A tensão comercial entre Estados Unidos e China pode ser uma oportunidade — mas, ao mesmo tempo, um risco — para que o Brasil retome um processo no qual ficou atrasado em relação a outras economias: a abertura comercial. Um estudo do economista Carlos Langoni, ex-presidente do Banco Central e diretor o Centro de Economia Mundial da FGV, com base em dados do Banco Mundial, mostra que, se o Brasil abrisse mais o seu mercado para aumentar a soma de suas importações e exportações dos atuais 27% do Produto Interno Bruto (PIB) para o equivalente a 40%, patamar similar ao da China, poderia elevar o potencial de crescimento da economia sem gerar pressões inflacionárias de 2,5% para até 4,5% ao ano.
O trabalho mostra oportunidades de acelerar a retomada da economia com abertura comercial. Nas últimas duas décadas, apesar da forte expansão do comércio internacional em meio à globalização, o Brasil manteve o perfil fechado. O país ocupa a 212ª posição em um ranking com 246 economias, incluindo países e blocos como a União Europeia. O comércio exterior brasileiro de 27% do PIB hoje é pouco maior que o tamanho que tinha em 2000: 22%. No mesmo período, a média da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE), que reúne economias desenvolvidas, saltou de 47,45% para 56,67%.
No Brasil, o chamado PIB potencial é baixo, um dos fatores que impedem um ciclo sustentável de crescimento da economia de engrenar. Na avaliação de Langoni, a abertura comercial é uma “reforma esquecida” que pode ajudar o país a elevar sua produtividade, apesar dos riscos do cenário internacional atual.
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— Paradoxalmente, o protecionismo americano que gera retaliações de outros países oferece ao Brasil uma oportunidade. Abre espaço para buscarmos acordos comerciais no Pacífico da América Latina, onde temos Chile, Peru, Colômbia. E nos empurra para a Ásia — diz Langoni, para quem o tema precisará ser abordado pelos candidatos na eleição presidencial. — O que está na mesa é um novo modelo de desenvolvimento.
Dificuldades para abrir
Existe, no entanto, o risco de que, diante da turbulência, o país se feche, destaca Otaviano Canuto, diretor executivo do Banco Mundial para o Brasil e outros oito países. Isso porque o país deixou passar oportunidades no passado recente para fazer esse movimento. Canuto aponta a complexidade de tarifas e acordos comerciais superficiais entre os principais obstáculos. Para o economista, há potencial para uma taxa de abertura de 85% do PIB. Para ele, há instrumentos para proteger as empresas nacionais de práticas abusivas de outros países, como o dumping (subsídio para a venda de produtos abaixo do custo de produção):
— O kit para lidar com situações claras de dumping é reconhecido na OMC (Organização Mundial do Comércio), faz parte do painel de instrumentos. Mas não pode ser utilizado com leviandade.
Na avaliação do presidente da Associação do Comércio Exterior do Brasil (AEB), José Augusto de Castro, o Brasil não está integrado às cadeias de valor justamente porque tem empresas pouco produtivas. Por isso, a abertura é arriscada.
— Nós somos um país fechado porque somos incompetentes. Não temos preços competitivos para exportar produtos manufaturados. O valor das commodities varia de acordo com as cotações internacionais. O Brasil não tem influência nem sobre preço, nem sobre demanda — critica Castro.
Em nota, o Ministério da Indústria, Comércio Exterior e Serviços (Mdic) informou que a participação do comércio exterior no PIB deve aumentar, mas não citou uma meta específica. Entre as medidas para promover a abertura, citou o foco em acordos comerciais, como com a União Europeia. Já o presidente da Apex, Roberto Jaguaribe, destacou o programa de qualificação da agência que atendeu a 4.734 empresas no ano passado.
Fonte: “O Globo”