RIO – Depois de fechar 2020 com queda de 0,2%, o estoque de capital na economia brasileira avançou 0,7% em junho ante junho do ano passado, mostram cálculos do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea). Em março, o crescimento sobre igual mês de 2020 foi de 0,2%. O ritmo da variação interanual foi acelerando em abril (0,4%), maio (0,6%), até o 0,7% em junho.
Isso quer dizer que a recuperação da formação bruta de capital fixo (FBCF, componente que mede os investimentos no Produto Interno Bruto), passado o pior momento da crise causada pela covid-19, voltou a elevar o estoque de capital na economia. A recessão de 2014 a 2016 e o baixo crescimento que se seguiu fizeram com que, entre 2016 e 2019, os investimentos ficassem no negativo, segundo cálculos do Ipea.
Foi a primeira vez que isso aconteceu desde, pelo menos, 1947, conforme a série histórica construída pelos pesquisadores do instituto. Na prática, isso significa que os investimentos feitos na economia brasileira não foram suficientes sequer para garantir a manutenção de estradas, pontes, portos, fábricas e maquinário.
Na virada de 2019 para 2020, o cenário negativo para os investimentos tinha ficado para trás, segundo José Ronaldo de C. Souza Jr., diretor de Estudos e Políticas Macroeconômicas do Ipea. Na ocasião, ajustes na política econômica haviam permitido uma queda mais estrutural nas taxas de juros, as captações via emissão de títulos no mercado de capitais foram impulsionadas por isso e as empresas viram sua situação de caixa melhorar, após anos reduzindo o endividamento.
O cenário estava propício para o avanço dos investimentos. Até que, em 2020, com o tombo da atividade econômica por causa da covid-19, os investimentos voltaram a cair. “Quando a crise veio, atingiu em cheio também os investimentos. A notícia positiva é que os investimentos se recuperaram”, afirmou Souza Jr., numa referência à retomada experimentada pela economia desde o segundo semestre de 2020.
Para o diretor do Ipea, o quadro atual segue favorável aos investimentos. Tanto que, na retomada após o pior momento da crise causada pela covid-19, a produção de máquinas e equipamentos está crescendo acima da média da indústria, e segue em nível de atividade superior ao de antes da pandemia. A construção civil também vem com desempenho relativamente bom.
Segundo Souza Jr., apesar das incertezas em torno do ritmo da atividade econômica em 2022, da inflação pressionada e do ciclo de alta nos juros, o cenário prospectivo também tende a continuar positivo para os investimentos. Isso porque alguns impulsos seguirão agindo, a despeito das incertezas, como os efeitos de algumas reformas microeconômicas em regras regulatórias, nos setores de gás e saneamento, por exemplo.
“São reformas silenciosas, menos chamativas, mas retomam os investimentos”, afirmou Souza Jr.
Outro impulso para os investimentos, no médio prazo, é justamente o fato de terem ficado no negativo, em termos líquidos, entre 2016 e 2019. A situação atípica de passar tanto tempo investindo aquém do necessário obriga, agora, a investimentos inadiáveis em modernização e atualização tecnológica.
Para o movimento continuar, e o cenário ainda favorável aos investimentos se manter, é preciso atenção com riscos à frente, conforme Souza Jr. O diretor do Ipea destaca, principalmente, os rumos da política fiscal. Novos sinais de que poderá haver deterioração ainda pior das contas públicas, em meio ao cenário eleitoral do ano que vem, poderão levar a novas rodadas de aumento na percepção de risco, nas cotações do dólar e, consequentemente, nos juros, o que, aí sim, poderia piorar o cenário para os investimentos.
“Recuperação da economia que vem com investimentos mais fortes é o que todo mundo deseja”, afirmou Souza Jr.
Fonte: Estado de São Paulo (29/09/21)
Foto: Werther Sanatana/Estadão