O governo mal começou e já se buscam culpados para os potenciais resultados negativos de uma política econômica presumidamente intervencionista, que ainda nem fora completamente implementada. Assim está a discussão do mês sobre a independência do Banco Central.
Não irei me alongar aqui sobre a importância e os benefícios de se ter um Banco Central independente – isso caminha em conjunto com as melhores práticas econômicas mundiais. Essa independência é algo que não se discute mais nas economias desenvolvidas. Para estas nações, o Banco Central estar relativamente imune a pressões políticas é fundamental para a boa condução da política monetária, estabilidade da moeda e controle da inflação.
Somente em países subdesenvolvidos, de condução política com DNA populista (isso tanto para governos de direita quanto de esquerda), é que esse tipo de discussão ainda vem à tona. Assim, não defenderei aqui a independência do Banco Central, pois toda a literatura econômica mundial ao longo das últimas décadas já fez isso.
As críticas do governo federal à atuação do Banco Central do Brasil parecerem ser uma tentativa de encontrar culpados, só que desta vez antes do desastre acontecer – a velha política do `nós contra eles`, que infelizmente o povo compra. É aquela velha ideia de que há “algozes da nação” que têm a intenção de atrapalhar o seu desenvolvimento e deixar o pobre mais pobre para que uma pequena porção de ricos possam continuar sobrepujando. Pode até ter alguns pontos isolados em que esse dito seja verdade, mas na maior parte de vezes só serve de retórica para ineficiências políticas.
Neste diapasão, o Banco Central do Brasil (BCB), ao contrário dos Bancos Centrais dos países desenvolvidos, tem somente uma função no que se diz respeito aos seus objetivos monetários: garantir a estabilidade da moeda, ou seja, controlar a inflação. Nos países desenvolvidos, entretanto, seus Bancos Centrais têm o que se chama de mandato dual (ou duplo mandato): controlar a inflação garantindo, na medida do possível, o pleno emprego.
A garantia do pleno emprego não está entre os objetivos finalísticos do Banco Central do Brasil – não foi isso o regulamentado por Lei. Assim, sua função unicamente é se preocupar com a inflação. E o principal instrumento que ele detém para controla-la é a taxa de juros. Assim, caso haja, por um lado, medidas potencialmente inflacionárias decorrentes da atuação de entidades públicas ou privadas – como uma escassez de oferta causada por fechamento de empresas numa pandemia ou uma política fiscal de gastos desenfreados – o BCB é obrigado, mediante cumprimento de dispositivo legal, a usar as ferramentas que possui para segurar a escalada inflacionária.
Neste ínterim, infelizmente, em países com o histórico inflacionário brasileiro, ainda é arriscado impetrar um mandato dual ao Banco Central. Desde o século passado tivemos governos descompromissados com o controle da inflação. E, ainda hoje, governos tendem a gastar sobremaneira (mais uma vez, tanto de direita quanto de esquerda – parece que política fiscal frouxa no Brasil não é uma questão de vertente política, mas somente de tempo), esquecendo que isso pode acelerar a inflação. Assim, se alguém precisa ter a devida atitude para garantir a manutenção do poder de compra do brasileiro, inclusive do mais pobre – a quem a inflação mais impacta negativamente, que seja então o Banco Central, com as ferramentas que possui.
A melhor solução para esse imbróglio perpassa pelo governo federal fazer um compromisso de executar uma política fiscal sóbria e com isso conseguir que o BCB reduza as taxas de juros em virtude dos menores riscos inflacionários. Os outros caminhos somente fariam recair um atraso institucional e econômico nocivo ao Brasil, acelerando a inflação e a instabilidade da atuação dos órgãos do Estado. Seria um regresso na consecução dos objetivos propostos no âmbito de um Estado democrático de direito.
Por fim, essa polêmica do mês dá um sinal de que parece ser que o próprio governo não creia na produção de bons resultados da sua política econômica e, previamente, já possa estar procurando algozes para culpar quando, no futuro, suas medidas econômicas não gerarem a prosperidade prometida.