Já parece haver maior clareza sobre a formação do governo Bolsonaro. Serão 22 ministérios, com destaque para a fusão de vários anteriores, como na Economia, com Paulo Guedes como super ministro, Sergio Moro na Justiça, alguns (ex) militares na Infraestrutura e na Segurança, o Ministério da Educação se fundindo com Cultura e Esporte e por aí vai.
A escolha mais recente vem de uma pastora evangélica, ex-assessora de Magno Malta, Damares Alves, para o Ministério da Mulher, Família e Direitos Humanos.
Na composição dos ministérios, alguns nomes, em especial na área econômica, se encaixam ao que pretende o governo Bolsonaro. É preciso um redimensionamento do Estado, que deve atuar com mais foco nas áreas de Saúde, Educação e Segurança, além de pensar na devida autonomia das agências de regulação, importantes para a “monitoria” de setores da economia e possíveis “falhas de mercado”.
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Uma agenda pragmática
Na agenda em curso, o ajuste fiscal se torna urgente, tendo como prioridade a reforma da Previdência. A trajetória das despesas com benefícios previdenciários é incontrolável. Há oito anos representava 37% das despesas totais, agora já passa dos 50%. Numa “readequação” de despesas, os investimentos públicos em infraestrutura vão sendo enfraquecidos. Atualmente não passam de 0,5% do PIB.
No regime da Previdência são diversas as distorções. O universo de servidores do setor público não passa de um milhão e responde por R$ 88 bilhões do déficit previsto para o ano que vem. Já no setor privado, no INSS, são quase 33 milhões de trabalhadores, respondendo por um déficit próximo a R$ 220 bilhões. Sendo assim, parece-nos inevitável uma reforma mais ampla do que a que anda apregoando Bolsonaro, segundo ele, defendendo uma mais branda ou gradual, para durar os quatro anos do mandato. Esta pregação nos parece ser a de quem não quer carregar o ônus desta reforma. Ela é dura, impopular e terá que ser enfrentada em algum momento. Quanto mais se atrasa no seu equacionamento, pior vai ficando a situação das contas públicas.
Diante disso, será essencial a este governo ter boa composição política para enfrentar a pesada agenda de reformas e ajustes que se aproxima. Não só da Previdência, mas várias outras e ajustes necessários, que muito se acumularam em distorções nestes últimos anos. Para isso, uma boa articulação no Congresso será um passo importante. Três nomes surgem como “articuladores”, Onyx Lorenzoni, chefe da Casa Civil, já meio desgastado, e os generais do Exército, o vice Mourão, deixado de lado pelas suas declarações, e Santos Cruz, assumindo a Secretaria de Governo.
Interessante observar que o presidente eleito tem evitado transitar pelos nebulosos caminhos do “toma lá, dá cá”, do velho “presidencialismo de coalizão”, mas sim diretamente com as chamadas “bancadas temáticas” (Agricultura, Evangélica e Segurança Pública). Isso tem gerado algum stress com partidos menores, se sentindo preteridos nas indicações e no loteamento do poder. Uma frente destes, inclusive, já se reúne para formar um “blocão” de aproximados 300 deputados “independentes”. Ainda acreditamos que Jair Bolsonaro tem um bom capital político para aprovar as reformas, dada sua popularidade e interlocução direta com a opinião pública.
Nas movimentações da área econômica não dá para ficar alheio à formação da equipe. Paulo Guedes chamou seus velhos amigos de Universidade de Chicago, os “Chicago’s oldies”, e vai se cercando de profissionais de mercado. Um deles é Roberto Campos Neto, diretor do Santander, assumindo o BACEN. Acreditamos que ele deve manter a mesma linha de atuação de Ilan Goldfajn, tendo declinado de continuar por “motivos pessoais”.
Na agenda econômica, vamos observando um forte viés nas privatizações, na reforma do Estado, com várias características liberais e afeitas a “menos Estado, mais mercado”. Por outro lado, cabe observar que o “núcleo duro” do governo Bolsonaro, na sua maioria, formado por militares da reserva, possui um viés nacionalista e, numa visão do Estado Maior, mais protecionista na manutenção do que Roberto Campos chamava de “petrossauros” ou “vacas sagradas do estatismo”.
Guedes reage a isso, mas vai aos poucos sendo enquadrado por este discurso “anos 70”, em nossa opinião, totalmente ultrapassado. Já nos parece claro que o “miolo” das principais estatais do País, como Petrobras, Eletrobras, bancos públicos, Banco do Brasil e CAIXA, não será mexido.
Em síntese. É entre avanços e “recuos estratégicos” que este governo vai se movimentando. Isso se reflete no estado de ânimo dos investidores. Não existe euforia, mas um comedido otimismo, o que vem mantendo os investidores estrangeiros de fora, no resguardo, na expectativa de se ter uma ideia melhor da agenda econômica. Isso também acontece com as agências de rating, na espera de novidades.
Por outro lado, uma melhora dos índices de confiança nos diversos setores (comércio, consumidor, serviços, construção e indústria) já parece perceptível. Isso vem se dando em função da esperança trazida pelas sinalizações da agenda e das prioridades do governo eleito. O discurso de ajuste fiscal, privatizações e concessões deve melhorar o ambiente de negócios. Isso nos parece bastante animador, mas será suficiente? Vamos observando.