O jornal o Globo debate o polêmico retorno da Contribuição Provisória sobre Movimentação Financeira (CPMF) e lembra que o imposto foi criado para uma situação emergencial, portanto, para um período limitado.
Leia na íntegra:
Onde se lê “provisório” leia-se “permanente”. Tratando-se de carga tributária no Brasil, esta é a interpretação que deve ser dada para iniciativas que deveriam vigorar por um prazo determinado, mas na prática acabam se perpetuando.
Veja-se a questão envolvendo a extinta CPMF, sigla de Contribuição Provisória sobre Movimentação Financeira. O tributo foi criado com a justificativa de atender a uma situação emergencial. A Previdência Social, já envolvida em seu próprio déficit, deixara de financiar gastos dos sistemas públicos de saúde, e o setor estava mergulhado em crise aguda. A CPMF — inicialmente como imposto — seria a tábua de salvação. Desde a criação desse dispositivo, com data certa para ser extinto, o país passou por um ajuste fiscal significativo. A arrecadação avançou mais que a evolução do Produto Interno Bruto (PIB), sinalizando um considerável aumento da carga tributária.
A saúde continuou absorvendo verbas crescentes, e já se sabia que esta situação teria de ser resolvida sem a CPMF, uma vez que a contribuição tinha prazo definido para terminar.
Em vez disso, o governo apostou em mais uma prorrogação do tributo, e foi derrotado no Congresso, o que refletia a saturação do contribuinte em relação a promessas não cumpridas. Vale lembrar que o governo, antes, já sucumbira à tentação de elevar a alíquota da CPMF, sob o argumento de que isso pesaria pouco no bolso dos contribuintes.
A CPMF é o sonho de qualquer autoridade fazendária. Aparentemente, “pesa pouco” no bolso do contribuinte e produz imensa arrecadação, especialmente em uma economia ativa. Não exige esforço da máquina arrecadadora, pois o tributo incide automaticamente sobre movimentações bancárias. A fiscalização se concentra nos bancos, agentes recolhedores, e não nos próprios contribuintes, como acontece com a maioria dos impostos.
Por que razão, então, um tributo tão simples, com resultados tão fantásticos, não é adotado em larga escala por outros países? Por que razão a CPMF não é um ovo de Colombo, do tipo “como não havia pensado nisso antes?”, e sim uma excentricidade que só é encontrada no Brasil?
Esse tributo gera enorme arrecadação em economias com cadeias produtivas complexas, com várias etapas de transformação industrial, de transportes e distribuição. Não distingue consumo de investimento, nem exportação de produção voltada ao mercado doméstico. Não diferencia os contribuintes por nível de renda.
Em suma, fere todos os bons princípios tributários. Apesar de todos esses aspectos negativos, governadores pleitearam a volta da contribuição, a presidente eleita, Dilma Rousseff, mesmo dizendo que a iniciativa não deverá ser do governo federal, manifestou- -se sensível ao “apelo” de alguns estados.
Segundo a presidente eleita, será preciso encontrar uma fórmula para financiar as despesas de saúde, ainda mais que, no caso federal, os gastos passaram a corresponder a uma fatia do Produto Interno Bruto (PIB), sem vinculação direta com o resultado da arrecadação. Nessa camisa de força, o setor público precisaria estruturar seus orçamentos sem necessitar de “dinheiro carimbado”. Os contribuintes já pagam os devidos impostos, e não devem arcar com mais um.
Publicado em 22 /11/2010
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