O setor público consolidado, que reúne os três entes de governo, registrou em 2017 um déficit primário de R$ 110,6 bilhões. Significa dizer que mesmo arrecadando algo como 32,3% do PIB em impostos, a maior carga tributária entre os países emergentes, o estado brasileiro não é capaz de dar conta das suas despesas. Esse resultado negativo, a propósito, é o quarto consecutivo. Dado que essa trajetória é insustentável, até quando conseguiremos adiar o ajuste nas contas públicas?
A face mais visível do déficit primário é o aumento do endividamento do setor público. A dívida bruta passou de 51,54% em 2013 para 74,04% em 2017, um aumento de 22,5 pontos percentuais. Essa trajetória explosiva da dívida tem sérias consequências sobre a macroeconomia do país, brevemente adiadas pela aprovação do teto de gastos em 2016. Não fosse essa medida, estaríamos vendo hoje um aumento dos prêmios de risco, expresso em maiores taxas de juros, maiores expectativas de inflação e menores perspectivas de crescimento econômico.
O teto de gastos limitou por enquanto um cenário de default da dívida brasileira, mas não o eliminou por completo graças ao problema previdenciário. Afinal, de tudo o que o estado brasileiro gasta, 57% é previdência. E esse gasto aumenta mais de 6% ao ano acima da inflação, com tendência crescente, dado o envelhecimento da população. Em outras palavras, se nada for feito no campo previdenciário, daqui a 10 anos, o gasto com previdência se expande para 80%, comprometendo a saúde, educação e a segurança pública. Como as demandas da sociedade não irão ceder nessas e em outras rubricas, o déficit primário continuará existindo, pressionando o teto de gastos e, por consequência, a paz momentânea que hora vivemos.
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Não por outro motivo, a reforma da previdência é hoje uma necessidade mais do que urgente para equacionar as finanças públicas. Sem ela, o estado quebra, levando junto todo o país. Além de ser imperiosa do ponto de vista fiscal, é também uma reforma justa porque visa acabar com um dos maiores programas de transferência de renda dos pobres para os ricos que se tem notícia no mundo civilizado (ver http://bit.ly/2G3CqvE e http://bit.ly/2hRpnHj).
Desde a implementação do Plano Real, a propósito, o país conseguiu remediar o problema fiscal fazendo crescer a carga tributária. Ela era algo como 26% do PIB em meados da década de 90, passando para os 32,3% atuais, um aumento de mais de seis pontos-percentuais. Em termos de PIB, isso representa algo próximo a R$ 400 bilhões. Para onde foi esse dinheiro?
Certamente não foi para a melhoria dos serviços públicos. Pesquisa do Instituto Brasileiro de Planejamento e Tributação (IBPT), que compara os 30 países com maiores cargas tributárias do mundo, coloca o Brasil como o pior em termos de retorno para a sociedade em serviços públicos (ver http://bit.ly/2CcmGEf).
Essa triste realidade é explicada pela captura do estado por grupos de interesse. De funcionários públicos que ganham mais de 70% do que trabalhadores da iniciativa privada a grandes empresários que recebem subsídios de bancos públicos. Mas dado que a sociedade não parece mais aceitar aumentos de carga tributária que mantêm esse equilíbrio ruim, esse quadro está próximo de se encerrar. Afinal, todo carnaval tem seu fim…