A equipe econômica do presidente eleito Jair Bolsonaro quer antecipar a votação de uma das medidas mais importantes para a economia no longo prazo: a autonomia do Banco Central. De acordo com fontes ouvidas pelo “Globo”, os técnicos do presidente eleito já articulam com o Congresso a aprovação da proposta ainda este ano. A ideia é convencer o atual presidente do BC, Ilan Goldfajn, a ficar no cargo.
A turma de Bolsonaro também quer dar continuidade às propostas batizadas de BC+ (para modernizar o setor financeiro e reduzir os juros para os brasileiros) e às medidas desenhadas pelo Ministério da Fazenda para incentivar a produtividade. A avaliação é que são duas iniciativas corretas tomadas, que terão impacto na economia e, consequentemente, na geração de empregos no país.
No entanto, o que poderia ter um efeito mais rápido no humor dos agentes econômicos é garantir a autonomia do BC. A avaliação é que o projeto, que já está na Câmara dos Deputados, pode ser votado ainda em 2018. Ele teria uma chance muito maior de ser aprovado do que a reforma da Previdência.
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O texto prevê uma transição para os mandatos no Banco Central. Com isso, abriria espaço para Ilan Goldfajn ficar mais dois anos à frente da autarquia. De acordo com fontes da equipe do novo governo, Ilan só não fica no cargo se não quiser. Seu trabalho é bastante elogiado pelos economistas que estão com Bolsonaro. Durante entrevista nesta terça-feira, o presidente eleito foi questionado sobre a permanência do economista à frente da autoridade monetária:
– O Paulo Guedes gosta dele – disse Bolsonaro.
Mas discrição sobre o assunto tem sido a marca do presidente do BC em relação ao assunto. Ele chegou a fazer um pacto com seus diretores de não discutir o assunto antes da definição das eleições. Tinha medo de que isso contaminasse a reunião do Comitê de Política Monetária (Copom), realizada na semana passada. Ilan até chegou a ser questionado por pessoas próximas, mas deu a velha resposta protocolar de que não queria falar de política. Agora, chegou a hora de avaliar a ideia.
Ilan Goldfajn conseguiu que o BC voltasse a ser visto como um órgão técnico depois do desgaste de uso político no fim do governo Dilma. Há quatro anos, o BC foi acusado de esperar a reeleição da presidente para voltar a apertar os juros. Na época, o debate sobre autonomia do Banco Central virou um dos pontos altos da campanha da presidente, com uma propaganda que dizia que isso poderia tirar comida do prato do trabalhador. Na campanha recente, o tom mudou e até mesmo o candidato do PT Fernando Haddad falou em apoiar a autonomia da autoridade monetária, que é visto pelos especialistas como a garantia de que a autarquia continuará o trabalho da equipe de Ilan, que foi eleito o melhor banqueiro central do mundo.
A avaliação de vários economistas é que o simples anúncio de que o executivo permanecesse à frente do BC poderia manter ancorada a inflação para os próximos três anos e evitar, assim, que os juros no mercado subissem previamente.
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– Time que está ganhando não se mexe. O BC não é uma autarquia política, quando foi não deu certo – disse o economista-chefe da Austin Rating, Alex Agostini.
Para ele, uma mudança imediata não faz o menor sentido porque gera instabilidade. Ele faz a ressalva de que Ilan pode estar cansado para permanecer no cargo. Nesse caso, diz que a melhor saída seria fazer uma transição. Ressalta, entretanto, que ela não poderia começar logo. Teria de ser feita no ano que vem para que a diretoria atual iniciasse o processo de alta dos juros que deve ocorrer por causa da recuperação da economia.
Para Flávio Serrano, economista do Banco Haitong, Ilan é garantia de que as previsões para a inflação ficarão ancoradas nos próximos anos. No entanto, um outro economista de peso, que viesse do mercado financeiro e tivesse uma credibilidade parecida, poderia funcionar no cargo e manter as projeções nas metas estabelecidas pelo governo. O analista lembra que o Brasil precisa da independência do Banco Central para que ruídos como o atual não se repitam em transições democráticas.
– É importante reforçar as instituições – argumenta o especialista. – Apenas assim vamos ter certeza de que o trabalho vai continuar a ser feito.
Fonte: “O Globo”