Apesar de vivermos um período de guinada conservadora na sociedade brasileira, especialmente pós-impeachment, com enorme desgaste do petismo, que ainda enfrenta os desdobramentos da corrupção que se alastrou por seus governos, venho lembrar que ainda reside sobre os ombros do partido um considerável potencial eleitoral que merece ser analisado.
Com as cartas na mesa, vemos aquilo que mostram as pesquisas. O petismo possui a simpatia de 20% do eleitorado brasileiro. Destes, 80% estão dispostos a votar no candidato indicado pelo partido, ou seja, aquele que será ungido por Lula como seu escolhido. Isso joga o nome indicado para um patamar ao redor dos 15% de intenções de voto, com força para chegar ao segundo turno.
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Já analisei aqui o potencial de Marina. Ela também segue pontuando nos 15%. Na ciência política precisamos avaliar todas as variáveis. O Brasil possui tradicionalmente uma camada de eleitores acostumados a votar com a esquerda. Esta parcela, sedimentada de forma mais consistente no período getulista, acostumou-se a votar no antigo trabalhismo e transferiu-se ao longo dos anos para o petismo, uma forma de esquerda de corte sindical, mas que também fincou suas bandeiras na intelectualidade acadêmica e no funcionalismo público.
Assim, explica-se o percentual daqueles que declaram-se petistas e em um cenário sem a presença de Lula, a tendência é que mesmo com os desgastes sofridos o partido deve conseguir lutar de forma competitiva por uma vaga no segundo turno, por mais curioso que isso possa soar. Resta ao grupo decidir quem será o herdeiro político que carregará o partido em outubro.
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A inclinação pelo nome de Jaques Wagner tende a não se concretizar, uma vez que o ex-governador tem uma vaga garantida no Senado pela Bahia. Dentro desse contexto, a candidatura deve recair sobre o ex-prefeito Fernando Haddad, o que deve posicionar o partido mais ao centro. Professor da USP e ex-ministro da Educação, consegue penetrar na classe média, aumentando as chances de passar ao segundo turno. A candidatura própria é o caminho natural do PT, que por suas características jamais aceitaria uma posição secundária em uma chapa presidencial.
Se Haddad passar para o embate final com Bolsonaro, sabemos que a classe política fará uma opção clara pelo petismo, afinal, já conhecem as regras do mecanismo, divisão de tarefas e poder. Para a política tradicional, apoiar Bolsonaro no segundo turno é dar um salto no escuro – o que vale lembrar, também fortalece a posição de outsider do deputado e que pode ajudar a catapultar seu nome para a vitória.
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Mesmo que a tendência não seja de vitória, enganam-se aqueles que desprezam o potencial eleitoral, mesmo ferido, do partido de Lula. Repito: existe força para chegar ao segundo turno e eventualmente até vencer a eleição. Nada mais curioso para um país como o Brasil, que depois de um impeachment, poderia novamente iniciar o ano sob os auspícios de um governo petista. A impopularidade e as trapalhadas do governo Temer somente ajudam nesta equação. Aguardemos.
Fonte: “O Tempo”, 11/06/2018