Em menos de 48 horas, o cenário político-econômico brasileiro virou de cabeça para baixo. A denúncia de que o presidente Michel Temer estaria envolvido na negociação de propinas para o ex-presidente da Câmara, Eduardo Cunha, inundou o mercado de incertezas. Nesta quinta-feira, o Ibovespa chegou a cair mais de 10%; algumas das maiores empresas do país, que nem mesmo estão envolvidas na Lava-Jato, como Itaú Unibanco e Ambev, assistiram suas ações se desvalorizarem; e o dólar subiu para algo em torno de R$ 3,40 nos momentos de pico, um aumento de mais de 8% em relação à última quarta-feira.
Na terça-feira, a notícia de que o PIB (Produto Interno Bruto) poderia crescer 1,12% no primeiro trimestre de 2017, segundo o IBC-Br do Banco Central, sinalizava que a economia caminhava para uma retomada. As vendas do Dia das Mães, data importantíssima para o varejo, registraram alta de 2% em relação à mesma data em 2016, de acordo com a Serasa Experian, apontando aquecimento no consumo. Após dois anos, economistas acreditavam que a recessão estava ficando para trás.
A pergunta que fica agora é como o cenário de incertezas trazido pela delação da JBS e pela decisão de Temer em permanecer no governo afetará esse embalo. “Pequenas empresas e grandes negócios” conversou com dois especialistas para destrinchar o assunto e ajudar o empreendedor a se programar diante das mudanças dos últimos dois dias.
Espera e replanejamento
O professor da FGV-EAESP, Márcio Sanches, acredita que o melhor a fazer agora é esperar antes de tomar qualquer decisão importante para o negócio. A reforma trabalhista, os ajustes na política fiscal e a queda na taxa de juros eram os grandes trunfos do governo Temer, responsáveis por fazer com que os mercados interno e externo acreditassem na volta do crescimento econômico.
“Agora, ninguém sabe se essas reformas serão aprovadas”, diz Sanches. “Depois da delação, o presidente perdeu apoio e terá dificuldade de conduzir as políticas econômicas com as quais se comprometeu.” Isso significa que as mudanças esperadas por investidores brasileiros e estrangeiros muito provavelmente não acontecerão — ou vão demorar para sair. “É como se a situação econômica continuasse a mesma de um ano atrás, com toda a incerteza política”, diz Sanches. Ele lembra que a situação também afeta o consumo. “Se a população não sabe como será o dia de amanhã, ela para de comprar.”
Em momentos como esse, é importante não se comprometer com dívidas ou grandes projetos. “Com a insegurança, a taxa de juros tende a subir e o custo do dinheiro aumenta. Vale a pena evitar o endividamento.” O professor também recomenda não tirar projetos do papel por enquanto. “É preciso ter liquidez para enfrentar os dias difíceis que podem vir.”
Impactos diferentes
Alguns setores da economia não são tão impactados por questões internas quanto outros, lembra Alexandre Cesar Kawakami, especialista em mercado de capitais e professor do Instituto de Direito Público de São Paulo. É o caso, por exemplo, da agricultura e da mineração, que são majoritariamente voltados à exportação. “Os empresários que atuam nestas áreas provavelmente não verão muita mudança nos negócios”, diz Kawakami.
Já as empresas voltadas para o consumo doméstico terão de segurar os gastos. “Havia uma perspectiva da diminuição do desemprego com a reforma trabalhista. Agora, com essa situação, não sabemos se haverá qualquer reforma. O cenário não se consolida”, afirma. “E população desempregada não consome.”
Quem presta serviços ou vende para o setor público enfrenta uma situação delicada. “Como ainda não se sabe se este governo continuará no poder, o clima é basicamente de pré-eleição.” Neste momento, argumenta Kawakami, dificilmente Temer conseguirá fazer novos investimentos públicos. Não é momento de investir no aumento da operação.
Tanto Kawakami quanto Sanches acreditam que a renúncia do presidente seria a melhor saída para o ambiente de negócios, caso as denúncias feitas contra ele sejam comprovadas. Para Kawakami, a saída de Temer poderia ser encarada pelo mercado internacional como uma demonstração de maturidade das instituições brasileiras. “Contudo, tudo poderia mudar dependendo de quem assumisse no lugar dele”, afirma.
Para Sanches, o problema é que o governo enfrentará muitas dificuldades para aprovar reformas. “O mercado o apoiava porque ele havia proposto as reformas e conseguia lidar com o Congresso. Agora, ele terá de barganhar muito para fazer mudanças”, diz. “Vai ser muito sofrido para os negócios.”
Fonte: “Pequenas empresas e grandes negócios”.
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