As políticas públicas para primeira infância podem ter um impacto grande no desempenho escolar futuro da criança e em outras dimensões da vida, como diminuição de criminalidade e encarceramento e melhora na empregabilidade e saúde, segundo James Heckman, prêmio Nobel de Economia. Mais do que tudo, se o investimento for correto, elas ajudam a nivelar as desigualdades de origem socioeconômica entre alunos.
Para que isso funcione bem, é necessário não ter uma visão fragmentada. As diferentes políticas voltadas à infância precisam trabalhar juntas: a mãe deve receber boa atenção na gravidez e no pós parto, como também visitação domiciliar, o que pode ajudar na amamentação exclusiva até os seis meses –e as leis trabalhistas devem prever uma licença maternidade compatível com o período– e na formação de vínculos afetivos entre mãe e filho.
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Além disso, visitas regulares ao pediatra e as vacinações previstas no calendário ajudam a promover a saúde do bebê. Mas, segundo especialistas, é num ambiente de afeto, isento de estresse tóxico, que o cérebro da criança melhor se desenvolve. Se isso puder ser acompanhado de conversas constantes, cantigas e leitura, num ambiente limpo e estimulante, tudo tende a ocorrer de forma harmônica e saudável.
Mas é aí que começa o problema. Nos meios vulneráveis, há problemas com saneamento, com o preparo das mães que muitas vezes são, elas mesmas, pouco mais que crianças e se sentem rejeitadas pela família ou frustradas com a perda dos folguedos próprios da idade. Além disso, como falar de leituras ou de livros?
A saída que se dá para a situação é apressar a entrada em creches. Afinal, lá a limpeza, professores e brinquedos. Mas não é uma solução sem perdas. A institucionalização de crianças muito pequenas, por boa parte do dia, torna mais difícil o fortalecimento de vínculos familiares, importante tanto para as mães como para os filhos.
Não é por acaso que países com bons sistemas educacionais retardam a entrada em creches, muitos até os três anos. Preferem investir em outras formas de suporte à mãe que trabalha, estuda e não conta com família estendida.
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No caso brasileiro, vale a pena conhecer a experiência de Boa Vista, que, em condições desafiadoras, integra os serviços de apoio à infância, priorizando o atendimento às famílias abaixo da linha da pobreza e evitando que os pequenos entrem em creches antes dos três anos. E a partir dessa idade, os centros infantis as recebem com um bom currículo, livros e brinquedos apropriados e professores preparados.
Só assim se começa a criar igualdade de oportunidades de verdade.
Fonte: “Folha de S. Paulo”, 09/08/2019