Para o cientista político Fernando Schüler, professor da escola de negócios Insper, o resultado do primeiro turno das eleições representa um tsunami na política tradicional brasileira. O motivo: a emergência de um conservadorismo calcado em valores arraigados no homem comum brasileiro, como o valor da meritocracia e a rejeição de ações afirmativas. Confira a entrevista de Schüler a EXAME:
Exame – Que país surge das urnas?
Schüler – Houve um tsunami na política tradicional brasileira. O homem comum varreu o sistema político tradicional. Os outsiders da política vieram de lugares inesperados. A população claramente rejeitou o financiamento de campanha, base de apoio dos políticos tradicionais. As redes sociais fizeram a grande estreia nas eleições brasileiras, superando o alcance de rádio e televisão neste homem comum. Foi uma eleição disruptiva, derrubando boa parte da elite política. O país sai mais dividido também do ponto de vista territorial, entre um Nordeste claramente de esquerda contra o resto do país mais conservador.
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O Brasil não deveria ser tratado como uma república de bananas
Você sabe o que é vetocracia?
O governo entregou tudo, com o apoio de todos
Em Minas Gerais, a ida de Romeu Zema ao segundo turno, com grande expressão liberal, é uma expressão enorme dessa disrupção. A de Wilson Witzel, no Rio de Janeiro, também, pelo apoio ao conservadorismo em costumes. Temos uma nova geração de líderes, como Oriovisto Guimarães, eleito senador pelo Paraná. Será um congresso mais conservador e mais pró-mercado. É um Congresso com mais cara do Bolsonaro que do Haddad.
Exame – Quem sai vencedor dessa rodada?
Schüler – Certamente o conservadorismo brasileiro vai ficar muito mais estruturado depois dessa eleição. Diria que teremos em breve um grupo político bem semelhante ao que hoje representa o Partido Republicano nos Estados Unidos. Aconteceu aqui um movimento semelhante ao do Tea Party americano.
Exame – O que pensa esse conservadorismo?
Schüler – Expressão do pensamento do homem comum. É totalmente falsa essa retórica de que estamos à beira do fascismo ou de que há riscos à democracia. Trata-se de uma clássica incapacidade dos intelectuais de entender o homem comum. O pensamento médio da classe trabalhadora brasileira é de crença no mérito individual. Ele não gosta do politicamente correto, não gosta das ações afirmativas. Esses elementos culturais foram mais importantes que a visão pró-mercado para a vitória do conservadorismo na eleição de hoje.
Fonte: “Exame”