Ao prestar depoimento no Tribunal Superior Eleitoral (TSE), o marqueteiro João Santana e sua esposa Mônica Moura confirmaram, segundo os fatos noticiados, que a então candidata Dilma Rousseff (PT) tinha pleno conhecimento dos pagamentos ilícitos feitos em sua campanha eleitoral. Em pronta resposta, a ex-presidente emitiu nota dizendo que os depoentes “faltaram com a verdade”. Sim, a política no Brasil virou uma grande mentira. E não será uma retórica vazia – flagrantemente desviada de nossa triste realidade corrompida – que resgatará a credibilidade da vida pública nacional.
A receita é simples: chega de cinismo porque as pessoas estão cansadas de serem enganadas. Ninguém espera milagres da política, mas a democracia traz consigo o sincero desejo interior de querer acreditar nas lideranças públicas. Eis aí o maior crime político dos atuais canalhas de plantão: estão matando o sentimento de esperança que eleva o ideal democrático e que faz da política o espaço de realização do bem comum.
Se quisermos resgatar a respeitabilidade das instituições nacionais, temos que recompor o imperativo da verdade na ação política responsável. Aqui, a memória lança luzes sobre a histórica entrevista de Václav Havel, publicada pelo Le Monde em abril de 1983; após passar quase quatro anos preso por ter cometido o “delito” de se opor ao regime comunista tcheco, Havel revelou que, antes de fazer parte de uma ideologia, doutrina ou partido, ele meramente optou pelo lado da verdade contra a mentira.
Chega. É preciso acabar com a farsa da política brasileira. Os discursos são uma mentira; as contas de campanha são uma mentira; os partidos são uma mentira; e os políticos, em larga medida, são uma mentira corrupta. Enfim, não há como ter uma democracia autêntica nesse palco de falsidades venais. Por tudo, a corrosão do tecido político brasileiro exige uma nova postura cívica de nossa parte. Não adianta só ficar revoltado no sofá e pensar que a política irá mudar por críticas inflamadas. Não, definitivamente não. Palavras são importantes, mas o que muda a política são as ações concretas.
A retomada da credibilidade na vida pública nacional pressupõe, além de um discurso pautado por premissas de verdade, o surgir de lideranças exemplares e virtuosas. Infelizmente, a acintosa indignidade política que marca a presente quadra histórica está criando um clima de ceticismo generalizado: as pessoas estão começando a duvidar de tudo e não acreditam mais em ninguém. O grave é que esse vazio de confiança democrática pode vir a ser preenchido pelos piores populismos, comprometendo a realização eficaz dos direitos da liberdade.
Em tempos de outrora, foi dito que se o voto resolvesse os nossos problemas, seria considerado ilegal. Sim, votar é essencial, mas está longe de ser uma condição suficiente à democracia plena. Aliás, os recentes casos de corrupção que enojam os brasileiros de bem são a prova viva de que as eleições podem ser transformadas em um decadente jogo de cartas marcadas. Os donos do poder não brincam em serviço. Uma vez concedido o direito de voto, foi preciso controlar o resultado das urnas. Para tanto, bastou comprar uma maioria parlamentar de empreitada que pelas benesses da política aceitam qualquer negócio. Dito e feito. Ao invés de eleições dignas, passamos a ter um grande cassino eleitoral.
A classe política que aí está não tem salvação; são filhos de um modelo patrimonialista estúpido que escravizou a cidadania brasileira na senzala da indecência absoluta. Novos tempos e hábitos hão de surgir, mas teremos que fazer uma inevitável travessia. Se geração de Tancredo, Montoro, Ulysses, Covas, Brossard e tantos outros lutaram pela redemocratização do Brasil, cabe a nós dar cores de verdade a esse ideal que anda tão cinzento. Não será fácil, mas valerá a pena, pois são, nos desafios do presente, que a humanidade encontra forças para fazer do impossível uma oportunidade real.
Ou seremos tão covardes a ponto de desistir sem tentar?
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