e religiosas, costumes, crenças, etc — no progresso e desenvolvimento das sociedades. Os economistas, no entanto, talvez marcados pela grande influência do materialismo marxista, cujo foco convergia exclusivamente sobre os meios, modos e fatores de produção, só começaram a entender a influência das instituições (formais e informais) no desenvolvimento econômico muito tempo depois.
Aos poucos, principalmente em razão da prosperidade alcançada por alguns países cujos recursos físicos eram escassos, e do persistente subdesenvolvimento de outros, onde havia riquezas naturais de sobra, os economistas começaram a perceber que uma boa parcela dos bens produzidos provém de fatores outros, e não apenas dos tradicionais “capital” e “trabalho”. O consenso atual (pelo menos fora dos meios marxistas) é que os chamados capitais sociais, ou intangíveis, são muito importantes e desempenham um papel preponderante no jogo econômico.
O Banco Mundial publicou, em 2006, um interessante trabalho cujo objetivo foi estimar, monetariamente, a participação de três diferentes tipos de capital — natural, produtivo (bens de capital) e intangível — na produção de riqueza de 120 países.
O estudo mostra que quanto mais desenvolvidas (em termos de riqueza per capita) são as economias, menos elas dependem dos recursos naturais e mais utilizam os chamados capitais intangíveis. A comparação entre os dez primeiros do ranking e os dez últimos não deixa margem para dúvidas. A participação do capital natural na produção de riquezas dos países mais ricos varia entre 0 e 3% do total (com exceção da Noruega), enquanto nos países mais pobres essa participação alcança uma média aproximada de 40%. Por outro lado, os ativos intangíveis têm uma participação média acima de 80% nas economias mais avançadas, enquanto navegam por índices que vão de 35 a 60% nos países mais pobres.
A definição de “capital intangível” é dada por Kirk Hamilton, um dos autores do estudo: “a maior parte da riqueza de um país é proveniente do que se chamaria de “capital intangível”… Ativos intangíveis incluem as habilidades e conhecimentos incorporados à força de trabalho, bem como o “capital social”, que se poderia definir como a confiança existente entre as pessoas e a sua capacidade para trabalhar juntas, visando a um propósito comum. Uma parte residual desse capital intangível deve ser levada à conta de elementos de governança, que impulsionam a produtividade do trabalho. Por exemplo, se uma economia dispõe de um sistema judicial eficiente, direitos de propriedade bem definidos e um governo efetivo [nas suas atividades básicas], os efeitos irão resultar num padrão de riqueza elevado…”
Os resultados demonstram algo que os marxistas e mercantilistas ainda teimam em negar: a diferença crucial entre as nações prósperas e as demais está basicamente na forma de organizar as relações sociais e comerciais, e não na disponibilidade dos famigerados “recursos naturais estratégicos”. Não é por mero acaso que a maioria dos países produtores e exportadores de petróleo, permanece presa ao subdesenvolvimento (olhem para a Venezuela, detentoras das maiores reservas provadas de petróleo do planeta), enquanto outros, que não dispõem de uma só gota do “ouro negro”, vão muito bem, obrigado.
Entre as nações árabes do Oriente Médio, por exemplo, talvez as mais prósperas sejam exatamente aquelas que não dependem do petróleo. Dubai, uma pequena cidade portuária dos Emirados Árabes, conta hoje com uma economia vibrante, enquanto os seus vizinhos permanecem estagnados e totalmente dependentes das rendas petrolíferas. Somente pouco mais de 5% da renda daquele emirado é obtida do petróleo. A maior parte dos seus recursos provém da Zona Franca Jebel Ali, onde se localiza o porto de Dubai (o 13° mais movimentado do mundo), do turismo e de um pujante centro financeiro e tecnológico. Evidentemente, a liberdade econômica ali existente, ao contrário do que acontece nos países vizinhos, permite que empresas de todas as nacionalidades gozem de vantajosas isenções comerciais e fiscais para que levem seus capitais e tecnologias para lá.
É até um tanto óbvia esta relação causal entre a boa qualidade das instituições e o desenvolvimento das sociedades. Nas nações mais prósperas, como muito bem definiu Carlos Alberto Montaner, “a propriedade privada é respeitada e impera o Estado de Direito. Há menores índices de corrupção e realizou-se, durante muito tempo, um grande esforço em matéria de educação. Além disso, o grande protagonista no terreno econômico [mesmo nas sociais-democracias da Europa Ocidental] é a sociedade civil, não o Estado. Em todas elas, o Estado é administrado com sensatez, o poder judiciário funciona razoavelmente, as instituições são sólidas e os empresários podem fazer planos de longo prazo. Nestes países se poupa, se investe, se pesquisa e se compete tenazmente para conquistar quotas de mercado, num tenso processo produtivo que pouco a pouco vai enriquecendo o conjunto da sociedade”.
Naquelas sociedades também existe uma cultura empresarial mais ou menos homogênea, que permite que um empresário utilize capital estrangeiro para desenvolver projetos de investimento, tanto em seu país de origem, quanto alhures. Em síntese, o primeiro mundo é um grande espaço econômico, com regras do jogo claras e uniformes, no qual os modos de produção e administração são parecidos, intercambiáveis e todos se beneficiam das interações individuais e empresariais, ainda que os níveis de renda entre eles difiram de um lugar para o outro.
Fonte: Instituto Liberal, 25 de abril de 2017.
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