Tem sido bastante frequente a avaliação de que a reforma da Previdência trará um ganho de confiança que irá se traduzir em maior interesse por investimentos no País. Há exageros nesta análise.
Não há dúvidas sobre a melhora da confiança diante de uma reforma que traga uma perspectiva de eliminação do rombo das contas públicas e estabilização do regime fiscal. Este é o passaporte para o Brasil ingressar na fase adulta, superando sua prolongada adolescência. Daí a rapidamente colhermos os frutos em termos de investimento e crescimento são outros quinhentos.
Começando pelos investidores estrangeiros, os dados sugerem que não serão eles os líderes da retomada do investimento. Pelo contrário. Eles geralmente aguardam a economia ganhar tração para aumentar a presença no País. A perda do grau de investimento atrapalha.
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Além disso, é pequena a participação do investimento direto estrangeiro no investimento total, possivelmente menos de 10%, quando se leva em conta que os investimentos em planta nova (greenfields) representam em torno de 25% do total (média mundial).
A ideia de que o fim das incertezas eleitorais será impulso para o investimento dos estrangeiros não é respaldada pelos fatos. Este não parece ser muito afetado pelo ciclo político. Há um interesse crescente dos estrangeiros, mas ainda em estágio inicial, na busca de maior compreensão da agenda econômica do novo governo.
Importante mencionar que o ambiente internacional não é dos melhores. A desaceleração econômica e do comércio mundial e as expectativas mornas para os preços de commodities vêm reduzindo o fluxo de investimento direto no mundo. Segundo a Conferência das Nações Unidas sobre Comércio e Desenvolvimento (Unctad), houve queda de 19% em 2018. O recuo de 40% do investimento direto da China foi destaque. Aquele país passa por um ciclo de desaceleração, reduzindo o apetite por investimento no exterior.
O movimento acabou prejudicando o Brasil. Segundo reportagem do Valor Econômico, com base em dados do Ministério da Economia, o investimento direto chinês caiu 75% em 2018.
Improvável haver uma reversão do quadro internacional rapidamente.
E o investimento dos empreendedores locais? Haverá tração suficiente para puxar o PIB? Há forças nos dois sentidos, e o efeito líquido será possivelmente tímido por um tempo.
Do lado positivo, há os planos de concessões de infraestrutura e o leilão de cessão onerosa do pré-sal. O alerta é que a tradução desses programas em investimento físico leva tempo. Não é para 2019.
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As perspectivas para a construção civil são (moderadamente) positivas, por razões cíclicas – menor vacância em alguns segmentos, redução da inadimplência e os juros em queda – e estruturais – aprovação da lei do distrato em 2018 visando a reduzir a insegurança jurídica quando o comprador desiste da aquisição do imóvel já em construção, e as medidas do Banco Central para ampliar o crédito imobiliário.
Jogam contra a elevada ociosidade na economia e a frágil situação financeira de muitas empresas.
O principal entrave é o difícil ambiente de negócios, incluindo a elevada insegurança jurídica, tema pouco discutido no governo. Tem havido equivocada ênfase na defesa de grandes obras públicas, como o investimento em Angra 3 e na Amazônia. O sinal não é bom.
O que é necessário mesmo é destravar o investimento privado. Para isso será necessário um programa focado na arrumação da confusão regulatória e legal do País, uma agenda já iniciada no governo anterior.
Um exemplo dramático é o saneamento. Há 49 agências, nas 3 esferas de governo, que definem as regras do setor, sendo que não há definição clara de atribuições e uniformidade de processos. O resultado é que quase metade da população não tem acesso a coleta de esgoto.
Ainda não sabemos qual será a agenda econômica após a reforma da Previdência. Ela permitirá saber se poderemos nos tornar nos próximos anos adultos responsáveis ou seremos do tipo que depende de mesada dos pais.
Fonte: “Estadão”, 14/02/2019