O presente artigo, de caráter não científico, tem por finalidade propor uma reflexão sobre quão interligados estão a academia (mestrado e doutorado) e o mercado/negócios (empresas privadas, públicas ou de economia mista) com dados comparativos primários entre instituições de ensino no Brasil e nos Estado Unidos da América. Entendem-se aqui como dados primários missão, visão e políticas apresentadas como chamarizes em páginas oficiais de algumas instituições como PUC-Rio, USP, HARVARD, entre outras. Além disso, algumas observações pessoais baseadas em experiências, conversas, pesquisas e visitações.
De início é importante destacar que há sensíveis diferenças nas apresentações entre as principais instituições dos dois países, seja para programas de mestrado ou doutorado (stricto sensu).
Em primeiro lugar os programas americanos trazem referências explícitas ao mercado, ao “aprender-fazendo” enquanto que os programas brasileiros são tímidos quando o fazem, salvo exceções inseridas nas apresentações textuais como por exemplo a Metrologia da PUC-Rio. Em segundo lugar verifica-se uma clareza no anseio de uma profícua relação entre academia e mercado/negócios no modelo americano, de difícil percepção no modelo brasileiro.
Em virtude desse distanciamento entre academia e mercado/negócios no modelo brasileiro, temos em consequência uma limitação nas relações de troca em diversos grupos de interesse em ambos os lados. Desse modo, a maioria esmagadora das empresas de micro, pequeno, médio e grande porte no Brasil não possui relação direta com a academia ou até mesmo nunca se relacionaram com entidades de fomento, independentemente do setor de atuação. Pode ser inferido do fato acima apresentado que no Brasil há uma ignorância bilateral de grande parte desses grupos de interesse da importância que os dois lados conjuntamente podem catapultar em termos do desenvolvimento econômico-científico-social. Além disso, são significativamente inferiores os estímulos no Brasil para um maior relacionamento entre esses grupos de interesse.
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Aqui no Brasil, se por um lado temos grandes barreiras, por outro temos um enorme espaço para uma grande reviravolta relacionada aos modelos vigentes. Nossos desafios por aqui são bem maiores dos que os existentes em países desenvolvidos como são os Estados Unidos da América. Características desejáveis em soluções de problemas, sejam simples ou complexos, como curiosidade e criatividade são abundantes no Brasil, e podem atingir patamares inéditos se aplicados estímulos e metodologias avançadas.
Nos últimos dois meses atestei em pelo menos uma dezena de conversas particulares com acadêmicos renomados existir uma linha comum a partir de afirmações que o modelo acadêmico é dependente das políticas públicas de avaliação de desempenho. A principal causa apontada para esse estágio travado no modelo brasileiro é justamente o sistema de avaliação das faculdades, centros universitários e universidades pelo Ministério da Educação, que não contemplam significativamente relacionamentos com mercados/negócios. Em período similar conversei também com cerca de dez empresários/empreendedores de diferentes segmentos, onde pude perceber predominante desconhecimento das possibilidades de relacionamentos entre as partes. Por exemplo, desconhece-se entidades de fomento à pesquisa & desenvolvimento e quais são os requisitos/custos para submissão de projetos, a maioria das empresas/empreendedores não tem em seus objetivos a utilização de empresas juniores para atuarem em problemas que enfrentam, muito menos contam em seus planejamentos estratégicos com as universidades para parcerias no desenvolvimento de soluções, sejam através de produtos, serviços ou sistemas.
Cabe enfatizar que os talentos humanos brasileiros tanto na academia quanto nos mercados/negócios são reconhecidamente competentes e realizadores. Destaca-se que o mundo reconhece a academia brasileira, os empresários/empreendedores brasileiros, portanto há fortes indícios que nosso modelo trava desenvolvimentos impactantes e extraordinariamente transformadores em termos globais, tanto quantitativa quanto qualitativamente. O Brasil pode gerar “n” vezes mais dissertações e teses, pode ter um número dezenas de vezes maior de startups e internacionalizações de negócios.
Conclui-se que existe um importante atraso nos modelos brasileiros, tanto acadêmico quanto de mercado/negócios. São amarras como uma inflexível avaliação de desempenho das instituições de ensino superior, e no mercado/negócios um manicômio sistema tributário associado ao absurdo excesso burocrático que desviam empresários/empreendedores do seu foco principal.
Para trabalhos futuros de desdobramento desse artigo, propõem-se a avaliação de um modelo interdisciplinar acadêmico com integração contínua com mercados/negócios e um olhar para a sustentabilidade econômica, social e ambiental baseada nas melhores práticas globais. São duas linhas complementares que combinadas com a inserção da inovação como meio, podem produzir um novo modelo sinérgico entre todos os grupos de interesse envolvidos em aspectos fundamentais para o desenvolvimento sustentável do próprio Brasil.