No sábado passado, em poucas horas, o Brasil teve três presidentes da República. Conforme calculou o “Broadcast”, serviço de notícias eletrônicas da Agência Estado, entre 11h e 14h15 desse mesmo dia, o chefe do governo era Eunício Oliveira, presidente do Senado, que havia substituído Michel Temer em razão sua viagem à Alemanha.
Depois, o chefe do governo foi Rodrigo Maia, presidente da Câmara, o primeiro na linha sucessória, que estava na Argentina quando Michel Temer viajou. Maia embarcou em Buenos Aires às 11h15 e virou presidente ao ingressar no espaço aéreo brasileiro. O terceiro foi o próprio Temer, que teria entrado no nosso espaço aéreo por volta das 14h15. Maia foi provavelmente o primeiro presidente a exercer o cargo inteiramente a bordo de um avião.
Na era do satélite artificial, da revolução digital e de quanto isso viabiliza a comunicação instantânea de dados, voz e imagem, e a assinatura eletrônica, não há justificativa para a obsoleta regra de substituição do presidente em suas ausências do país.
Pela Constituição, artigo 79, “substituirá o presidente, no caso de impedimento, e suceder-lhe-á, no caso de vaga, o vice-presidente”. As hipóteses de impedimento ou a vaga são as de morte, renúncia ou impeachment. A saída do Brasil não caracteriza, a meu ver, qualquer uma delas.
Nos 230 anos da Constituição americana, o vice-presidente só assumiu quando o presidente morreu ou renunciou. Lá, ninguém perdeu o cargo por impeachment. Nem mesmo quando havia sequer o telégrafo o vice-presidente assumia em viagens do presidente ao exterior.
Aqui, quando o presidente vai ao exterior, o vice-presidente assume o cargo, senta na cadeira presidencial, assina decretos e sanciona leis. Recebe pessoas no Planalto e participa de cerimônias oficiais como se presidente efetivo fosse. Pousa para fotos com amigos e familiares para registrar, perante a história, sua passagem pela chefia do governo.
Caso interessante foi o do presidente da Câmara que substituiu José Sarney, ele próprio substituto de Tancredo Neves. O substituto lotou o avião presidencial com parlamentares, amigos e parentes e desembarcou como presidente em Fortaleza, onde foi recebido com homenagens típicas do cargo.
Há ainda a situação em que, nas proximidades das eleições, o presidente da Câmara se ausenta do país quando o presidente viaja ao exterior. Evita, por assumir o cargo, tornar-se inelegível na campanha para reeleger-se deputado federal. Mais uma despesa desnecessária.
É hora de mudar a regra. Não precisa alterar a Constituição. O chefe do governo americano (e provavelmente de muitos países), assina documentos oficiais quando está no exterior em viagens oficiais. Fazer o mesmo aqui acabaria com uma arcaica tradição. Seríamos poupados de gastos desnecessários e de situações ridículas.
Fonte: “Veja”, 10/07/2017.
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