Os motivos que levaram à obra em pauta estão documentados fartamente em diversas obras e trabalhos jornalísticos, acadêmicos e históricos. O que nos interessa no artigo presente é abordar uma das lições mais preciosas que o tempo emprestou à famigerada divisão, e porque tal lição ainda precisa ser entendida e praticada em tantos lugares do mundo.
Os muros de Berlim estão espalhados por tantos e tantos lugares, ainda que sejam menos perceptíveis materialmente falando. Nem sempre são os tijolos que separam favelas e condomínios de luxo. Por vezes, o limite de um córrego ou de um descampado mostra uma administração pública municipal mais efetiva que outra, vizinha. Às vezes, é a pavimentação de estradas que acabam exatamente no limite de diferentes entes políticos.
O que, então, pode-se retirar do muro de Berlim, sua longa duração, e os motivos de sua queda, muito mais pragmáticos em termos de didática para o estado atual? O muro dividiu um espólio de guerra, e com isso, dois mundos econômicos opostos pelo vértice. Capitalismo e Comunismo.
Sendo certo dizer que o sistema comunista entrou em colapso em todo e qualquer país no qual esteve ou está implantado, também não nos parece correto afirmar que o capitalismo venceu como modelo de sistema econômico justo e equilibrado. Sim, sua sobrevivência demonstra que este sistema é melhor quando comparado ao pensamento de Marx e seus seguidores, ou como dizemos academicamente, de Marx e daqueles que interpretaram as palavras dele.
Contudo, o modelo de Estado Liberal da alta idade-média que se instalou novamente, agora com nomenclatura mais rebuscada substituindo capitalismo selvagem, no qual o Estado meramente obedece a corporações sem cumprir a devida fiscalização parcial que justifica tributos, acreditando que o caráter do ser humano se regula da mesma forma que o mercado o faz, produz resultados nem sempre dignos, como deveriam ser.
O que se observava, portanto, no lado ocidental do muro quando de sua existência, era o crescimento de uma Alemanha Ocidental que não se deixou levar por filosofias antropofágicas de lucro acima de tudo, que observou o crescimento sustentável antes de outras nações, e manteve suas políticas públicas relativamente eficazes, com exceção à previdência social, ainda um grande problema.
Do lado oriental, o declínio vertiginoso de um país que censurava qualquer comunicação, manipulava informações, perseguia e executava dissidentes políticos, investia em falsas propagandas, em substâncias proibidas para seus atletas, tudo em nome de um regime ditado em terras soviéticas. Colapso do Bloco, estados-membros acompanharam o movimento de derrocada.
Então, bastou que os compatriotas ocidentais confirmassem a falência econômica e social de seus irmãos orientais, e pronto: vamos derrubar o muro. Não. Bem longe dessa simplicidade, um dos pontos mais importantes da reunificação foi um plebiscito realizado entre os alemães ocidentais, informando que o custo financeiro da união dos dois países seria pago por eles, filhos de um regime mais eficaz, com mais recursos para tanto, e sem esperar nada do outro lado – nem bens, nem tecnologia de alguma espécie, ou seja, sem patrimônio monetário ou realizável.
E assim foi feito. Os mais abastados e que muito trabalharam para chegar a boa condição geral de vida, concordaram em dividir o prejuízo em pequenas parcelas entre cada um deles, tendo como objetivo maior o bem comum. E para se tratar do conceito de bem comum precisaríamos de um outro artigo, bem mais extenso. Mas, tenhamos, por hora, que bem comum é a situação de direito em que todos possuem as mesmas condições de avançar rumo ao que entende ser importante para si, sem sabotar o direito alheio.
Pois, então, a lição para lidar com os outros tantos muros existentes por aí é assumir a dívida dos compatriotas menos abonados? Não. Até porque os motivos impostos aos alemães orientais por longos 30 anos não são, nem de longe, os mesmos que fazem com que alguns optem por uma mentalidade marginal. Condição marginal é a soma de diversos fatores. Mentalidade marginal é uma opção interna. A condição marginal pode levar ao subemprego, a um salário desproporcional às necessidades básicas. O que leva ao crime como opção de vida, é a mentalidade marginal.
Logo, o muro de Berlim original, não separava alemães quanto à mentalidade marginal, e sim quanto à condição marginal. Seja como for, cabe sim uma lição: é preciso dar mais atenção aos que estão em condição marginal e não se quedaram à mentalidade marginal. Eles merecem mais do Estado e merecem mais de cada um dos que podem ajudar de alguma forma – seja com palestrar e aulas voluntárias, com recursos bem direcionados às instituições sérias, e outras atitudes de quem sabe que, cedo ou tarde, teremos essa conta para pagar, e quanto mais cedo derrubarmos os nossos muros, menor será a conta, inclusive a conta moral.
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