“São os consumidores e não os empresários que determinam o que deve ser produzido.” (Mises)
O governo apresentou uma proposta de reforma para a Lei Rouanet, a lei de incentivo à cultura. A proposta é mais uma demonstração de que nada é tão ruim que não possa piorar. A essência da reforma, de forma resumida, é concentrar mais poder nas mãos do governo. A grande insatisfação por parte do ministro Juca Ferreira (o leitor sabia quem era o poderoso ministro da Cultura?) e demais membros do governo é a atual concentração de recursos provenientes dos incentivos fiscais no eixo Rio – São Paulo. Eles apelam para o termo mágico em moda, “democratização”, que no fundo quer dizer apenas mais governo e menos liberdade na hora de escolher os espetáculos preferidos.
Explico melhor: no livre mercado, os produtores, inclusive de eventos culturais, precisam atender a demanda dos consumidores. É por esta lógica que filmes de Hollywood conquistam tanto público, enquanto os arrastados filmes franceses, feitos para agradar os produtores “intelectuais” amigos dos burocratas poderosos, costumam ficar com salas vazias. É o público que manda, gostemos ou não de sua escolha. Como explicou o economista Mises, “a economia de mercado tem sido denominada democracia dos consumidores, por determinar através de uma votação diária quais são suas preferências”. A verdadeira democracia, portanto, é garantir a liberdade de escolha dos consumidores.
Quando o governo fala em “democratizar” a cultura, ampliando compulsoriamente o financiamento para o interior do nordeste, por exemplo, ele está afirmando que são os burocratas do governo que devem decidir onde investir, e não o próprio consumidor. Algum cineasta engajado do Acre receberá uma gorda verba para fazer um filme que ninguém quer assistir, provavelmente fazendo propaganda do próprio governo. O ministro ataca a “lógica do mercado”, que nada mais é do que a liberdade de escolha de cada um. A alternativa é o fascismo, com o foco voltado para o produtor, e não o consumidor. No fascismo, são os produtores influentes, amigos do rei, que mandam. Esse parece o caminho defendido pelo governo atual.
O cão não morde a mão que o alimenta. Quando as verbas culturais dependem da aprovação de algum burocrata poderoso, a liberdade cultural foi para o espaço. Será o mecenas quem decidirá o conteúdo do projeto. Na melhor das hipóteses, teremos projetos culturais de péssima qualidade, que o público não tem o menor interesse de ver. No caso mais provável, teremos uma máquina de doutrinação ideológica sendo utilizada pelo governo, com recursos provenientes dos nossos impostos. Basta ver que tipo de filme é produzido em Cuba. É a morte da cultura propriamente dita, que dá lugar a algo completamente diferente.
A vida do gênio Mozart ilustra bem a luta de um artista pela sua liberdade. Como diz Norbert Elias em sua biografia do músico, “Mozart lutou com uma coragem espantosa para se libertar dos aristocratas, seus patronos e senhores”. A decisão de Mozart de largar o emprego estável em Salzburgo significava o abandono de um patrono, tendo que ganhar a vida como um “artista autônomo”, vendendo sua obra no mercado. Era algo bastante ousado e inusitado na época, cuja estrutura social ainda não oferecia lugar para músicos ilustres e independentes. O risco assumido por Mozart era extraordinário. Ele antecipou as atitudes de um tipo posterior de artista, com confiança acima de tudo na inspiração individual. A reforma proposta pelo governo parece um retrocesso aos tempos anteriores a Mozart, onde o patrono dá as cartas.
Naturalmente, o mercado é eficiente em atender a demanda das massas. Existirão nichos para mercados de luxo, mas a grande recompensa vem para aqueles que conseguem satisfazer os desejos da grande maioria. Por isso o Big Brother Brasil consegue tanta audiência, enquanto uma peça de Shakespeare atende um público bem mais restrito. Entre Kafka ou Paulo Coelho, as massas optam pelo último. Essas escolhas incomodam muitos membros da elite, inconformados com os critérios de escolha da multidão. Mas a solução não é concentrar poder de decisão em algum “rei filósofo”. Não é possível impor de cima para baixo um apreço pela cultura. Forçar alguém que deseja escutar funk a bancar um concerto de música clássica é o caminho certo do desperdício de recursos públicos. E obrigar aqueles que admiram uma boa ópera a financiar documentários propagandísticos do governo é um grande abuso de poder, uma enorme injustiça.
A liberdade individual de escolha é a única forma justa de canalizar recursos para a cultura. E se as escolhas do povo serão “erradas” pela ótica da elite do governo, paciência. Somente a gradual educação fará com que o público em geral melhore seus padrões de gosto, lembrando sempre, porém, da máxima de gustibus non est disputandum. Gosto não se discute; apenas se lamenta!
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