Definida pelo presidente Jair Bolsonaro como uma ação para “tirar o Estado do cangote” dos empreendedores, a medida provisória (MP) da Liberdade Econômica, assinada na última terça-feira, começará a ter impacto sobre o crescimento e a geração de empregos em dois meses e mostrará resultados significativos em um ano. Essa é a previsão do secretário especial de Desburocratização, Gestão e Governo Digital do Ministério da Economia, Paulo Uebel. Segundo ele, a medida vai facilitar a abertura de negócios de baixo risco e permitir que o poder público possa se concentrar no controle e fiscalização do que realmente pode virar um problema sério, como barragens ou a boate Kiss, onde 242 jovens morreram num incêndio em 2013.
Qual foi o cenário que levou o governo a editar a MP da Liberdade Econômica?
O nosso diagnóstico é que o Brasil vive um cenário de estagnação econômica, recuperação lenta, tem uma das piores cargas tributárias do mundo, uma burocracia altíssima e alta insegurança jurídica. Isso leva a dois resultados bem concretos: altos níveis de corrupção e uma reputação ruim dos governos. O objetivo da MP é estabelecer limites para o governo realmente focar naquilo que é essencial.
Como isso vai ocorrer?
Hoje, muitas áreas do governo não fazem uma análise de matriz de risco para definir o que é baixo, médio ou alto risco. A nossa MP tenta obrigar União, estados e municípios a fazerem essa reflexão e a deixarem aquelas atividades de baixo risco sem ter que passar pelo Estado, sem ter que pedir alvará, licença. O Estado tem que botar seu foco no que tem risco à sociedade.
Quais são os pontos principais da MP?
São 10 pontos básicos. Um deles é a autorização prévia para atividade econômicas de baixo risco. A pessoa continua tendo responsabilidade civil e penal se fizer alguma coisa errada, mas em vez de o governo avaliar previamente, avalia depois. Outro é a possibilidade de trabalhar em qualquer dia da semana ou horário, desde que seja respeitada a legislação trabalhista, a questão do sossego, vizinhança e poluição sonora. A MP permite ainda que os preços flutuem pela lei de oferta e demanda desde que não sejam mercados regulados ou uma situação de emergência ou calamidade pública.
Como é o tratamento dado hoje a negócios de baixo risco?
Hoje, dois cidadãos em situação similar têm duas situações distintas. Mas o Estado não pode tratar uns de um jeito e outro similar de outro jeito. Temos que ter consistência, previsibilidade. Por isso, a MP vincula decisões administrativas. Outro inciso trata da questão da boa fé, da presunção de que as pessoas são honestas até que se prove o contrário. Também estamos criando um sistema para o cidadão provocar o Estado quando houver uma norma atrasada em relação às práticas internacionais.
O que há de novo para quem quer inovar?
A MP cria uma espécie de imunidade burocrática para quem quer inovar desde que isso não gere risco à saúde pública.
Como a medida reduz os riscos jurídicos?
Temos um respeito aos contratos empresariais privados, dando autonomia para as pessoas definirem suas regras. Isso é uma prática internacional. Também estamos obrigando o Estado a fixar prazos para a concessão de um alvará, por exemplo. Se ele não cumprir, haverá uma aprovação tácita. Isso é uma mudança muito significativa.
A MP também reduz custos para as empresas?
Sim, a gente vai definir as condições em que documentos podem ser microfilmados e digitalizados. Depois, o empresário poderá descartar o papel. Hoje se gastam no Brasil milhões de reais com arquivos e documentos. Tem empresas que têm que ter depósitos só para guardar papel.
União, estados e municípios estão preparados para lidar com as mudanças previstas na MP?
Ela entra em vigor na publicação, mas tem vários dispositivos que dependem de regulamentação, que será feita nos próximos 60 dias. Todos precisarão se adaptar. A União vai fixar uma regra geral e os municípios regras específicas. Se eles não tiverem uma regra específica, terão que seguir a da União.
O que define um negócio de baixo risco?
Existem dois critérios principais para se definir uma atividade. O primeiro é o da probabilidade de que vai acontecer um acidente. O segundo é o tamanho do impacto de um eventual acidente. Com esses critérios, é definido o que é uma atividade de baixo risco. É aquela que não tem probabilidade de acontecer um acidente e, se acontecer, o dano é baixo. Por exemplo, uma loja de corte e costura, sapateiro, uma pequena loja de roupas.
E o que pode ser médio ou alto risco?
Se forem 100 costureiras num ambiente fabril, por exemplo, pode ter um risco maior, com probabilidade de acidente maior. Pode classificar isso como médio risco. O importante é o Estado fazer previamente essa classificação e saber com o que gastar energia. Se for ver, no Brasil, a maioria das atividades são de baixo risco. Temos que focar em atividades que podem gerar problemas sérios, como a boate Kiss, com alto fluxo de jovens e bebida alcoólica, ou barragens. No momento em que o Estado não diferencia as atividades, ele não consegue alocar energia no que é relevante.
Que países serviram de modelo para a MP?
Buscamos as melhores práticas internacionais, como Estados Unidos, Canadá, Austrália e Inglaterra.
Quando será possível ver os impactos da medida na economia?
Nós acreditamos que dentro de 12 meses já é possível perceber as diferenças. A regulamentação vai ser feita em dois meses e depois já vai começar a gerar efeitos. E em um ano vai gerar mudança significativa.
Fonte: Revista “Época”