Os bancos centrais tiveram sucesso em afastar a ameaça de uma Grande Depressão com a receita de sempre: juros muito baixos por um longo tempo. Reverteram o colapso dos preços das ações e dos imóveis e interromperam a queda livre da produção e do emprego.
Para quem ainda tinha dúvidas sobre a contribuição do Federal Reserve (Fed, o banco central americano) de Alan Greenspan para a formação das grandes bolhas financeiras, o atual presidente, Ben Bernanke, resolveu repetir a peça. Vale a ver de novo.
A partir de doses inéditas de injeção de liquidez pelo Fed, foi restabelecida a mecânica da formação de bolhas. O baixo custo do dinheiro e a liquidez abundante derrubaram novamente a cotação do dólar nos mercados de moedas, empurraram para cima os preços das commodities, fizeram disparar os preços das ações nas bolsas, estabilizaram a demanda de bens e serviços e deram início à recuperação da atividade econômica.
Ia tudo muito bem até que uma forte correção nos mercados financeiros trouxe de volta o pesadelo do buraco negro que ameaçou tragar a economia mundial.
As amplas flutuações dos preços, os episódios de pânico nas vendas de ações, o aumento do volume de transações e o medo de uma interrupção da política de dinheiro fácil e barato do Fed eram os sintomas de um nervosismo que se transformava em histeria, a exemplo do que ocorreu no fim de 2008 e se repetiu no início de 2009.
Foi então que o Fed deu um sinal claro: reafirmou seu compromisso com a política de juros baixos, mas reduziu ligeiramente seu programa de recompra de papéis. Continua a política de dinheiro barato, mas diminuem as doses de injeção de liquidez. Com o recente episódio de turbulência, ficam evidentes não apenas o papel dos bancos centrais na formação das bolhas, mas também a inevitabilidade de uma síndrome de abstinência quando se fala em interromper a droga administrada: o dinheiro farto e barato.
Por que insistiriam os bancos centrais nessa mesma receita de formação de bolhas sucessivas? A resposta é política. Teria o governo americano coragem de deixar quebrar os grandes bancos, preservando apenas os pequenos depositantes, até o limite estabelecido por lei? Isso dissolveria quase US$ 1 trilhão que o governo chinês tinha em títulos das agências imobiliárias envolvidas até o pescoço na criação da grande bolha de crédito. A saída mais fácil é a tentativa de inchar os balanços, inflando novamente os preços dos ativos, em vez de assumir as perdas definitivas dos credores.
Os contribuintes que elegeram Barack Obama terão de pagar mais e mais impostos para salvar bancos ou, pior ainda, grandes depositantes que vão de um bilionário local a um cleptocrata russo, tudo em nome da salvação do “capitalismo”. É assim que funcionam as finanças nas economias modernas: “capitalismo” para todos, exceto para os financistas.
(O Globo, 16/11/2009)
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