Pode não entrar na campanha, mas a questão federativa entrará de forma inevitável na pauta do próximo governo. Isso vai da questão mais pedestre da arrecadação e distribuição do bolo fiscal às questões de distribuição de responsabilidades e da representatividade política dos entes federados.
A educação é tratada de maneira muito específica na Constituição. Algumas tarefas são claramente divididas, enquanto outras são definidas pelo melífluo conceito de “regime de colaboração”. A rigor, um mesmo município pode ter escolas privadas, municipais, estaduais e federais. Pode existir um Conselho Municipal de Educação que regula apenas as escolas da própria rede! Só são claras (1) a responsabilidade exclusiva dos municípios pela educação infantil — a mais desprotegida de todas —, (2) a responsabilidade primária do governo federal pelo ensino superior público, e, (3) a dos estados, pelo ensino médio. Mas isso não resolve vários problemas de responsabilidade e responsabilização, e, muito menos, estimula a eficiência.
Confira os artigos da série “Os presidenciáveis e a educação”
Educação, capital humano e terceira idade
Que política para a juventude terá o próximo presidente?
Educação, capital humano e produtividade
Recursos para educação
Capital humano, primeira infância e educação infantil
A melhor política educacional é uma politica econômica vigorosa
O governo federal gastou cerca de 117 bilhões de reais em educação em 2017, o que representa 8,5% da sua receita corrente e 1,8% do PIB. Desse total, 75,4 bilhões de reais, ou seja, 65% foram gastos com ensino superior. Para a educação básica foram destinados 34,6 bilhões de reais, cerca de 30%. Os estados e municípios, por sua vez, vêm gastando pouco mais de 200 bilhões de reais por ano (a preços de 2016), com viés de crescimento devido à pressão dos gastos com pessoal. Parte dessa tendência decorre de pressões criadas pelo governo federal, notadamente no caso do Piso Salarial do Magistério.
Os problemas do federalismo na educação podem ser englobados em três grandes conjuntos interligados. O primeiro refere-se às responsabilidades de cada nível federativo e o grau de ineficiência gerado pelas ambiguidades existentes. O segundo refere-se ao financiamento, que deve ser associado às responsabilidades. O terceiro refere-se às relações formais e informais entre os níveis federados, e, de modo particular, o sistema regulatório e o papel e a forma de atuação do MEC.
Como ocorre em outras áreas, o governo federal tem e exerce um poder desproporcional sobre estados e municípios, sem a equivalente corresponsabilidade financeira. Estados e municípios, por sua vez, deixam-se pressionar com a esperança de que de alguma forma o governo federal virá com algum tipo de “Refis” para socorrê-los — o que frequentemente se torna uma profecia que se cumpre. Recursos e responsabilidades não deveriam ser discutidos de forma separada um do outro.
Apesar do elevado grau de descentralização da educação, é muito forte o papel do governo federal e do MEC. E, infelizmente — e independente dos seus titulares —, essa pasta parece ter mais condição de fazer o mal do que o bem. Nos últimos anos, essa condição tornou-se mais evidente: os recursos dobraram, em grande parte devido a esforços e iniciativas do governo federal. Os programas federais — mais de 40 no Ministério da Educação — são monumentos ao fracasso de políticas centralizadas e uniformes. A regulamentação aumenta a cada dia, em grande parte decorrente do peso das corporações e pressões organizadas. Mas a ineficiência também aumenta — e a qualidade não melhora.
Resta, portanto, a pergunta aos candidatos: que saídas o futuro presidente vê para as relações entre os entes federados na área da educação? Novas formas de atuação para estimular soluções diferenciadas, em vez de impor “planos infalíveis” que não levam a nada? O futuro presidente contempla políticas e tratamento diferenciado em função da região? Do tamanho dos municípios? Do nível de desenvolvimento econômico ou educacional? Mudanças na composição dos conselhos que formulam decisões para a área? Novas ideias e formas de incentivar ideias que funcionam?
Fonte: “Veja”, 26/07/2018