Um estudo do Instituto Millenium demonstrou como o desequilíbrio das contas públicas e o aumento do endividamento têm impedido o crescimento da economia.
Para gerar emprego, diminuir a pobreza, investir, um país precisa crescer. E o Brasil pode andar devagar porque leva uma carga pesada demais: a dívida pública.
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Em 2012, a dívida bruta do governo brasileiro era de 62% do PIB. Cresceu nos últimos dez anos e está bem perto dos 100% de tudo que o país produz em um ano.
O primeiro de uma série de estudos do Instituto Millenium, que debaterá entraves do crescimento brasileiro, mostra que o nível alto de endividamento do Brasil traz consequências: crescimento econômico baixo, alta taxa de juros, elevada carga tributária e mais inflação.
“Essa dívida muito alta demanda dele melhores resultados fiscais e tira flexibilidade para fazer uma série de coisas que seria importante para o desenvolvimento. Hoje, no Brasil, a gente tem empreendedores tentando tomar recursos para criar empresa. Ao ter que financiar esse déficit, o Estado vai competir com esses outros agentes por esse recurso. Então, quando o financiador olha um agente que tem capacidade de gerar sua receita e oferece taxas de juros elevadas, alguém que quiser competir com esse agente terá que pagar taxas de juros mais altas, o que prejudica o desenvolvimento desses negócios privados”, explica o economista Jeferson Luis Bittencourt.
Nesse cenário, Josiane Luz Santana anda a pé para investir no crescimento da marca de chocolates aberta dois meses antes da pandemia.
“Fui em busca de financiamento e não consegui. Vendi meu carro para poder continuar tocando o negócio. Vendi o carro seis meses depois de começar a empresa, não tinha mais dinheiro. Tentei em vários lugares, exigem condição de garantia, coisa que não tenho para dar. E os financiamentos que eu consigo têm taxa de juros muito alta, a condição de financiamento não é legal. Então até hoje eu não adquiri um bom financiamento por conta disso, da condição do financiamento”, diz.
A lógica dos negócios vale para economia dos países: só cresce quem investe. Parte desse recurso pode vir da poupança interna, que é a economia das pessoas, governo e empresas. Mas com a necessidade de financiamento do déficit, o governo brasileiro drena o próprio crescimento.
A pandemia elevou o endividamento de grande parte dos países do mundo. Existem economias com dívidas maiores que a brasileira: Japão, Grécia, Itália, por exemplo. E outras com carga de juros sobre o PIB maior do que a nossa: é o caso de Paquistão e Índia. Mas nenhum outro país tem pior combinação de dívida e juros do que o Brasil. É uma posição perversa, porque o aumento da dívida e o medo de uma crise fiscal espantam os investidores estrangeiros. E menos investimento significa menos crescimento.
Há duas saídas para o Brasil, diz o economista coautor do estudo.
“Há dois caminhos. Um é que o país se comprometa a gerar resultado. É como se fosse uma família, ela tem uma dívida no banco e ela precisa refinanciar essa dívida no banco, e a primeira coisa que ela precisa dizer para essa instituição que está financiando é que ela não vai gastar mais do que o salário dela, de nodo que vai sobrar alguma coisa para ela pagar mensalmente as parcelas dessa dívida. E o outro, no caso do Brasil ele tem essa vantagem entre aspas, ela pode se desfazer de alguns bens para abater parcelas dessa dívida. O Brasil tem empresas estatais, tem investimentos em fundos que ele pode se desfazer e reduzir essa dívida no curto prazo”, afirma Jeferson Luis.
Se tiver espaço, a empreendedora Josiane cresce e contribui com o crescimento do país.
“Se eu tivesse hoje acesso a uma boa linha de crédito, uma condição de financiamento, condição de crédito legal, a minha empresa estaria hoje, com certeza, quatro, cinco ou até 10 vezes maior, teria mais funcionário, capacidade produtiva. Porque demanda eu tenho, tenho clientes tentando comprar, grandes redes varejistas tentando levar a marca, e eu não tenho capacidade produtiva”, diz.
Fonte: “G1/Jornal Nacional”, 14/12/2021
Foto: Reprodução