Não há surpresa na queda do Produto Interno Bruto (PIB) no primeiro trimestre deste ano, anunciada ontem pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Nem na perspectiva sombria que se desenha para o crescimento econômico deste ano.
A atividade econômica brasileira está 5,3% abaixo do pico, atingido antes da recessão de 2014. Mais grave: a taxa de investimento, essencial ao crescimento, está 27% abaixo do patamar daquela época. O investimento brasileiro está em torno de 15,5% do PIB. Em 2012, era de 20,7%.
O investimento brasileiro é um dos mais baixos do mundo. De acordo com os dados mais recentes compilados na base de dados do Fundo Monetário Internacional (FMI), para o ano de 2017, apenas 17 entre 172 países registram um nível inferior de investimento em relação ao PIB, entre eles Venezuela, Iêmen, Burundi, Sudão do Sul, Zimbábue, Congo, Guiné, Guatemala ou Grécia.
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O efeito indesejado dos protestos
O Brasil investe tanto quanto Egito (15,3%), Nigéria (15,5%) ou Uruguai (15,7%). Menos que Paquistão (16,1%), Quênia (16,2%) e El Salvador (16,3%), ou mesmo que economias maduras como Portugal (16,9%), Reino Unido (17,2%) ou Itália (17,7%). A média global está em 26%. Há países de problemas e dimensões comparáveis aos nossos com taxas bem maiores, como Turquia (30,1%), China (44,6%), México (23%), Colômbia (22,3%) ou Argentina (18,6%).
A relação entre investimento e crescimento duradouro é um dos resultados mais conhecidos da ciência econômica. Cada vez que o Brasil para de crescer, porém, as soluções adotadas costumam ser paliativas, incapazes de resgatar nossa capacidade de investir.
Desta vez, o ministro Paulo Guedes falou em liberar dinheiro das contas inativas do FGTS e do PIS/Pasep. Economistas estimam que a liberação do FGTS em 2016 respondeu por 0,7 ponto percentual do crescimento de 1,1%. É uma medida de efeito imediato, mas incapaz de gerar crescimento sustentado.
Outra ideia em pauta é a redução dos juros. Economistas defendem que seria possível diminuir a taxa básica dos atuais 6,5% para abaixo de 5%, sem ameaçar as metas de inflação (em 2016, os juros estavam em 14,25%). Guedes considera até usar parte das reservas internacionais para abater a divída pública, permitindo ao governo gastar menos com pagamento de juros, para promover uma redução mais confiável.
O efeito sobre os investimentos seria indireto, na medida em que capitais buscassem ativos mais atraentes que papeis do governo, como ações ou debêntures. Nada, porém, capaz de devolver a taxa de investimento aos níveis do passado. Para isso, seria preciso recuperar projetos industriais, agrícolas e de infra-estrutura, dependentes de capitais maiores, investidos por prazos mais longos.
A indústria brasileira nunca foi grande coisa em termos de competitividade internacional. Em vez de desenvolver conhecimento e acreditar em inovação, sempre preferiu sobreviver à custa de empréstimos camaradas do BNDES. Desde o governo Temer, a fonte secou. O peso da indústria no PIB caiu de 18,5%, em 2008, para 10,4%.
A agropecuária, único setor em que conseguimos ser competitivos, tem perdido produtividade. A produção de grãos está em queda. Como um todo, o setor agrícola encolheu, apesar de a demanda externa ter gerado alta nas exportações. No PIB, a participação da agropecuária encolheu de 5,7%, em 2016, para 5,1%
Comércio e consumo continuam a gerar riqueza. Mas não dá para sustentar uma economia com base apenas neles. Qualquer estímulo se revela passageiro, como ficou provado pelas políticas de incentivo ao crédito pessoal adotadas nos governos petistas.
Para incentivar o investimento e o crescimento, a receita é conhecida. Primeiro, são essenciais as reformas que reduzam os recursos que o Estado drena da sociedade e os entraves que impõe aos investidores. Só assim a taxa de poupança do brasileiro atingirá um patamar mínimo capaz de sustentar os investimentos.
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Segundo, é preciso gerar conhecimento para que o empresário brasileiro possa se distinguir no mercado por seus méritos, não pelos favores camaradas de seus compadres no poder. Com empresas burras, incapazes de inovar, nossa produtividade continuará a patinar.
A primeira condição foi exigida pela população que foi às ruas no domingo, em manifestações favoráveis à reforma da Previdência e à agenda econômica do governo. A segunda, pelos que foram às ruas no último dia 15 e ontem, exigindo a manutenção dos recursos para educação e pesquisa nas universidades.
Ambos os protestos têm suas razões. Mas, se o governo caminha na direção correta ao tentar promover reformas econômicas, tem cometido erros em série na educação, em especial ao cortar recursos destinados à produção de conhecimento.
Soluções paliativas não tirarão a economia brasileira do buraco. É preciso, para isso, entender a relevância do conhecimento no crescimento duradouro. Mas talvez seja exigir demais de ministros que censuram estudos apenas porque desmentem suas crenças, ignoram o básico de ciência climática e não sabem nem conjugação verbal.
Fonte: “G1”, 31/05/2019