Na última quinta-feira, 07, o Instituto Butantan divulgou a porcentagem de eficácia da CoronaVac, vacina desenvolvida no Brasil, em parceria com a farmacêutica chinesa Sinovac. Os resultados, considerados excelentes pelos especialistas, são de 78% de eficácia, para casos leves, e de 100%, para casos moderados e graves, o que seria suficiente para trazer esperança de novos dias, sem o medo de mais mortes. No entanto, há uma onda antivacina que pode comprometer os resultados, já que para estarmos seguros, cerca de 65% a 70% da população precisa estar imune, segundo dados da OMS – Organização Mundial da Saúde.
O movimento antivacina ganhou força em 1998, com um artigo que associava uma mudança na vacina tríplice viral (contra caxumba, sarampo e rubéola) ao surgimento de casos de autismo. O estudo provou ser infundado e foi descartado pela comunidade científica pouco tempo depois, ao descobrirem que foi baseado em dados falsos e que seu autor estava envolvido com advogados interessados em lucrar com processos contra fabricantes de vacinas.
O problema é que o estrago já estava feito e muitas pessoas, receosas com os possíveis efeitos da vacina, deixaram de imunizar seus filhos e a si mesmos, o que seria a razão de doenças como o sarampo terem voltado a matar no Brasil.
Por falar em Brasil, a relação tempestuosa vem desde 1904, quando tivemos a reinstauração da vacinação obrigatória, tendo em vista um aumento substancioso de internações por causa da varíola. A recusa das camadas mais populares em se vacinar resultou em um episódio violento de nossa história, que ficou conhecido como Revolta da Vacina.
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A obrigatoriedade causou o efeito contrário ao desejado, fazendo com que a adesão caísse, e motivou Rodrigues Alves, à época presidente do Brasil, a desistir da vacinação obrigatória. O curioso é que em 1908, com uma epidemia violenta de varíola, já sem a obrigatoriedade, as pessoas formaram filas para serem vacinadas.
Com a iminente vacinação para prevenir o Coronavírus, essa discussão voltou com força total. Considerando que a vacina foi desenvolvida e testada em um tempo muito rápido, muitos brasileiros estão com medo e manifestam suas dúvidas sobre a segurança da mesma. Alguns grupos já estão decididos a não se vacinarem, o que levanta muitas questões no âmbito jurídico, principalmente porque, em dezembro do ano passado, o STF decidiu que a vacinação contra Covid-19 poderá ser obrigatória, porém, não forçada.
Obrigatoriedade x Sanções
Voltando à 1904, para conseguir contratos de trabalho, matrículas em escolas, certidões de casamento e autorização para viagens, o cidadão precisava comprovar a vacinação. Hoje, segundo Sebastião Ventura, advogado especializado em Direito do Estado e Previdenciário pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul, não há qualquer tipo de sanção prevista ao cidadão que se recuse a tomar vacina. Ouça o podcast!
“Nós temos que aguardar as diretrizes do Ministério da Saúde, do governo federal, para se ter uma clareza, e podermos afirmar de forma conclusiva se haverá uma consequência maior ou não para aqueles cidadãos que se negarem à vacinação que o governo estará promovendo”, explicou.
Do ponto de vista jurídico, uma empresa não pode obrigar o cidadão a se vacinar. “Apenas o poder público possui a prerrogativa de impor obrigações ao cidadão, especialmente, obrigações que incidam no âmbito de liberdade, inclusive, sobre o seu corpo”, contou. Deste modo, caso a vacina não seja obrigatória, as empresas e o setor privado não podem submeter obrigações ao cidadão neste sentido.
No entanto, Sebastião salienta que é possível que algumas instituições adotem a exigência da comprovação de vacinação. “No que tange ao funcionamento interno de suas atividades empresariais, visando preservar a saúde da clientela e dos funcionários que ali estão, pode ter algum tipo de restrição à entrada, ou à contratação de determinado serviço”, pontuou.
Uma coisa é certa, para entrar em alguns países já é exigida a apresentação de comprovante de algumas vacinas como a da febre amarela, por exemplo. A tendência é que a exigência da comprovação de vacinação para o Covid-19 seja incorporada. “Me parece que aquelas nações que começarem o processo de vacinação com antecedência, e começarem a atingir um número razoável de suas populações, poderão sim impor restrições de circulação de pessoas”, apontou.
Nas viagens domésticas, as empresas aéreas poderão impor algumas restrições ao embarque, o que para o advogado precisa ser observado. “Nós temos que ver se isso não lesará nenhum tipo de legislação federal e suas repercussões à âmbito estadual e municipal”, finalizou.
De toda forma, com sanções ou não, toda e qualquer ação, seja ela do governo ou do cidadão, gera uma reação. As escolhas precisam ser baseadas nas consequências geradas por ela. O cidadão não precisa de um Estado babá, precisa de educação e conscientização para que, assim, tome suas decisões baseados em conhecimento e não em fake news e teorias conspiratórias.