O senador Tasso Jereissati (PSDB-CE) apresentou semana passada um importante projeto de proteção social. Trata-se do PL 5343/2020, que cria a Lei de Responsabilidade Social. O projeto é baseado em uma proposta do Centro de Debates de Políticas Públicas (CDPP), para a qual tive o prazer de contribuir. O material está disponível aqui.
A proposta do CDPP consiste em medidas de aprimoramento da rede de proteção social brasileira, respeitando a necessidade de equilíbrio das contas públicas. Seus objetivos são eliminar a pobreza extrema, proteger os trabalhadores informais da volatilidade de sua renda e promover a igualdade de oportunidades.
Para atingir esses objetivos, é prevista a criação de três benefícios. O primeiro é o Benefício de Renda Mínima (BRM), que unifica os quatro benefícios que atualmente compõem o Bolsa Família. A estrutura atual é fragmentada e sobreposta, além de punir excessivamente a declaração da renda do trabalho. O BRM completa a renda da família até o patamar de R$ 125 per capita e reduz para 80% o desconto da renda do trabalho declarada pela família. A estimativa é que o número de famílias atendidas pelo BRM chegue a 13,2 milhões, com valor médio de R$ 230 mensais.
Para lidar com a volatilidade da renda dos informais, propõe-se a criação da Poupança Seguro Família, que consiste em um depósito mensal por parte do governo equivalente a 15% do rendimento do trabalho (sujeito a um teto) e aplicado em títulos do Tesouro. Os depósitos poderiam ser sacados em situações específicas, como uma queda da renda e calamidades como a atual pandemia. O depósito seria feito para famílias com renda do trabalho formal ou informal. A neutralidade em relação ao tipo de contrato de trabalho é importante para evitar que o programa gere incentivos à informalidade. A estimativa é de que a Poupança Seguro Família ofereça cobertura a 12,5 milhões de famílias.
Dado que o principal veículo para a mobilidade social é a educação, a proposta do CDPP apresenta várias medidas nessa área, em particular a Poupança Mais Educação. Cria-se depósito em poupança no valor de R$ 20 mensais para as crianças que estão no Ensino Fundamental e os jovens que estão no Ensino Médio, enquanto pertencerem a famílias elegíveis ao BRM. Essa poupança, que pode chegar a R$ 3.000 ao final do ciclo escolar, atendendo a 6,7 milhões de famílias, somente poderá ser sacada caso os jovens concluam o Ensino Médio, visando reduzir a elevada taxa de abandono nessa fase dos estudos.
A proposta do CDPP também propõe a universalização do Cadastro Único, com diversificação dos canais de atendimento e possibilidade de atualização online, além da unificação dos conceitos de família e renda familiar com base na definição utilizada atualmente no Bolsa Família.
Esses componentes da proposta do CDPP foram mantidos na Lei de Responsabilidade Social (LRS) proposta pelo senador Tasso Jereissati. As alterações dizem respeito a dois aspectos principais.
Primeiro, a LRS estabelece metas de redução da pobreza e extrema pobreza. O objetivo é reduzir as taxas de pobreza e extrema pobreza para 10% e 2%, respectivamente, em um prazo de três anos. Nos anos seguintes, caberá ao Poder Executivo estabelecer metas inferiores e decrescentes para a taxa geral de pobreza e extrema pobreza.
Segundo, a LRS propõe formas alternativas de financiamento. A proposta do CDPP funde o Bolsa Família com programas de desenho antiquado e baixa capacidade de redução de pobreza: o Abono Salarial, o Salário-Família e o Seguro-Defeso.
Já a LRS propõe que o novo programa social seja financiado com recursos atualmente destinados ao Bolsa Família, complementados com o remanejamento de emendas parlamentares e uma parcela do Abono Salarial. Neste último caso, são modificadas as regras de acesso ao benefício, cujo valor passa a depender do número de dependentes menores de idade dos trabalhadores elegíveis.
Caso as metas de redução da pobreza e extrema pobreza não sejam atingidas, a LRS estabelece uma redução de 15% dos gastos tributários do governo federal. Caso essa redução não seja suficiente para cumprir as metas, são acionados automaticamente os gatilhos do teto de gastos. Se, ainda assim, as metas não forem atingidas, serão suspensos os descontos referentes a gastos com dependentes na Declaração de Imposto de Renda de Pessoas Físicas. É prevista ainda a inclusão da área de assistência social entre aquelas elegíveis para recebimento de recursos do Fundo Social.
Assim como a proposta do CDPP, a LRS determina que a quantidade e os valores dos benefícios respeitarão os limites fiscais vigentes, em particular o teto de gastos. Este é um ponto fundamental. Qualquer tentativa de expandir programas sociais sem considerar a delicada situação fiscal em que o País se encontra resultará em aumento da inflação e baixo crescimento econômico, penalizando os mais pobres e trabalhadores com maior vulnerabilidade social.
Diante do fato de que o governo não apresentou sua proposta e da necessidade inadiável de aprimoramento da rede de proteção social, a Lei de Responsabilidade Social é muito oportuna e deve ser debatida pela sociedade e seus representantes no Congresso.
Fonte: “Blog do IBRE”, 14/12/2020
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