Embora o Tesouro Nacional tenha em seu caixa quase R$ 1 trilhão (R$ 954,7 bilhões), a equipe econômica só tem liberdade para usar livremente 5% desse montante, ou R$ 47,4 bilhões. Isso ocorre por causa das vinculações de recursos do Orçamento, que obrigam que determinadas receitas sejam usadas apenas para um fim específico.
Segundo dados divulgados pelo Tesouro esta semana, R$ 907,3 bilhões dos recursos líquidos depositados no caixa são vinculados. Deste total, R$ 604,9 bilhões fazem parte do chamado colchão de liquidez — uma reserva feita pelo governo para pagar detentores de títulos da dívida pública por um prazo de três a seis meses. O restante precisa ser destinado a áreas específicas, como educação, programas do governo e fundos setoriais, além de ser usado para transferências constitucionais para estados e municípios.
— Essa rigidez na alocação de recursos dificulta a execução da política fiscal. O governo fica com dinheiro no caixa que simplesmente não pode usar a não ser que mande um projeto de lei para o Congresso — disse um técnico da área econômica.
Ele alertou para o fato de que essa rigidez prejudica não apenas a gestão orçamentária, mas o cumprimento da regra de ouro — pela qual o governo não pode se endividar para pagar despesas correntes. Prevista na Constituição, essa norma estabelece que as operações de crédito do governo não podem ficar acima dos gastos com investimentos. Essa é uma forma de impedir que sejam feitas emissões de dívida para honrar gastos com folha ou com custeio, por exemplo. Seu descumprimento pode ser considerado crime de responsabilidade.
Desequilíbrio de R$ 208,6 bi
O problema é que, devido ao desequilíbrio das contas do governo nos últimos anos, a equipe econômica foi obrigada a cortar despesas com investimentos ao mesmo tempo em que a dívida pública subiu muito. Assim, para 2018, os técnicos estimam que o desequilíbrio entre as operações de crédito e os investimentos está em R$ 208,6 bilhões.
Para cobrir essa diferença, no entanto, a equipe econômica não pode lançar mão do caixa do Tesouro. Por isso, está em estudo uma série de medidas. A principal delas é a devolução de R$ 130 bilhões do BNDES ao Tesouro, que será usada para abatimento da dívida pública. Mas também será preciso fazer outros ajustes que contornem a rigidez orçamentária.
Uma delas é uma revisão nos restos a pagar (despesas de anos anteriores). Neste caso, a ideia é editar um decreto permitindo que o governo cancele restos a pagar não processados (despesas antigas que foram contratadas, mas não liquidadas) e, com isso, tenha um espaço adicional no caixa no valor de R$ 48,3 bilhões.
Extinção de fundos
Outra ação em estudo é a extinção de fundos, inclusive o Fundo Soberano, para receber o que está depositado neles. Isso vai dar uma folga extra de R$ 26 bilhões. Além disso, a equipe econômica vai consultar o Tribunal de Contas da União (TCU) sobre a possibilidade de usar superávits de anos anteriores como fontes de receita para pagamento de despesas do Orçamento, o que também ajuda no cumprimento da regra.
Os técnicos do governo alertam para o fato de que o engessamento do Orçamento no Brasil é o maior da América Latina e, talvez, o maior do mundo. Um levantamento feito pela agência Moody’s aponta que o total de gastos obrigatórios no Orçamento no Brasil chega a 93%. O segundo lugar no ranking é da Costa Rica, onde o percentual chega a 88%.
Fonte: “O Globo”