Como é sabido, a “Veja” estampou matéria da maior gravidade envolvendo outro ministro de Estado, o do Trabalho, e sexto tirado da obscuridade para as luzes da ribalta. Das páginas da revista, o caso passou aos jornais e pela televisão divulgado para o país inteiro. Eis senão quando, alta personalidade do governo, da imediata confiança da senhora presidente, declarou estar cansado de tantas denúncias de corrupção, o que não me causou espécie, dado que a nação inteira está mais do que farta da lama que, dia a dia, escorre por altos distritos administrativos. Mais curioso foi o secretário da Presidência adiantar, sponte sua, que o governo tinha notícia do fato denunciado pela “Veja”, tanto que se dirigira ao ministro alvejado pedindo-lhe informações.
Há quem pense que a notícia palaciana não tem veracidade, pois, supostamente ciente, nenhuma providência útil se sabe tenha sido tomada. Também há os que aceitam como verídica a versão, embora dela não se tenha senão a complacência do governo, quando para repetir uma das analistas mais lúcidas da grande imprensa, a administração “está infestada pela prática do uso privado do patrimônio público”. Em outras palavras, o governo sabia de tudo, mas teria se limitado a impor ao ministro três ave-marias de penitência. E tanto pode parecer plausível a interpretação quando, a seguir o ministro garroteado, que se dizia sujeito à apreciação do Conselho de Ética Pública da Presidência, amparado pela maior publicidade, entrou a reagir como Hércules. Num dia, afiançou atrevidamente, “duvido que a Dilma me tire” e “para me tirar só abatido à bala, e precisa ser bala forte, porque eu sou pesado”(sic). E, enquanto a imprensa informava que “Lupi perde apoio dentro de seu próprio partido após denúncias”, no dia seguinte noticiava, que em reunião de seu partido – “maioria do PDT ameaça deixar a base se Lupi cair”, “só saio à bala” (sic). Não podia deixar de ser grande a repercussão da inédita postura ministerial. Afinal o recalcitrante ministro aludia à presidente da República como “a Dilma”, com uma intimidade delirante do tratamento oficial entre autoridades; talvez a estranha e imprópria camaradagem se devesse à bastardia de um republicanismo de que agora se fala, como se a monarquia estivesse a ameaçar a República; talvez por lembrar que ele era ministro no governo passado e fora conservado no atual a instâncias do ex-presidente, “só saio à bala!”. Contudo, chamado a palácio, não teve a defrontar nenhum pistoleiro de má caturra, nem esgrimista exímio, nem mesmo um destro capoeira sem outras armas que a plasticidade incomparável dos gestos, segredo do seu ofício, nada disso para enfrentar a insolência da boçalidade; à sua frente encontra uma dama elegante e de alto nível intelectual, segundo se diz, de palmatória em punho a fim de aplicar uns “bolos” e com a ordem de retratar-se. Por esse tempo, o caso já invadira o terreno da ópera bufa. Ao retratar-se, abriu o coração valente. Como cenário escolheu uma comissão da Câmara para, em súplica destemperada, novamente tutear a senhora presidente, “Te amo”, bradou perante a nação. Afinal, o recôndito amor ganhou a devida publicidade. A patuscada chegava ao fim!
Fonte: Zero Hora, 14/11/2011
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