Notícias esparsas dão conta do nível de insanidade a que chegou a classe política brasileira na busca alucinada de recursos para equilibrar orçamentos recheados de desperdícios e privilégios escusos. O carro-chefe dessa escalada da insensatez é a CSS, cópia borrada da CPMF, o imposto do cheque que se quer ressuscitar “para melhorar a saúde” (?). Vem a reboque a Cide sobre livros, que taxaria uma das poucas atividades que ainda gozam de imunidade contra a sanha arrecadadora dos políticos.
Não é nova nem vai acabar logo a guerra entre o povo crucificado por taxações e os mandatários instalados nos palácios, distantes do mundo aqui fora, das dificuldades da vida real e produtiva. Mas vamos combinar o seguinte: o grau de abuso tributário dos governantes está no inverso da capacidade de indignação e mobilização de um povo. A pacata e amorfa nação brasileira é, reconhecidamente, ruim na hora de se mexer. Algo, contudo, se revela oportuno fazer, mesmo quando boa parte do povo ainda espera ser o governo seu salvador da pátria, por meio de supostas gratuidades na distribuição de benesses.
Duas providências esperam o engrossar de adesões. Ambas dizem respeito à transparência e à fiscalização popular, algo que, não por coincidência, falta a nossos mais importantes sistemas de poder: o sistema tributário e o sistema político.
No caso do primeiro, a providência liminar pela qual todos devemos lutar é a transparência na cobrança. Qualquer tributo precisa aparecer claramente no preço de qualquer mercadoria ou serviço, na exata hora em que o consumidor põe a mão no bolso para pagar. A carga tributária tem de ser explicitada no ato do pagamento de toda e qualquer transação. Não é à toa que o Congresso não vota esse comando. A carga de impostos à vista dos brasileiros produziria espanto e revolta.
Seria ótimo se a nação sentisse com clareza o trituramento a que se submete no moedor de pessoas e empresas que é o atual sistema tributário. Nesse momento, haverá chance de uma reação. E os próximos candidatos à Presidência, para merecer financiamentos de campanha das grandes empresas, deveriam se comprometer a praticar a abertura dos tributos nos preços de tudo o que se paga neste país.
A segunda providência, ainda mais difícil, também vale uma boa briga. A boa reforma da política deverá exigir o rodízio permanente de seus representantes. A própria população deve avaliar a conduta de cada um que senta na cadeira do poder. A internet pode ser um instrumento muito eficaz. O voto direto pela web, que as emissoras de TV já usam para consultar quem fica ou quem sai em reality shows, é um conceito totalmente aplicável ao hoje fechado mundo político. Mas devemos pensar coisa maior. A renovação dos quadros políticos está na essência da modernidade em matéria de representação de qualquer sociedade, enquanto a vitaliciedade no poder é seu oposto.
Falo de desestimular ativamente as carreiras políticas, introduzindo travas aos que se apresentam continuamente “ao serviço da sociedade”. As novas gerações deveriam ser educadas na noção de que melhor serve à coletividade o cidadão que faz aquilo para que se preparou profissionalmente. O recrutamento para a representação política deveria ser essencialmente rotativo. Quando avalio o escândalo atual do Senado Federal, encontro pessoas capazes, mas, infelizmente para todos, dedicadas apenas a perpetuar sua presença nos jogos de poder. Trata-se de uma prática que só induz à transação de favores e ao completo abandono dos programas partidários e dos compromissos iniciais do candidato – se é que eles existiram.
A mais elementar revolução no modo de bem representar um conjunto da sociedade seria o rodízio obrigatório dos representantes e a vedação de reeleição em qualquer cargo ou nível político, incluídos os parentes, mediante regras que, impedindo o surgimento dos políticos profissionais, os compelissem a encostar a barriga do outro lado do balcão.
(Época – 07/09/2009)
No Comment! Be the first one.