A indústria de transformação voltou a crescer em 2017 — 2,2% —, mas continuou a perder espaço na economia. Segundo dados divulgados na quinta-feira pelo IBGE, a participação do segmento no Produto Interno Bruto (PIB) caiu para 11,8%, a menor desde os anos 1950. No início da década, esse percentual era de 15% e, nos anos 1980, chegou a superar a casa dos 20%. Mais do que efeito da recessão que abalou o país por mais de dois anos, o fenômeno é estrutural. As consequências, no entanto, dividem especialistas. Parte dos economistas que acompanham o tema afirma que o Brasil passa por um processo de desindustrialização precoce, com consequências nocivas à inovação e à produtividade. Para outros analistas, a perda de espaço das fábricas é um processo natural de mudança do perfil, em que o setor de serviços tende a ganhar cada vez mais protagonismo.
Historicamente, os países que se desenvolvem passam por processos de industrialização, enriquecem e, aos poucos, reduzem a participação do setor na economia. O ponto dos críticos é que o Brasil teria passado por esse processo cedo demais. Segundo dados do Banco Mundial de 2015, os últimos disponíveis para todos os países, o peso da indústria brasileira no PIB, estimado em 11,8% naquele ano, estava abaixo da média mundial, de 16,5%. Por diferenças metodológicas, os números diferem um pouco dos dados do IBGE, que, naquele ano, registrou 12,2%. O indicador brasileiro, no entanto, também estava abaixo do estimado em países vizinhos, como México, Peru e Argentina.
A Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp) é uma das principais críticas à perda de espaço do setor. Segundo dados compilados pela entidade, a queda estrutural da participação da indústria na economia ocorreu mais rapidamente no país do que no resto do mundo. Estudo da instituição observa que, entre 1975 e 1992, o peso do setor no PIB mundial diminuiu 25%, enquanto, no Brasil, recuou 38%. A entidade também observa que o início do processo ocorreu quando o país tinha PIB per capita de US$ 11 mil, menos que o patamar de US$ 20 mil observado em países desenvolvidos quando fizeram transição semelhante.
O protagonismo dos serviços
Rafael Cagnin, economista do Instituto de Estudos para o Desenvolvimento Industrial (Iedi), acrescenta que o país não tem características que justifiquem essa queda.
– Nossa renda per capita não é de país desenvolvido. O Brasil está para trás na robotização, não tem um grande fenômeno de outsourcing (terceirização de processos da indústria para o exterior). Foram as condições macroeconômicas e sistêmicas que fizeram com que a indústria perdesse espaço, como câmbio desfavorável e custo de capital elevado.
Outra corrente de pesquisadores lembra que o perfil da economia mudou, os serviços ganharam protagonismo, e a ideia de que o país deve ter um parque industrial capaz de suprir todas as cadeias internamente está ultrapassada. O próprio conceito do que conta como valor adicionado no setor mudou ao longo dos anos.
Entre as duas correntes, é comum a crítica às formas de incentivo à indústria nos últimos anos, baseadas principalmente em incentivos fiscais e crédito subsidiado. A queda de participação da indústria na economia brasileira ocorreu mesmo durante os dez anos em que o país teve três versões de programas específicos do governo para estimular o setor. Em 2004, quando o governo Lula lançou a Política Industrial, Tecnológica e de Comércio Exterior (PITCE), a indústria representava 17,8% do PIB. Em 2015, já no governo Dilma, quando foi apresentado o Plano Brasil Maior (PBM), o indicador havia recuado para 12%.
O atual governo, de Michel Temer, diz que também planeja estratégias. Para o presidente da Agência Brasileira de Desenvolvimento Industrial (ABDI), Luiz Augusto Ferreira, não há desindustrialização no país. A instituição, ligada ao governo federal e responsável por gerir políticas industriais, tem como meta elevar a participação do setor no PIB para até 15% nos próximos cinco anos. As ações serão voltadas ao desenvolvimento da indústria 4.0, que incorpora novas tecnologias, como a internet das coisas.
– A ABDI está preparando para o próximo governo duas ou três novas políticas industriais. Não há desindustrialização. O que tem de haver agora é um reacerto do espaço da indústria nacional – afirma Ferreira.
Fonte: “O Globo”