“Para os chineses, a Olimpíada representa um sentimento de orgulho. Eles querem que a China seja vista com respeito pelo mundo e os jogos são uma oportunidade para isso”. (Minxin Pei, diretor do Carnegie Endowment for International Peace.
No dia 4/9/2006, publiquei neste espaço o artigo “Rio 2020: uma aposta no futuro”. Nele, afirmava que “o Brasil e o Rio deveriam contemplar a possibilidade de postularem a candidatura da cidade para a Olimpíada de 2020. A cidade poderá repetir a experiência para 2016, com o intuito de ir acumulando experiência.
Entretanto, há problemas importantes que serão difíceis de superar no futuro imediato: 1) a situação fiscal continuará a restringir o espaço para o investimento público ainda por algum tempo; 2) os problemas de saneamento da Baía da Guanabara não poderão ser resolvidos no prazo de poucos anos; e 3) o êxito no ataque ao problema dramático da violência requer pelo menos 10 anos de esforços das autoridades das três esferas de governo e muitos anos de crescimento da economia a um bom ritmo, com a criação de empregos disso resultante, afetando favoravelmente a situação da população marginalizada”.
Pouco depois, o Rio se candidatou para 2016. Eu julgava na época que o Rio não teria chances, a curto prazo. Eis aí uma situação em que posso afirmar com satisfação que, felizmente, eu estava errado.
Agora que o Rio foi escolhido, o Brasil precisa fazer com a Olimpíada de 2016 o que a China fez com os jogos de Pequim: tornar o evento um símbolo de superação e de modernidade. Alguém pode alegar que já conseguiremos isso com a Copa do Mundo, mas é mais do que isso, porque: a) por mais que o país se beneficie da realização da Copa, complementar o fato com a Olimpíada 2 anos depois irá gerar uma “onda brasileira” no radar do resto do mundo, numa escala mais intensa do que se fôssemos sediar apenas um dos eventos; b) o impacto sobre o desenvolvimento do esporte no Brasil – algo importante para gerar alternativas para nossa juventude – é muito maior no caso de uma Olimpíada, que afeta todos os esportes e não apenas um; e c) para seduzir os turistas a visitar o Brasil, atacar frontalmente alguns dos problemas tradicionais do Rio será mais eficaz do que o resultado que atingiremos com a realização da Copa.
Para quem conheceu o Rio de outras épocas e apesar da melhora recente, a candidatura do Rio para sediar a Olimpíada gerava um misto de esperança e ceticismo. Esperança, porque todo carioca torce para o Rio melhorar. Ceticismo, porque no íntimo todos nos perguntávamos: “Como poderemos estar à altura do desafio, numa cidade onde temos medo de andar na rua?”. Agora, devemos fazer um ponto de honra que, até lá, a violência, que se tornou uma marca negativa da cidade, tenha sido substancialmente reduzida.
O “Projeto Olímpico” deve envolver as seguintes características: 1) a Olimpíada deve ser vista como parte de um projeto nacional e não um esforço da cidade; 2) é essencial, nos próximos anos, que as forças de segurança ocupem, em caráter definitivo, a maioria das favelas do Rio, preferencialmente com a utilização de policiais que morem no local, a exemplo de algumas experiências incipientes que têm sido implementadas recentemente; o tráfico e as milícias têm que desaparecer das favelas, para que elas passem a ser um lugar por onde os seus moradores transitem sem medo; 3) a estreita colaboração entre os três níveis de Governo – União, Estado e Município – que tem sido observada deve continuar, pois é crucial para o êxito da iniciativa; e 4) o BNDES deve ser um grande financiador do conjunto de investimentos públicos e privados que tal evento requer.
Os eixos da atuação do poder público nos próximos anos devem abranger os seguintes campos: a) aumento considerável do policiamento, para que o número de agentes da segurança atue como um forte inibidor do crime; b) ampliação expressiva da rede de metrô e de trens da cidade; c) avanços no programa de despoluição da Baía de Guanabara e implementação de outras melhorias ligadas ao ambiente; e d) realização de obras de modernização e de ampliação do aeroporto do Galeão.
Um ponto importante que é preciso destacar é que o projeto da Olimpíada deve estar atrelado a uma reflexão sobre o que o Rio será depois de 2016. A cidade, assim como Barcelona em 1992, precisa se “reinventar”. Uma possibilidade na qual as autoridades poderiam pensar seriamente, a partir de agora, seria a de iniciar negociações com o grupo Disney para, depois da Olimpíada, inaugurar na cidade um complexo de parques, como é a Eurodisney em Paris (eu defendi o projeto em artigo neste mesmo espaço, “Eleições municipais: por que não uma Rio Disney?”, Valor, 14/7/2004). Cabe lembrar que o grupo tem parques nas duas costas dos EUA, na Europa e na Ásia. Se a economia brasileira se firmar, não tenho dúvidas que haveria fortes razões para abrir uma filial da Disney no país e, nesse caso, seria lógico que isso ocorresse no Rio, por ser uma cidade turística por excelência, por estar localizada no centro do país e por ter feito o esforço de melhora da rede hoteleira que fará entre 2010 e 2016.
O empreendimento poderia ter um público de usuários representado por: a) os habitantes do RJ; b) os brasileiros de outras regiões do país; e c) os turistas da América do Sul. O objetivo seria atrair pessoas que não podem ir aos EUA ou aqueles que já foram e teriam dificuldade para ir uma segunda vez. Passados os jogos, teríamos então uma fonte permanente de ampliação do fluxo turístico para a cidade. Vale a pena pensar no assunto.
Com mais anos de crescimento, índices de violência inferiores aos atuais, transporte decente, uma baía mais limpa e um Galeão que nos dê orgulho, em 2016 temos que fazer uma Olimpíada que reflita efetivamente os avanços do país e não apenas uma trégua – como foram a Eco-92 ou o Pan-Americano de 2007. Não há tempo a perder.
Fonte: Valor econômico, publicado em 16 de Novembro de 2009.
Um projeto “nacional” mesmo: todos vamos bancar.
Isso precisa ficar bem claro para os cariocas.