Sem dúvidas, o tema da taxação de dividendos é um assunto quente e sempre há um argumento por parte de quem defende a tributação ou por quem alega que não deveríamos tributar. A notícia tem atordoado alguns setores na sociedade brasileira como: empresas, empresários, investidores da bolsa de valores, dentre outros. Desde que o ministro Paulo Guedes assumiu a cadeira vem flertando o tema de taxar dividendos, e nessa semana houve outra discussão que seria em taxação acima de ganhos de R$ 240 mil anuais, um total de R$ 20 mil por mês e dividendos em até 20%.
A preocupação do mercado é de como será aprovado a medida. Grande parte das empresas não se preocupam com a taxação de dividendos, desde que tenha um equilíbrio sobre os tributos. Acrescentar mais um tributo e não diminuir a alta carga tributária que recai sobre as empresas seria um retrocesso gigantesco para o mercado brasileiro que tem se tornado cada vez menos competitivo. Atualmente, a alíquota total sobre as empresas é de 34%, e é esse o aspecto mais questionado pelo mercado. Por que uma taxa tão alta? E se houver tributação de dividendos, irá diminuir o IR sobre as empresas em uma linha favorável a todos? São pontos questionáveis e que deixam o mercado apreensivo nessa nova atualização da reforma tributária.
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E para quem ainda não entendeu, por mais que não se tribute dividendos no Brasil, isso não quer dizer que os donos de empresas paguem menos impostos, ou que recebam o dinheiro limpo sem nenhum tipo de encargo. Talvez seja esse o maior problema por parte de quem não entende: as pessoas tendem a crer que não cobrar dividendos é como se fosse um paraíso fiscal brasileiro, não é bem assim. Precisamos analisar a quantidade de impostos que é cobrado das empresas e somos o segundo maior país do mundo que taxa as empresas. Enquanto aqui é tributado 34%, temos a Alemanha com 29%, Estados Unidos 25,9 %, Espanha 25%, e até o nosso vizinho o Chile 25%. A maneira largada que se encontra nossa economia, se adotássemos um padrão de 22%, como é tributado na Europa seria um padrão otimista e geraria bons incentivos. Criamos uma cortina de fumaça sobre lucros e dividendos, mas esquecemos que as empresas no mundo inteiro pagam bem menos alíquotas do que aqui.
Como começou a isenção de lucros e dividendos
A isenção originou-se no ano de 1996 com FHC, naquele período, a taxação estava em uma alíquota de 15%, mas havia uma proporção gigantesca de pessoas que burlavam as regras e conseguiam fugir da tributação. Para se tributar dividendos a empresa precisava lucrar e ter distribuição de ganhos de capital. Assim, as empresas começaram a distribuir benefícios de forma duvidosa para os sócios, diretores ou representantes da empresa, uma distribuição disfarçada. E por outro lado, não queriam distribuir recursos e tinham a decisão de manter o recurso dentro da organização, com isso o Estado ficou preocupado com os níveis de arrecadação e a receita federal decidiu em 1995, tributar em IR – imposto de renda sobre as empresas, beneficiação social sobre lucro líquido, que fechando a conta somariam nesses 34%.
Na realidade a mudança foi para pior, pois agora as empresas pagam IR (imposto de renda), lucrando ou tendo déficits de qualquer forma tem que pagar. O Estado brasileiro encurralou as empresas independente da decisão dos sócios. É onde mora todo o questionamento. Se colocarmos na ponta do lápis o imposto cobrado sobre produtos (na fonte de maior giro de dinheiro) é bem maior que se fosse sobrado em lucros e dividendos, e em outros países do mundo é opcional: ou ser taxado sobre IR ou em lucros e dividendos. São alguns aconselhamentos que o mercado tem dado para aplicar nessa nova reforma tributária.
Quais impactos negativos em tributar dividendos
Queda no mercado de capitais
Teríamos grandes dificuldades em ser atrativos no mercado de capitais. O que isso quer dizer? Ia diminuir o fluxo de empresas buscando recursos para financiar seus projetos. A proporção de investidores nas empresas brasileiras iria diminuir absurdamente (lembrando que nosso mercado de capitais é pequeno comparado a outros países). Grandes empresas perderiam prestígio e o mercado de capitais tem esse propulsor, ele aproxima empresas de investidores e transforma a economia em um motor de atividade econômica.
Empresas são principais responsáveis pelo desenvolvimento econômico de uma sociedade e fomentam a criação de riqueza de um país, uma economia sustentável depende do acesso ao dinheiro fazendo com que consigam manter seus projetos, operações e atividades. São elas geradoras de empregos com fuga delas a capacidade de consumo da sociedade diminuiria. Quanto mais investimento há no mercado, mais dinheiro circula e a economia aquece.
Queda de aplicações na bolsa valores optando por operações isentas
As pessoas têm buscado sair de tributações, um exemplo disso é o alto índice de aplicações em criptomoedas (bitcoin, ethereum e etc.) O surgimento da bitcoin foi em 2010, se compararmos os 10 anos de fundação da criptomoeda com a evolução da IBOVESPA fundada em 1967, com mais de 50 anos de mercado. Nossa bolsa de valores teve um crescimento nada positivo ao longo dos anos, são 813 mil pessoas, enquanto as criptomoedas são de 1,4 milhões de pessoas. Uma distorção gigantesca de um mercado que existe há 50 anos, contra um que existe há 10 anos.
Em 2019, mesmo com a pandemia da covid-19, os Estados Unidos criaram 87 novas IPO, capitalizando mais de US$20 bilhões. Enquanto no Brasil, abrimos apenas 5, sem contar que tivemos uma queda de 2014 a 2019: Eram 459 empresas, fomos para 391. A comparação é grosseira comparando o maior mercado mundial, mas ficamos para trás para países que são economias menores do que a nossa, ex: Itália, Chile e etc.
Impacto em pequenos empreendedores
Desde a crise econômica de 2014, temos uma proporção gigantesca de micro e pequenos empresários em situações de desvantagem lutando para se manter no mercado. E com a facilitação dos dividendos essas pessoas tiram dinheiro como pró-labore. E quando tem um alívio nas contas e sobra dinheiro em caixa eles tiram o lucro. Um empresário pequeno que desvincula a uma outra linha para obter um lucro pífio em dividendos ver esse valor reduzido, iria ter um impacto gigantesco no mercado de trabalho. Ou ele iria acrescentar esses custos no valor da produção, ou, iria diminuir contratação, investir menos, gerar menos o capital.
A mentalidade de que o impacto em taxar dividendos afetaria apenas a bolsa é um pensamento imaturo, o feito seria bem maior do que imaginamos. Sem contar que tanto no mercado de empresas quanto na bolsa de valores, todos eles são sucateados em nosso país. Pode ser que retrocedamos ainda mais esse fator.
Sonegação invisível
Haverá sofisticação de evasão fiscal dentro das empresas. Os sócios encontraram caminhos para continuar arrecadando o lucro, desviando a tributação de imposto.
Outra forma de evasão, diz, é o chamado planejamento tributário abusivo. São mecanismos extremamente sofisticados de alocação das rendas, elaborados pelas empresas e seus advogados, que encontram brechas dentro da própria lei para que o dinheiro chegue aos donos por caminhos diferentes, sem passar pela tributação. Compras disfarçadas de bens, empréstimos forjados e remessas para o exterior são alguns desses caminhos.
De qualquer forma a taxação de dividendos em si só é um movimento obsoleto e inoperante, as pessoas preferem ser tributadas em juros de capital próprio, além de ser fácil burlar através de TEDs bancárias, PIX e outros movimentos bancários, pois não são emitidos através de duplicatas.
Por que agora decidir taxar?
Um estudo feito pela OCDE em 2016, fez um levantamento de vários países analisando a “Carga tributária sobre a renda, lucro e ganho de capital”, mostrou que nosso país tem uma arrecadação de 6,5%, e que a média da OCDE é de 11,4%.
Alguns representantes levantam essa tese dizendo que quem ganha mais no país paga menos impostos, mas quando olhamos para economias como o Chile 6,8%, México 7,3%, Espanha 9,4%. A arrecadação sobre renda está abaixo dos níveis padrões da OCDE, e se compararmos a carga tributária sobre as empresas têm um número menor do que o nosso país. Algumas falácias que são levantadas por alguns representantes.
Sim, há uma concordância que é possível tributar quem obtém riquezas e um capital maior, porém quando analisamos com afinco, essas pessoas pagam altas cargas em suas empresas e os tributos que são cobrados individualmente, pois estas pessoas gastam e consomem no mercado. No Brasil, de 30% a 40% de impostos retornam para o PIB brasileiro. O problema não está na arrecadação por que arrecadamos muito e sim como é distribuído esse dinheiro, e a qualidade do serviço prestado com a arrecadação desse dinheiro.
Conclusões finais
Tributar dividendos não é nem de longe o motivo do buraco que se encontra o nosso país. Estônia e Letônia cobram bem menos impostos sobre as empresas que a gente, e ainda assim não tributam dividendos. Precisamos reduzir a carga tributária sobre vários setores, desde o pequeno empreendedor até o mais produtivo. Investidores avaliam uma ação pelo fluxo de caixa dela, se cobrarmos mais impostos e dividendos afetar o fluxo de caixa as empresas valerão menos, fora a baixa em efeito cascata de pequenos empresários e ações da bolsa de valores. Pode ser que enfrentaremos momentos inoportunos como o Joesley Day.
A princípio era um retorno em taxas de dividendos em 15%, hoje em dia estamos falando de 20%. Uma diminuição rasa de 5% na alíquota total sobre as empresas que pagaram 29%, padrão alto comparado aos Estados Unidos e países da Europa. A tabela de imposto de renda não é atualizada desde 2015. Os problemas que realmente afetam nossa economia estamos deixando de mão.
Para aqueles que defendem a taxação de dividendos sem uma equalização dos impostos, ou são pessoas leigas, ou, no mínimo, maldosas que não entendem o verdadeiro problema enfrentado pelo país. É desconfortável vir mais um tributo para as empresas, já que isentar dividendos foi uma via de mão dupla em optar por taxar mais. O Estado brasileiro deve se encarregar de desmistificar nosso sistema tributário, que por sinal é absurdo. Isso, e decidir o que será taxado, se cobraremos em lucro ou consumo.
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