Na terça, manobra inédita adiou apreciação da matéria e provocou tumulto no mercado financeiro
A Medida Provisória 777, que cria a Taxa de Longo Prazo (TLP) passou pela Comissão Especial que discute o assunto no Congresso Nacional. O texto foi aprovado por 17 votos favoráveis e seis contrários. A matéria, considerada a prioridade do momento da equipe econômica, pode ser votada ainda nesta quarta-feira na Câmara dos Deputados. Ela muda toda a sistemática dos juros dos empréstimos do BNDES, diminui os subsídios e aumenta o poder de fogo do Banco Central no combate à inflação.
A comissão especial era o primeiro passo na tramitação da matéria. Também era o mais difícil. Foi considerada a maior barreira porque a presidência foi dada ao senador da oposição Lindbergh Farias (PT-RJ). Ele usou o cargo para manobrar e retardar o andamento da matéria. O governo, entretanto, tinha pressa porque a MP perderá a validade no dia 6 de setembro.
O texto só foi debatido efetivamente na sessão da manhã desta quarta-feira. O senador José Serra (PSDB-SP) apresentou um relatório alternativo em que defendeu a permanência da antiga Taxa de Juros de Longo Prazo (TJLP) apenas para financiamentos feitos com recursos do FAT, o Fundo de Amparo ao Trabalhador. Ele até argumentou que o Brasil poderia até ter problemas na Organização Mundial do Comércio (OMC) por admitir o que nega há anos: que empréstimos com dinheiro do FAT são subsidiados. No entanto, o texto nem chegou a ser votado.
Na contramão do ex-ministro das Relações Exteriores de Michel Temer, contrário à TLP, um ex-ministro do governo Dilma foi uma das principais vozes a favor da mudança. Armando Monteiro Neto (PTB-PE) teria tudo para votar contra: é oposição e foi presidente da Confederação Nacional da Indústria (CNI). Representantes do setor, como a Federação das Indústrias de São Paulo (Fiesp), atuaram para barrar a reforma nos juros.
Armando Monteiro disse que votar a favor da MP não significava que ele seja contra uma política industrial, o BNDES ou até mesmo incentivos. Citou que a Zona Franca de Manaus é um subsídio, mas lembrou que ele é aprovado pelo Congresso Nacional e que as benesses pagas pelo Tesouro Nacional ao empresariado que pega taxa subsidiada não são.
Falou ainda que o problema mais grave do país é a taxa de juro estrutural da economia brasileira, ou seja, o alto preço que o país paga por sua falta de funcionalidade. Defendeu que a MP melhora o quadro. Disse também que manter uma taxa de juros baixa não influencia investimento.
— O que vai definir a taxa de investimento no Brasil é o reequilíbrio macroeconômico. É buscar condições que propiciem as empresas o melhor ambiente de operação e a maior perspectiva de que virá um processo saudável de capitalização e reinvestimento de lucro — explicou aos colegas. — E não pela simples manutenção da TJLP que não tem tração ou força para elevar o investimento.
Com isso, ele foi extremamente aplaudido e elogiado pelos demais parlamentares tanto do governo quanto da oposição. E na hora de votar, deixou claro que não aprovava a medida por causa do governo Temer.
— Apesar do encaminhamento do governo, meu voto é sim.
Estrategicamente, na sessão desta quarta-feira, os apoiadores da medida não pediram a palavra para tentar acelerar o processo e evitar mais atrasos. O trauma do dia anterior era grande. Na terça-feira, uma manobra inédita adiou a votação e provocou cenas de baixaria entre os parlamentares e tumulto no mercado financeiro.
O presidente da comissão Lindbergh Farias (PT-RJ) permitiu que a oposição obstruísse os trabalhos com vários pedidos como a leitura das atas anteriores e, após um questionamento do senador José Serra sobre a necessidade de ter expresso o impacto fiscal da medida, ele deu um prazo de uma semana para o relator da matéria, deputado Betinho Gomes (PSDB-PE) apresentar respostas sobre o assunto e encerrou abruptamente a discussão.
Como, normalmente, uma decisão como essa é apresentada ao plenário, ele foi taxado de “déspota”, “moleque” e “autoritário”. Houve uma grita geral e – depois da intervenção do presidente do Senado, Eunício Oliveira (PMDB-CE) – a sessão desta quarta-feira foi garantida.
TLP
A TLP vai acabar com os subsídios dado a empresário e que ficam escondidos no Orçamento federal e ainda corrigirá uma distorção no crédito brasileiro. O fim da TJLP é considerado importante para aumentar o poder de fogo do BC na hora de controlar a inflação.
A ideia do governo é que ela comece a vigorar no início de 2018, no mesmo patamar que a TJLP, que está em 7% ao ano. E, num período de cinco anos, ela teria uma transição para uma taxa de mercado estabelecida com base na NTN-B.
Com uma taxa mais próxima do que está em vigor no mercado, os analistas preveem uma queda no chamado juro estrutural da economia, ou seja, aquele que não incentiva e nem freia a inflação. Essa baixa beneficiaria a todos que pegam empréstimos no país e não apenas o setor produtivo que recebeu várias benesses na última década.
Se aprovada, a TLP será calculada com base no rendimento dos três últimos meses da NTN-B e não no do último mês, como previa o texto original da MP. Com isso, pretende cessar as críticas em relação à volatilidade que poderia gerar na taxa, importante para o financiamento de investimentos.
O governo tem pressa: a medida provisória perderá a validade daqui duas semanas. Ela tem de ser votada na comissão, na Câmara dos Deputados e no Senado Federal.
Segundo o deputado Betinho, há a possibilidade de a matéria ser levada ainda na quarta-feira ao plenário da Câmara, se for aprovada pela comissão. Na quinta-feira, pode ir para o Senado.
Fonte: “O Globo”
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