Uma eventual redução do Imposto sobre a Circulação de Mercadoria e Serviços (ICMS) cobrado sobre os combustíveis pode trazer uma perda relevante de arrecadação para os estados.
O ICMS é o principal imposto arrecadatório dos governadores, e boa parte dele vem da incidência sobre gasolina e diesel. No ano passado, o total de tributos estaduais arrecadados pelos 26 estados e pelo Distrito Federal somou R$ 689,4 bilhões, sendo R$ 101,3 bilhões provenientes do imposto que incide sobre combustíveis, segundo um levantamento realizado pelo Centro de Liderança Pública (CLP).
Em nove estados, o ICMS sobre combustíveis representa mais de 20% da receita tributária que entra no caixa dos governadores.
A cobrança do ICMS no preço dos combustíveis se tornou um embate público entre o presidente Jair Bolsonaro e os governadores. Com frequência, Bolsonaro cobra dos estados uma redução do imposto para ajudar na queda dos preços da gasolina e do diesel.
“Uma mudança na cobrança do ICMS vai ter um impacto muito significativo, sobretudo para os estados que têm uma malha rodoviária importante”, afirma Daniel Duque, gerente da inteligência técnica do CLP.
“O Centro-Oeste é uma região muito dependente do ICMS de combustíveis, dado que o agronegócio depende do escoamento da produção para os portos”, acrescenta.
Congelamento do ICMS
Pressionados por Bolsonaro, os governadores anunciaram o congelamento do ICMS em novembro do ano passado. Em janeiro, a medida foi renovada e vale até março.
Com o congelamento, os estados deixaram de calcular o “preço médio ponderado ao consumidor final” a cada 15 dias para a cobrança do ICMS. Dessa forma, eventuais aumentos nos preços dos combustíveis não são mais considerados na base de cálculo do ICMS.
Os governadores, no entanto, defendem a criação de um fundo com verbas federais para mitigar a alta dos preços dos combustíveis. Os recursos seriam utilizados para compensar os períodos de aumento na cotação do barril do petróleo. Eles também defendem que qualquer mudança do ICMS seja feita a partir de uma ampla reforma tributária.
Os estados mantiveram a decisão de congelar o ICMS num momento de melhora das contas locais. Nos últimos anos, vários governadores enfrentaram uma severa restrição fiscal, com atrasos de salários e paralisação de obras.
No ano passado, no entanto, uma combinação positiva de fatores permitiu que um aumento de arrecadação trouxesse um alívio para o caixa dos estados.
Os estados foram beneficiados pelos seguintes fatores:
Inflação. Em 2021, a alta dos preços foi bem maior do que o previsto pelas analistas. O aumento de preços dos produtos faz com que o setor público arrecade mais;
Preços das commodities. A retomada da economia global puxou a cotação das commodities em todo o mundo, o que melhorou, por exemplo, a arrecadação de royalties e participação especial do petróleo de diversos estados;
Retomada da economia. Depois do tombo de 4,1% em 2020, a atividade econômica se recuperou em 2021, em meio ao avanço da vacinação e à reabertura do comércio e dos serviços. O mercado financeiro projeto uma alta de 4,5% do PIB em 2021, mas de apenas 0,30% em 2022. Ou seja, a recuperação vai perder força, o que deve impactar a arrecadação.
Salários congelados. O caixa dos estados também foi reforçado pelo fato de o salário dos servidores ter ficado congelado até o fim de 2021, como contrapartida ao socorro da União para mitigar os estragos econômicos provocados pela pandemia de coronavírus.
Dívida com a União. Por causa da crise sanitária, os estados ainda tiveram a dívida suspensa com o governo federal.
ICMS no preço dos combustíveis
O ICMS compõe apenas uma parte do preço do preço do combustível. Ele também é formado pela margem da Petrobras, por tributos federais (PIS/Pasep, Cofins e Cide), além do custo de distribuição e revenda.
Há ainda o custo do etanol anidro, que é adicionado à gasolina, e o valor do biodiesel, que compõe o diesel.
Debates em andamento
No Congresso Nacional, duas propostas de emenda à Constituição (PEC) e um projeto de lei podem alterar a cobrança do ICMS.
Senado
De autoria do senador Carlos Fávaro (PSD-MT), a PEC autoriza União, estados e municípios a reduzir ou zerar impostos – como o ICMS – sobre diesel, biodiesel, gás e energia elétrica, em 2022 e 2023, sem precisar de medida de compensação.
Também cria um auxílio diesel de R$ 1,2 mil para caminhoneiros, com recursos que serão pagos fora do teto de gastos; aumenta de 50% para 100% o subsídio para as famílias de baixa renda na compra do gás de cozinha; e repassa R$ 5 bilhões para os municípios com o objetivo de mitigar a alta da tarifa do transporte público.
O Senado ainda analisa um projeto de lei que determina que o ICMS deixará de ser cobrado como uma porcentagem sobre o preço final do combustível.
A proposta é de que o tributo passe a ser um preço fixo, em reais por litro. Esse preço seria definido uma vez por ano, pelos governos estaduais, e não poderia ultrapassar o valor médio do combustível dos últimos dois anos. O projeto é criticado pelos governadores, que afirmam que perderiam mais de R$ 20 bilhões em arrecadação no período de um ano.
Câmara dos Deputados
Apresentada pelo deputado Christino Áureo (PP-RJ), a PEC proposta permite que União, estados e municípios reduzam ou zerem impostos sobre os combustíveis e o gás de cozinha em 2022 e 2023, sem medida de compensação. Também permite diminuir o Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI). Fontes do ministério da Economia calculam que a perda de arrecadação, apenas para a União, seria de R$ 54 bilhões em um ano.
Fonte: “G1”, 10/02/2022
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