O governo tem nas mãos um amplo pacote de redução de despesas — com foco nos gastos com funcionalismo — para tentar fechar as contas de 2018. As medidas incluem limitar o salário de ingresso do serviço público, fixar um prazo para o recebimento do auxílio-moradia, reduzir o valor da ajuda de custo (paga a funcionários transferidos de um estado para outro por necessidade de serviço), elevar a contribuição previdenciária dos servidores de 11% para 14%, não preencher cargos que estejam vagos e adiar o reajuste das categorias de 2018 para 2019. Também está nos planos a extinção do auxílio reclusão, concedido a famílias de pessoas que estejam presas.
Mesmo assim, as contas não fecham, e a equipe econômica deve ser obrigada a elevar a meta fiscal do ano que vem, fixada hoje num déficit primário de R$ 129 bilhões. O número pode subir para R$ 149 bilhões. O cenário para 2017 também é negativo, e o rombo do ano deve passar de um déficit primário de R$ 139 bilhões para R$ 159 bilhões.
O governo planejava anunciar uma revisão das metas fiscais de 2017 e 2018 ontem, junto das medidas de controle de gastos, mas não conseguiu fechar os números de arrecadação. Há frustrações de receitas tanto neste ano quanto no próximo e, por isso, também é preciso elevar tributos. No entanto, depois de uma reunião do presidente Michel Temer e da equipe econômica com os presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), do Senado, Eunício Oliveira (PMDB-CE), e com líderes, o governo ouviu que não há como garantir que aumentos de carga tributária serão aprovados no Congresso.
REJEIÇÃO A AUMENTO DE IMPOSTOS
Segundo um interlocutor, o ministro da Fazenda, Henrique Meirelles, apresentou um cardápio com opções de tributos que poderiam ser majorados, mas houve uma forte reação dos políticos presentes da reunião. Temer, então, adiou o anúncio da revisão das metas para segunda-feira. Enquanto isso, a equipe econômica vai passar o fim de semana refazendo as contas — a pedido dos próprios parlamentares, disse um ministro.
— Nós achamos que medidas que elevam impostos não avançam no Congresso. Só se for em último caso, inevitável, mesmo — disse um parlamentar da base de apoio ao governo.
Para esse parlamentar, o fato de o presidente ter admitido que estudava elevar alíquota do Imposto de Renda (IR) para salários mais altos acabou por criar uma barreira no Congresso. Nem mesmo a tributação de lucro e dividendos passa mais, destacou. Ele disse, ainda, que Meirelles justificou que o caminho mais fácil seria elevar só a meta fiscal, mas que isso teria um impacto negativo no mercado. Por isso, o ministro propôs cortar gastos e subir impostos.
TEMER: ‘GOVERNO NÃO MENTE’
Depois da reunião, Temer e os ministros da área econômica participaram de uma cerimônia para anunciar a divisão do lucro do FGTS, na tentativa de impor agendas positivas. No discurso, o presidente disse que o governo não mente e pode tomar medidas “rigorosas”:
— A cada dia praticamos um ato, ora da responsabilidade fiscal, ou seja, o governo não mente para o povo brasileiro. Mas, muitas vezes, toma medidas rigorosas, mas indispensáveis para a higidez das finanças públicas.
Antes de Temer, Meirelles citou aumento de impostos como uma possibilidade para aliviar os cofres públicos.
— Ou aumenta mais imposto ou toma mais recursos emprestados da sociedade, aumentando a dívida pública e os juros — destacou Meirelles.
Técnicos da equipe econômica afirmam que há incertezas envolvendo a arrecadação, sobretudo em relação ao novo Refis, que poderia render R$ 13,3 bilhões este ano. A medida provisória (MP) que cria o programa foi desvirtuada pelo relator na Câmara, deputado Newton Cardoso Jr. (PMDB-MG), e, se for aprovada com as mudanças propostas, só vai render R$ 400 milhões. O governo já avalia deixar o texto caducar e enviar ao Congresso um projeto de lei tratando do mesmo tema.
De acordo com esses interlocutores, mesmo que a meta de 2017 suba para R$ 159 bilhões, a conta não fecha se o Refis não for aprovado na forma como foi proposto pelo governo. Assim, o que vai ser discutido até segunda-feira é se é possível fechar com o Congresso um acordo sobre o programa.
Como o ministro da Fazenda não quer que o novo rombo supere R$ 159 bilhões (valor do déficit registrado em 2016), ele estaria disposto até mesmo a contingenciar ainda mais o Orçamento — que já foi cortado em R$ 45 bilhões — para conseguir atingir o resultado do ano. Isso, contudo, deixa o país próximo do chamado shutdown, paralisação da máquina pública por falta de recursos.
Já está certo, segundo um assessor do presidente, que o reajuste dos funcionários públicos será adiado para aliviar as contas em 2018. Os cortes dos auxílios auferidos pela categoria também, apesar da necessidade de aprovação de projetos de lei e mesmo alteração à Constituição. A intenção é mostrar que, antes de elevar impostos, o governo vai cortar gastos.
As medidas serão detalhadas pelo Ministério do Planejamento hoje. Os números do pacote de redução de gastos ainda estão sendo fechados, mas a limitação do salário inicial dos servidores em R$ 5 mil, por exemplo, daria uma economia de R$ 83 bilhões aos cofres públicos num prazo de 30 anos. Essas pessoas teriam uma espécie de escadinha para aumento gradual de remuneração. Segundo integrantes do governo, existem hoje carreiras em que o funcionário ingressa no serviço público ganhando quase R$ 20 mil.
O adiamento dos reajustes do funcionalismo é a medida de maior impacto para 2017: economia de R$ 9,7 bilhões. Com a limitação do auxílio-moradia, o governo pode economizar R$ 35 milhões por ano. Já o corte com ajuda de custo dá um alívio de R$ 49 milhões anualmente. A extinção do auxílio reclusão, por sua vez, resulta numa economia de R$ 600 milhões por ano.
Os ministros da área econômica também passaram a defender a aprovação rápida de um projeto que está no Congresso e que fixa um teto remuneratório para os servidores públicos. A medida atingirá, principalmente, o Judiciário.
Embora aumentem o rombo fiscal, as novas metas são ousadas, segundo interlocutores do governo. O potencial de frustração de receitas é superior a R$ 20 bilhões em 2017. E, para 2018, o déficit detectado internamente varia entre R$ 40 bilhões e R$ 50 bilhões. Isso significa que o governo terá de apertar muito os cintos para chegar aos novos números.
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